Qualquer um que pegar as fotos de criança de Ana Carolina Pereira da Silva notará que em todas há um ou mais cachorros com ela. É um padrão que se repetia, mesmo que a vida em apartamento a impedisse de ter cães, o que a fazia frequentar regularmente a casa da avó.

 

Quando, já na vida adulta, Ana pôde ter seu próprio quintal espaçoso, os animais das fotografias passaram a ser os dela – e não foram poucos, diga-se de passagem. Essa adoração acabou virando uma missão de vida e abocanhando, inclusive, sua persona profissional: hoje, Ana Piercing – como é conhecida no meio profissional – é sinônimo de proteção e cuidados a cães e gatos em Joinville.

 

A versão "cuidadora" de Ana, de 35 anos, manifestou-se já na adolescência, quando ela e amigos do prédio em que morava cuidavam dos cães de um terreno próximo construindo abrigos e oferecendo comida.

 

– Até o dia em que a minha mãe me proibiu, porque eu não saía de lá. Então, eu disse que não voltaria para casa, que ficaria morando com eles – conta.

 

O olhar cuidadoso para os cães desamparados continuou quando, aos 18 anos e casada, foi morar com a sogra no Itaum. Ali, colocava água e comida na frente da casa, um mimo que acabou rendendo 13 bichos sob sua tutela. Um número que variava, mas continuava alto a cada nova troca de endereço, que se caracterizava pela matilha de cachorros amarrados no caminhão de mudança. No sobrado que ocupa hoje, chegou a ter 27 animais – atualmente, são "apenas" 11 cães.

 

Quando instalada no Centro, Ana integrou um grupo que, mais tarde, deu origem ao Abrigo Animal, que atualmente cuida de cerca de 800 cães e gatos. Foi esse grupo que organizava as feiras de adoção no Hipermercado Big, uma iniciativa retomada há pouco tempo.

 

Achar um lar, temporário ou definitivo, é um dos objetivos de Ana, que fez das redes sociais uma arma poderosa para encontrar tutores para bichos maltratados ou relegados à própria sorte. Seu estúdio de decoração corporal, na rua Visconde de Taunay, também é um entra e sai de gente com informações, denúncias ou doações. Na frente dele, um prato de ração está sempre a postos para os cães que passam na calçada.

Mas o grande foco de Ana e de seus amigos protetores são os mutirões de castração. Ana organiza campanhas, faz cadastros e, graças a veterinários parceiros, consegue descontos para a operação. Há cerca de três anos, ela arrecadou R$ 8 mil para castrar cem animais na Vigorelli, região com altos índices de “desova” de cães, principalmente.

 

– Se a maioria dos bichos for castrada, não teremos o abandono, os maus-tratos, as ninhadas jogadas na rua. Sem contar que evita doenças nas cadelas – defende Ana, que recebe denúncias diariamente, mas não tem condições de verificar todos os casos.

 

– Fazemos o resgate quando vemos que mais ninguém vai ajudar.

 

De fato, Ana parece não medir esforços para ajudar seus amigos de quatro patas. Juntar lacres de latinhas e chapas de raio X analógicas (que contêm prata) para vender e pagar clínicas e novas castrações são um braço desse empenho. Uma ONG chamada Patudos da Rua também está em curso, esperando CNPJ – a sede, claro, será no local de trabalho de Ana.

 

– Eu acredito que quando uma pessoa consegue enxergar o que um animal faz pelo outro, jamais fará mal a um ser humano – diz a cuidadora, que carrega a tatuagem de uma patinha ao lado do olho direito como símbolo de sua luta.

Eu acredito que quando uma pessoa consegue enxergar o que um animal faz pelo outro, jamais fará mal a um ser humano