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Carolina Mar

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Jean Balbinotti

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Maykon Lammerhirt
Salmo Duarte

Arquivo AN

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Gabriela Florêncio

Criar espaços estruturados para o morador aproveitar Joinville e apostar em uma marca que venda a cidade no plano turístico estão entre os desafios apontados por especialistas

“Em Joinville não tem nada para fazer!” É provável que, em algum momento, você já tenha ouvido ou dito essa frase. Mas especialistas na área discordam. Para eles, Joinville tem um rico potencial. O que falta é fazer o morador viver a cidade.

 

Este é um dos maiores desafios que o trade turístico aponta para que Joinville se desenvolva na área. Para a presidente do Conselho Municipal de Turismo, Elaine Scalabrini, um dos pontos de partida para se construir uma cidade que atraia visitantes é fazer com que o morador se sinta parte do processo e entenda que é possível ter turismo em Joinville. Para a professora da Univille e especialista em turismo de eventos Yoná da Silva Dalonso, o turismo está diretamente ligado ao desenvolvimento da qualidade de vida dos joinvilenses. A partir daí, a cidade se vende.

 

– Isso se consegue com campanhas, mas, principalmente, com a qualificação dos espaços. É preciso oferecer estruturas mínimas para que possa ser encarado como espaço de lazer. O (Parque) Zoobotânico e o Mirante (do Boa Vista) são exemplos. Ganharam estruturas e atraem centenas de visitantes nos fins de semana.

 

Após um ano de acesso restrito em razão de obras, o Zoobotânico reabriu em março de 2014. Ganhou uma trilha que percorre o entorno do parque e academia de ginástica ao ar livre. Há mais espaço para as aves e vendedores ambulantes regulamentados, além de pontos de acessibilidade e novos banheiros. O investimento total superou R$ 3,4 milhões.

 

O Mirante do Boa Vista reabriu em março deste ano após ficar seis anos e meio interditado. Tem 14,5 metros de altura em relação ao solo e uma área de 70 metros quadrados. A capacidade é para 40 pessoas, que podem observar toda a cidade e a baía da Babitonga. O investimento foi de R$ 3,6 milhões. O espaço aguarda a instalação de uma lanchonete e melhorias no estacionamento, já que não é possível subir de carro até o local.

 

A presidente do Convention & Visitors Bureau de Joinville e Região, Rosi Dedekind, concorda que a oferta de lazer com estrutura é primordial para o fortalecimento da imagem turística da cidade.

 

– Não é possível esperar que a demanda apareça para, então, fazer os ajustes. Tem de equipar e criar o espaço.

A presidente do Conselho Municipal de Turismo, Elaine Scalabrini, realizou uma pesquisa de doutorado em 2014 com o objetivo de identificar, junto aos moradores, a imagem turística de Joinville e a designação que melhor representa o município. Quatrocentos e noventa pessoas responderam  e 82,2% disseram que acreditam que o município possa receber mais turistas, embora tenham mostrado preocupação em relação às infraestruturas básicas e turísticas e divulgação.

 

– A gente precisa otimizar os espaços de lazer para a população. Historicamente, os moradores iam muito às recreativas das empresas. Só que hoje esses espaços não comportam mais as necessidades da cidade. Precisamos de mais parques com infraestrutura. Tem demanda para isso, tanto que a Expoville, o Zoobotânico e o Mirante estão sempre lotados – destaca.

 

Para ir além do turismo interno, Elaine ressalta que há a necessidade de um olhar para o futuro.

 

– Se chegarem ônibus com turistas no Mirante, como é que os passageiros serão organizados para subirem até o local se o único veículo que pode ir até lá é do município e é (de tamanho) pequeno? Como seriam atendidos? – questiona.

 

Que Joinville ainda tem um longo caminho a percorrer, não há como negar, mas o diretor, presidente da Fundação Turística de Joinville, Raulino Esbiteskoski, ressalta que a Prefeitura está investindo em melhorias.

A ampliação do número de voos para Joinville é outro ponto de atenção, argumenta o presidente da Fundação Turística de Joinville, Raulino Esbiteskoski. O turismo de eventos e de negócios está consolidado no município, mas uma oferta maior de linhas aéreas seria um forte argumento de venda da cidade.

 

– A Prefeitura está trabalhando na ampliação da estrutura do aeroporto e da diversificação das linhas. Há negociações com as empresas aéreas. Estamos de olho no futuro – explica.

 

Apesar das tratativas, o cenário é pouco promissor. De acordo com dados da Associação Brasileira das Empresas Aéreas (Abear), a demanda da aviação doméstica brasileira registrou, em maio, baixa de 7,7% na comparação com o mesmo mês do ano passado. Esse é o 10o resultado mensal negativo consecutivo e o pior, em termos absolutos, desde maio de 2012. Conforme a Infraero, desde o início do ano, o movimento de passageiros no aeroporto de Joinville também vem caindo na comparação com o mesmo período de 2015. Janeiro registrou queda de 6,41%; em fevereiro, a redução foi de 7,19%; em março, a retração tornou-se mais acentuada, de 11,05%; e, em abril, chegou a 11,58%.

 

A pesquisa sobre turismo realizada por Elaine Scalabrini, do Conselho Municipal de Turismo, mostrou que a maioria dos entrevistados tem preocupação com a forma de divulgação de Joinville. Segundo ela, uma análise dos materiais usados pelo município para divulgação indicou que há divergências entre a mensagem e a imagem que Joinville quer transmitir. Os materiais também são alterados quando se troca a administração, o que dificulta a consolidação turística do destino.

 

– Mesmo com estas caraterísticas e a significativa relevância do turismo, é notória a ausência de estudos que demonstrem a importância do turismo. Não há uma imagem consolidada de Joinville como destino. O município pode ser divulgado como cidade da dança, das bicicletas, das flores ou dos príncipes –  diz.

 

 Rosi Dedekind, do Convention & Visitors Bureau, afirma que o material de divulgação precisa ser feito para a cidade, vendendo a mesma imagem, sem perder unidade. É um trabalho de formiguinha importante, pois se o trade estiver unido, estimula a manutenção da identidade.

Ser a detentora de um dos maiores festivais de dança do mundo e sede da única escola do Teatro Bolshoi fora da Rússia rendeu a Joinville o título de capital da dança. A denominação já era usada de modo informal, mas foi oficializada neste ano pelo Senado, que aprovou o projeto de lei 88/2015. O texto, assinado pelo deputado Marco Tebaldi (PSDB), aguarda a sanção da Presidência da República.

 

Na prática, o que o trade turístico espera é que esse não seja somente mais um título a se somar aos outros que a cidade já tem. Ser a capital nacional da dança poderia render a Joinville mais espetáculos, cursos e workshops durante o ano e não apenas na época do Festival de Dança. Para a maior parte dos especialistas, a cidade precisa apostar em uma marca única, forte, que traga resultados efetivos para o desenvolvimento do turismo.

 

Ely Diniz, presidente do Instituto Festival de Dança, acredita que o título de capital nacional da dança legitima a condição de Joinville e que a profusão de títulos que a cidade detém – cidade das flores, das bicicletas ou dos príncipes – pouco colabora para o desenvolvimento do turismo local.

 

– Esse título tem todas as condições de ser não apenas um apelido dado por nós, catarinenses, mas se espalhar pelo País inteiro, em razão de que as bases são únicas. Nenhum outro município brasileiro tem uma escola de balé com a grandeza do Bolshoi e o maior festival de dança do mundo. A edição deste ano do Festival teve recorde de inscrição. Teremos, em um ano de crise financeira e política, 7.800 participantes – informa Diniz.

 

Mas o título não deve ser mantido apenas por essas duas atrações, ainda que sejam de peso e destaque consideráveis, observa o presidente do Instituto Festival de Dança. Para ele, é a hora de a cidade aproveitar o momento e desenvolver ações que façam Joinville se movimentar por meio da dança durante todo o ano, com a realização de cursos de aperfeiçoamento profissional, apresentações culturais e implantação de novos espaços e estruturas para espetáculos, entre outros.

 

Para Diniz, é preciso que as iniciativas pública e privada se unam para discutir o que cada uma pode fazer para aproveitar essa nova marca para incentivar o turismo.

 

– A cidade precisa aproveitar o que tem nas mãos e construir efetivamente uma marca cultural. Não basta colocar em um folheto que é a capital nacional da dança. É preciso pensar em um teatro adequado, em atrair espetáculos, em criar um museu interativo para a dança, por exemplo – ressalta.

 

Rosi Dedekind, do Convention & Visitors Bureau, discorda que a cidade precise apostar em uma marca única. Para ela, Joinville pode ser a cidade da dança, das flores e das bicicletas.

A família de Ango Kersten transformou o turismo em fonte de renda. Na propriedade localizada na Estrada Bonita, área rural de Joinville, visitantes conhecem o cultivo da cana-de-açúcar, o museu de utensílios agrícolas, aprendem sobre a fabricação de melado e passeiam de trator em uma área de mata preservada. A família chegou à região em 1887 e passou a viver do cultivo da terra. Em 1992, o turismo também passou a fazer parte do cotidiano.

 

A família do agricultor integra o Viva Ciranda, programa de turismo rural pedagógico de Joinville, que teve início em 2011 e hoje conta com a participação de 15 propriedades em cinco áreas rurais: Piraí, Quiriri, Estrada Bonita, Estrada Dona Francisca e Estrada da Ilha. O programa é coordenado pela Fundação Turística de Joinville, que conta com dois ônibus para levar estudantes da rede pública para passeios nas propriedades cadastradas.

 

Especialistas em turismo consultados por “AN” consideram esse trabalho uma das principais ferramentas para que o morador aprenda a conhecer e a viver a cidade. A aposta é que as crianças desfrutem desses espaços por meio de um passeio escolar e, depois, levem a família para conhecer os mesmos espaços.

 

– Se o joinvilense gosta da cidade e  acredita na ideia de que ela é bonita e tem belos espaços para serem visitados, ele acaba divulgando o que a cidade tem para fazer – afirma  o gerente de marketing da Fundação Turística, Douglas Hoffmann.

O agricultor Ango Kersten sente essa mudança diariamente. Antes do Viva Ciranda, ele recebia visitantes do Paraná e de São Paulo. Hoje, recebe estudantes das redes municipal e estadual, além dos moradores que querem fazer passeios.

 

– O Viva Ciranda está transformando esse cenário. As crianças acabam conhecendo essas opções de lazer e divulgam para a família. Agora, cada vez mais, as crianças voltam trazendo os pais. Dessa forma, aprendem a valorizar a cultura local e mostram que Joinville vale a pena – diz Kersten.

 

Conforme a coordenadora do Viva Ciranda, Anelise Rosa, o programa gera um incremento de até 40% na renda das famílias participantes. Só no ano passado, 15 mil crianças realizaram passeios por meio do programa. Desde 2011, 85 mil estudantes já visitaram a área rural da cidade.

 

A professora e pesquisadora da Univille Yoná da Silva Dalonso acredita que investir no turismo ecorrural é um desafio dentro das políticas públicas. Para ela, essas  inovações têm se fortalecido nos últimos tempos, mas ainda se faz necessário  o aprimoramento do trabalho.

 

– As pessoas procuram por lugares onde possam ter contato com o ar livre e desfrutar da tranquilidade. Joinville tem opções belíssimas, mas há questões que podem ser melhoradas. Um exemplo é o Projeto Acolhida na Colônia, na serra catarinense. Imagina se hospedar e viver o dia a dia de alguém que mora no campo?

A Fundação Turística de Joinville é o órgão responsável por planejar, incentivar e divulgar o setor no município. A Prefeitura não pode atuar como receptor, levando o turista até local de visitação. Este serviço precisa ser feito por uma empresa. À fundação, cabe dar subsídio.

 

Em âmbito nacional, a fundação realiza ações de divulgação e promoção da cidade como destino turístico. Entre essas ações estão participações em feiras de turismo, nas quais o público-alvo são agentes e operadoras; festas regionais, divulgando eventos  como a Festa das Flores; relacionamento com imprensa e mídia especializada, inclusive com a realização de press trips; intercâmbio com profissionais de outras cidades e Estados; além da participação em eventos locais para atendimento ao público e divulgação dos atrativos.

 

Todo este trabalho é feito com empresas e entidades do setor, como Joinville e Região Convention & Visitors Bureau, Sindicato dos Hotéis, Restaurantes, Bares e Similares de Joinville e Região e trade turístico. Na prática, a fundação divide o turismo na cidade em quatro frentes: lazer, negócios, esporte e interno.

 

A área de negócios é a mais consolidada, já que a cidade é palco de importantes eventos nacionais, como a Exposuper, a Expogestão e a Festa das Flores.

 

– A cada dois meses, em média, ocorre uma grande feira, que movimenta toda a economia da cidade – diz o presidente da Fundação Turística, Raulino Esbiteskoski.

 

Ele aponta a ampliação da Expoville – com a construção de uma nova área de eventos, que deve ser iniciada em 2017 – e a ampliação da oferta de linhas aéreas para a cidade como fundamentais para que a área se desenvolva ainda mais.

 

  • Orçamento anual é de R$ 4,5 milhões

O orçamento da Fundação Turística em 2016 é de R$ 4,5 milhões. O valor representa 1,67% do previsto no orçamento anual da Prefeitura, que é de R$ 2,69 bilhões. Esse dinheiro não é aplicado somente na promoção do turismo. É dividido quase que igualmente com investimentos em desenvolvimento do turismo, serviços e manutenção e folha de pagamento da fundação.

Despesas como a manutenção de 21 salas do centro comercial da Expoville, das centrais de atendimento ao turista, obras no Mercado Público e serviços básicos da fundação, como despesas de energia e telefone, estão inclusas nessa conta. Para 2017, as despesas orçadas são de R$ 3,9 milhões. Para Raulino Esbiteskoski, a fundação poderia fazer mais se tivesse um orçamento maior, mas acredita que o valor orçado para a área atende bem às necessidades do município.

– Joinville está conseguindo fazer o que é preciso ser feito com o orçamento – avalia.

De acordo com o presidente da fundação, o turismo deixa por ano na cidade, em média, R$ 27 milhões somente em Imposto Sobre Serviços.

 

  • Comparativo

O valor orçado para a área de turismo em Joinville não difere do previsto para cidades de porte parecido como Caxias do Sul (RS). No município gaúcho, que tem população estimada de 474.853 habitantes, a previsão de orçamento para este ano é de R$ 4,5 milhões, ou seja, exatamente o mesmo valor aplicado em Joinville.