AMIGOS

casa de Jeanpaulo Desrosiers, 27 anos, passou a fazer parte da rotina de Nagare Layse Bachmann, 27, há um ano. A loira de sorriso fácil e conversa afiada conheceu o haitiano na fábrica de bicicletas onde ambos trabalham. De início, aqueles homens negros, fortes e vaidosos chamaram a atenção. Logo a curiosidade se transformou em amizade. Desde então frequenta o pátio de chão batido da residência e lan house transformada em QG haitiano na terra de tradições germânicas. É ali que Nagare e os novos amigos se reúnem, geralmente no fim de tarde, como se fosse um churrasco de fim de semana.

 

Sentados em cadeiras de plástico, outros num banco debaixo da árvore, falam sobre futebol, mulheres (Wendy Philossaint, 24, mostra fotos no celular de modelos haitianas à beira do mar caribenho), música e trabalho. Celular, aliás, é um item indispensável na vida deles. É pelo WhatsApp que matam a saudade de quem ficou ou conversam com os colegas brasileiros. O tom do papo em crioulo é alto e as palavras são indecifráveis a ouvidos brasileiros, mas a blumenauense Nagare Layse pouco se importa, ao contrário, diverte-se com as diferenças e semelhanças:

 

- Eles são muito educados e estão sempre de bom humor. Usam anéis e brincos, são bem-arrumados e cheirosos. Todos os que eu conheço são assim - admira-se.

 

 

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Foi o sorriso de dentes muito brancos de Jeanpaulo que conquistou Nagare. Da amizade surgiu um namoro. Juntos, compartilharam alguns dos roteiros que todo blumenauense um dia acaba trilhando: ir à Rivage, ver um filme no cinema, comer x-salada e tomar cerveja no Madrugadão da Itoupava Norte.

 

- Um dia eu levei o Jean pela primeira vez para dançar e eu cheguei em casa e vi que tinha separado calça e camisa social. Falei pra ele: 'bota uma jeans e uma camisa!' - diverte-se.


Do namoro, que acabou em maio deste ano, ficou novamente a amizade. E os planos para os fins de semana com os amigos estrangeiros não terminaram. Nagare quer acompanhá-los até Balneário Camboriú e à Serra do Rio do Rastro, mas o dinheiro, que é curto, limita o turismo em terras catarinenses e serve como teimosa lembrança da condição deles no Brasil: são refugiados.

Enquanto Jeanpaulo usa uma camiseta do Barcelona, o amigo Wendy prefere a do São Paulo. Camisas listradas e polo também entram no guarda-roupa dos haitianos, sem esquecer dos bonés de aba reta sobre o cabelo sempre raspado. Item indispensável é o perfume - nem para uma saída breve de casa dispensam algumas gotas. Quando passam, o cheiro levemente adocicado fica.

Nancí Silva, coordenadora técnica e pedagógica da Escola Técnica do SUS de Blumenau, trabalhou no Haiti poucos meses depois do terremoto. Quando passava pelas ruas da periferia de Porto Príncipe, impressionava-se com o visual dos caribenhos:

 

- No meio da lama, do caos, eles apareciam bem-vestidos de calça, camisa, sapato, sempre muito educados. A vestimenta impecável era sempre importante para eles.

 

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