Cupido da Praça XV

Erwin, de floripa, namora desde 2015 o curitibano lucas, que deu sete voltas em torno da figueira centenária e viu se concretizar a lenda casamenteira da ilha

eza o folclore local que, quem dá uma volta na figueira centenária da Praça XV de Novembro, visita Florianópolis mais de uma vez. Duas voltas são para namorar e três garantem casamento. Uma semana antes de conhecer o advogado Lucas Censi, 27 anos, o geólogo Erwin Lapuse, 25, tinha dado sete voltas na velha árvore. Eles se viram pela primeira vez em julho de 2015 e, um mês depois, estavam namorando.

Se foi a superstição ou não, o fato é que a figueira continua a ser a padroeira do casal. A história deles é um típico romance contemporâneo: começou graças ao Tinder, aplicativo de paquera. Lucas, manezinho, vive e trabalha no Centro, enquanto Erwin, de Curitiba, tem o coração dividido entre as capitais paranaense e catarinense.

Há quase dois anos eles namoram a distância, um lá, outro cá. Mas até o que seria uma dificuldade teve auxílio da tecnologia.

– Descobrimos um aplicativo de caronas e o que seria um problema virou uma potência. A distância nos deu a possibilidade de fazer amizades – afirma Censi.

O casal se encontra a cada 15 dias.  Além de novos amigos entre uma viagem e outra, Censi aprendeu a perceber Florianópolis de outras maneiras.

– Eu sou advogado e tenho uma rotina muito apertada. Namorar alguém de fora permitiu reconhecer minha própria cidade, a redescobrir o cotidiano, como ficar zanzando pelo Centro. E ele, por ser geólogo e gostar de pedras, me fez olhar para baixo, perceber os ladrilhos do calçadão, os desenhos em petit-pavé (calçamento) no chão da Praça XV — descreve Censi.

Erwin Lapuse já era um apaixonado pela Ilha e vinha com frequência, tanto a trabalho quanto para visitar amigos. Foi por causa dele que o manezinho Lucas visitou pela primeira vez a praia da Lagoinha do Leste, por exemplo.

– Floripa sempre me impressionou, tem uma energia diferente. Eu pensava: quero namorar alguém daqui. Quero estar em Florianópolis. E dei a volta na Figueira sete vezes. Eu gosto da natureza e quis fazer um mergulho na cidade. Quis entender a dor dos desterrados – comenta o paranaense.

Por estudar a origem e a estrutura da Terra, Erwin é atento a detalhes sobre rochas, o quanto o costão de uma praia influencia a quantidade de sal na água, as dunas da Joaquina, as pedras de mais de 250 milhões de anos em alguns pontos da cidade. E compartilha esse conhecimento com o namorado e os amigos que fez por aqui.

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Capital da diversidade

Lucas e Erwin sempre fizeram questão de andar de mãos dadas, em qualquer lugar da cidade. Para um casal formado por um homem e uma mulher, dar as mãos é um gesto corriqueiro, mas casais gays ainda precisam lidar com a intolerância, com os olhares e com os cochichos.

– Acho que Florianópolis está num bom caminho. Curitiba é uma cidade maior, mas o preconceito também é maior. Aqui todo mundo é muito educado e me sinto seguro de andar de mãos dadas pelo Centro. No centro de Curitiba, dá medo – avalia o geólogo.

Embora a cidade tenha sido eleita em 2013 como o melhor destino LGBT (acrônimo de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Transgêneros) do Brasil, segundo a Santur, ainda há registro de violência relacionada à homofobia, como o rapaz que apanhou na Lagoa da Conceição depois de ter beijado um amigo no último Carnaval, e à transfobia, como a vendedora Jennifer Celia Henrique, transexual morta a pauladas no começo de março.

– Minha perspectiva como morador daqui é que sinto das comunidades mais tradicionais um certo ranço. Mas sinto também que nesses lugares algumas pessoas nunca viram um casal gay. Então, tomam algo como pressuposto e acabam reagindo. Quando a gente vem na boa, conversa, se mostra empático e faz uma brincadeira, o outro também se desarma nesse caminho – afirma Censi.

O petit-pavé de Hassis

 

Você já reparou que o chão da Praça XV de Novembro tem desenhos? São cenas reproduzidas em mosaicos de petit-pavé das tradições da cidade, como renda de bilro, boi-de-mamão, pular corda, pipa e cabra-cega. Os 47 painéis foram feitos com graveto direto sobre a areia por Hiedy de Assis Corrêa, o Hassis (1926–2001), e são tombados como patrimônio cultural de Florianópolis.

Hassis foi contratado em 1965, quando a prefeitura encabeçou um projeto de revitalização da Praça XV e modernização dos espaços públicos.

Ele também fez desenhos para as praças Pereira Oliveira, Benjamin Constant, Bulcão Viana e Olivia Amorim.

Além do petit-pavé, na Praça XV quem reina é a figueira. Conta-se que ela nasceu em 1871, no jardim da Catedral Metropolitana de Florianópolis, e foi transplantada 20 anos depois para o local onde está hoje. Dentre as tradições folclóricas, a mais conhecida é a dos visitantes que, ao conhecê-la, devem dar três voltas em sentido anti-horário para trazer sorte, riqueza e casamento. Ela continua a fazer sombra para quem está na correria do dia a dia e quer aproveitar a pausa nos bancos da praça.

 

Vô Carlão e Vó Neusa

Girlei e
Ana Paula