Alexandre e a família guardam o acidente na MEMÓRIA. Por muito pouco eles não entraram para as estatísticas de mortos na rodovia.

lexandre Felipe, 39 anos, acredita que um segundo basta para mudar uma vida. Passou a valorizar as menores frações de tempo depois de quase ter morrido na volta de um passeio no quilômetro 68 da BR-470, em Indaial, na noite do domingo, 8 de julho de 2012. Quando o Palio que vinha na direção contrária invadiu a contramão só ouviu o grito da mulher, Cilmaria Kuhnen Felipe, 37:

- Olha o carro!

E mudou a rota. No segundo em que girou o volante para a direita, o corretor de imóveis evitou bater em cheio no Siena que dirigia contra a dianteira do outro carro. Naquele instante Alexandre desviou das estatísticas junto com a esposa, a filha, Maria Eduarda Felipe, 12, a mãe, Valcir Terezinha Felipe, 57, e a irmã, Alessandra Felipe da Silveira, 33. Por muito pouco a família toda não engrossou o massacre que ocorre, dia após dia, no trecho de 197,2 quilômetros entre Navegantes e Pouso Redondo da rodovia.

Nos últimos 10 anos: 51% das 1.105 mortes ocorridas neste trecho foram provocadas por colisões frontais. Em casos como este a velocidade dos veículos é somada e a desaceleração forçada pela batida deforma os carros até atingir os ocupantes em segundos, explica o engenheiro mecânico e consultor da Comissão de Segurança Veicular da Society of Automotive Engineers (SAE) Brasil, Decio Luiz Assaf.

No caso do acidente com a família de Alexandre, o desvio abrupto fez com que o impacto fosse somente em parte do para-choque e na lateral do veículo.

- Quando a batida é só em parte da dianteira, a ocorrência é mais grave ainda porque a energia do impacto se concentra num ponto menor - explica Assaf.

Com a colisão, o Siena chegou a girar no ar até cair 40 metros distante do ponto da batida. Alexandre ficou preso ao banco do motorista e teve uma parada respiratória. O especialista em Medicina Aeroespacial e de Tráfego, Dirceu Rodrigues Alves Júnior, explica que colisões como esta causam o chamado efeito chicote, em que o corpo é projetado para a frente e para trás na mesma velocidade que o carro mantinha quando estava em movimento.

Alves Júnior, ex-diretor do Centro de Inspeções de Saúde para Aeronavegantes do Ministério da Aeronáutica, detalha que além do efeito chicote, as lesões internas ocorrem porque o peso de cada ocupante aumenta na proporção da velocidade em que o veículo estava no momento da colisão:

- Uma pessoa de 80 quilos pode passar a pesar até 1,8 mil quilos, dependendo da velocidade, e ser ejetado pelo para-brisas.

O médico detalha que são comuns lesões na coluna cervical, que causam paradas respiratórias, cardíacas e levam à morte. O corretor de seguros foi salvo pelo instinto da esposa de fazer respiração boca a boca, que agiu mesmo sem nunca ter feito curso de primeiros socorros.

A irmã do motorista, Alessandra, que seguia no banco traseiro, sofreu vários ferimentos em órgãos internos como pulmão e fígado. Sobreviveu depois de cinco horas de cirurgia e levou seis meses para se recuperar por completo.

O policial rodoviário federal José Figueroa acredita que a duplicação da BR-470 reduziria de forma significativa as colisões frontais na rodovia, já que os sentidos do tráfego passarão a ser a separados fisicamente por muretas ou canteiros centrais. No entanto, Figueroa desconfia que o comportamento de quem dirige continuará causando acidentes, como saídas de pista.

A solução para reduzir os colisões hoje e no futuro é simples, segundo o policial: respeito aos limites de velocidade, trafegar sempre com faróis acesos e o uso contínuo dos equipamentos de segurança veicular (cinto, encosto para cabeça nos assentos e, se possível, airbag).

Para se recuperar das lesões físicas, a família de Alexandre levou cerca de seis meses. Já os ferimentos na alma levaram mais tempo para passar: quase um ano, até que eles voltassem a ocupar os mesmos lugares do carro para passear num fim de semana. O motorista do Palio que entrou na contramão, descrito pela Polícia Rodoviária Federal (PRF) com sinais de ingestão de álcool, não se feriu na colisão.

Das 1.105 mortes na rodovia nos últimos 10 anos, 563 foram em batidas de frente

Alexandre conta que ficou PRESO ao banco
do motorista e teve uma parada respiratória.