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Em levantamento exclusivo para o jornal "A Notícia", delegacia especializada de Joinville revela dados assustadores: a cada dois dias, uma criança é vítima de abuso sexual na região

Aviolência sexual contra criança é mais comum do que se imagina. Está acima de classe social ou nível de instrução. Um levantamento exclusivo feito pela Delegacia de Proteção à Criança, Adolescente, Mulher e Idoso
de Joinville para o jornal "A Notícia", constatou que 576 vítimas deste tipo
de abuso, com idades de zero a 12 anos, foram atendidas entre agosto
de 2012 e abril de 2015. Isso significa que houve uma vítima a cada
dois dias na região. Os dados levam em consideração as cinco cidades atendidas pela delegacia (Joinville, Araquari, São Francisco do Sul,
Itapoá e Garuva), embora 90% dos casos sejam de Joinville.

Os números, porém, não levam em conta a pilha de mais cem registros de violência
sexual que ainda não foram avaliados por defasagem de efetivo na delegacia. As 576
vítimas foram atendidas em 497 registros desenrolados na delegacia, pois em cada
registro pode existir mais de uma vítima.

- Os números daqui me assustam, considerando a consciência que as pessoas têm
de pensar que isso não ocorre - observa a delegada Tania Harada.

Em pelo menos 200 registros, foi possível identificar indícios de abuso sexual. Nos outros existe apenas o relato da vítima. Como se trata de um crime silencioso, que normalmente
ocorre entre quatro paredes, a investigação torna-se um grande desafio. Além de não haver testemunhas e muito menos flagrante, a vítima é vulnerável, não tem capacidade de se
defender e não tem a mínima noção de que o seu direito está sendo violado.

É muito difícil pegar em flagrante e normalmente o agressor é alguém muito querido, que está do seu lado.
Por isso, a apuração desse crime é uma
das prioridades.

Estatística pública é defasada e está
longe do ideal

Os dados da delegacia especializada aos quais "AN" teve acesso, correspondem ao
período de atuação da psicóloga Cristina Maria Weber na Delegacia de Proteção à Criança, Adolescente, Mulher e Idoso de Joinville. A profissional precisou contar manualmente os
relatórios para chegar ao resultado final. Infelizmente, o setor de estatísticas do poder
público ainda é muito defasado. A Secretaria de Estado de Segurança Pública, por
exemplo, tem quase 200 registros a menos que os da delegacia de Joinville.

O Conselho Tutelar, órgão municipal responsável por zelar pelos direitos da criança
e do adolescente, que costuma fazer o primeiro atendimento à vítima e encaminhá-la
para a rede, também não tem um setor de estatística capaz de reunir os dados por tipo
de violência. Os números que o órgão enviou a pedido da reportagem também foram
compilados manualmente por um conselheiro.

A falta de sincronia entre a própria rede de atendimento reflete diretamente no desenvolvimento dela, uma vez que os recursos públicos são direcionados às cidades a
partir de estatísticas. Na falta de dados, a distribuição de recursos corre o risco de ser falha.

Na avaliação do promotor de justiça da Infância e Juventude de Joinville, Sérgio
Joesting, a rede de atendimento à crianças e adolescentes que têm os seus direitos
violados no município é carente de profissionais.

- Há uma defasagem de recursos humanos no atendimento em Joinville.

 

Joinville perde
investimento federal

Um programa que promova o compartilhamento de informações entre os órgãos, evite a revitimização e qualifique o atendimento. As instituições de Joinville começaram a sonhar com este programa em 2012, quando o chamado Programa de Ações Integradas e Referenciadas de Enfrentamento à Violência Sexual Infantojuvenil (Pair) foi lançado. O governo federal disponibilizou R$ 100 mil para torná-lo realidade no município.

Quase três anos depois, a verba que viria para Joinville foi cancelada porque o município não cumpriu o prazo de implantação do projeto. Segundo a Secretaria de Assistência Social, o atraso ocorreu em função
de entraves burocráticos na contratação de uma empresa capacitada que desenvolveria o trabalho. O Pair já funciona em mais de 500 municípios brasileiros.

 

 

Nós vamos tentar concorrer novamente ao programa do governo federal. Mas estamos trabalhando para aproximar a rede e melhorar a comunicação - justificou a gerente da secretaria, Neide Solon.

Saúde se mobiliza para qualificar atendimento

Se a criança vítima de abuso sexual não for bem conduzida e receber o tratamento adequado, pode desenvolver problemas psicológicos ao longo do crescimento. Por isso, profissionais da Secretaria Municipal de Saúde de Joinville estão desenvolvendo um projeto que tem por objetivo centralizar o atendimento, qualificar o tratamento e evitar a revitimização. A ideia é parecida com a do Programa de Ações Integradas e Referenciadas de Enfrentamento à Violência Sexual Infantojuvenil (Pair), cujo investimento foi perdido pela Secretaria de Assistência Social de Joinville.

De acordo com os profissionais da saúde, que preferiram não se identificar porque ainda estão em processo de negociação com o poder público, convencendo a prefeitura a investir
no projeto, a intenção é reunir especialistas que já atuam na rede em um único espaço e,
assim, reduzir custos. Aprimorar as estatísticas e aperfeiçoar o nível de informação dos profissionais também estão entre as metas. O projeto foi apresentado no dia 22 de junho,
e está sendo avaliado pela secretaria.