A ligação com a foice e o martelo . . . . nOS anos PASSADOS NO EXÍLIO, VIDA E OBRA DE JORGE AMADO SE CONFUNDIAM COM A IDEOLOGIA DO AUTOR
Amado (D) em uma conferência de 1942 do Circulo El Progreso, em Montevidéu

om o lançamento de Luis Carlos Prestes, el Caballero de la Esperanza pela Editorial Claridad em 1942, Jorge Amado concluiu a tarefa que o levou a se exilar. Exemplares eram negociados clandestinamente para o Brasil até o governo de Juan Domingo Perón ordenar a queima da edição argentina. Publicado em português três anos depois, o livro voltou a sumir do mercado nacional com o golpe militar de 1964 e reapareceu em 1979. Traduzida para 20 línguas, a biografia do líder comunista é resquício da fase em que a vida e a obra do escritor se confundiam com sua ideologia.

O engajamento surgiu cedo em Amado. Ainda adolescente, indo de Itabuna para estudar em Salvador, criou um pasquim chamado A Folha em oposição ao A Pátria, o informativo oficial do grêmio estudantil do Ginásio Ipiranga. Na sequência, integrou a Academia dos Rebeldes, grupo que se propunha a renovar o circuito literário baiano. Mas foi no Rio de Janeiro que a política iria fazer a cabeça do jovem de 18 anos. Recém-egresso na faculdade de Direito, ele estreou com O País do Carnaval em 1931 – e se aproximou do Partido Comunista Brasileiro (PCB).

 

 

Naquele começo de década tumultuado pela tomada da presidência da República por Getúlio Vargas, muitos escritores passaram a debater os problemas sociais do país. Personagens e questões até então pouco abordadas pela intelectualidade brasileira, como o retirante nordestino, a luta de classes e a influência das oligarquias rurais, entraram em cena. Com Amado não seria diferente. O romance seguinte, Cacau (1933), já trazia a polaridade exploradores versus explorados ou, no vocabulário marxista, a burguesia contra o proletariado. Vendeu 2 mil cópias em 40 dias, um sucesso.

 

 

Donde a formatura, em 1935, tornou-se mera formalidade para Amado. A usar o diploma, ele preferiu advogar em prol do que acreditava em seus livros e nas páginas de A Manhã, jornal da Aliança Nacional Libertadora (ALN, apoiada pelo PCB). O viés doutrinário fez com que Cacau e Suor (1934) saíssem na União Soviética, dando início à bem-sucedida carreira internacional do autor. Dentro do Brasil, porém, a militância custou-lhe a liberdade: acusado de ter participado da Intentona Comunista, ficaria preso em 1936, em Natal, em sua primeira detenção por subversão.

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Ensaio sobre Prestes (acima) e o nazifascismo encontrados na mala deixada no Uruguai

Pelo mesmo motivo, Amado também acabou no xilindró em 1937, em Manaus, e em 1942, ao retornar da Argentina e do Uruguai. Meses depois, seria solto com a condição de se mudar para Salvador e se apresentar semanalmente na Delegacia de Ordem Política e Social. Com a queda da ditadura Vargas e a volta do PCB à legalidade em 1945, o baiano concorreu a deputado federal por São Paulo. Elegeu-se com mais de 15 mil votos, mas perdeu o mandato em 1948 devido à aliança do Brasil com os Estados Unidos. A alegação para a cassação era de que, em plena Guerra Fria entre americanos e soviéticos, a bancada comunista atendia aos interesses de Moscou.

 

 

Sem partido (novamente ilegal) e sob ameçada da polícia do presidente Gaspar Dutra, não restou alternativa a Amado que não se refugiar outra vez no exterior. Em Paris, manteve as atividades de militante, chegando a entrar na cidade com o poeta chileno Pablo Neruda, também exilado, escondido no porta-malas do seu carro. Em 1951, mudou-se de lá para a Tchecoslováquia (hoje República Tcheca) e viajou por diversos países da ex-Cortina de Ferro, sempre criticando a submissão da América Latina à Casa Branca. Foi nessa época que escreveu O Mundo da Paz, panegírico a Stálin que lhe valeu o Prêmio Stálin da Paz em 1953.

 

 

A honraria não impediu que, no mesmo ano, Amado regressasse ao Brasil com dúvidas quanto ao comunismo. Durante o giro pelo Leste Europeu, ouvira falar de rumores sobre os gulags, os campos de trabalho forçado na União Soviética. As suspeitas se confirmaram em 1956, com a revelação dos massacres, expurgos e execuções extrajudiciais de milhares de pessoas ordenados por Stálin. Aquilo foi demais para ele. Em 1958, em seu primeiro romance pós-desencanto com a ideologia, Gabriela, Cravo e Canela, o escritor trocaria o tom panfletário pela narrativa sensual com a qual seria cultuado pela posteridade.

 

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