Em São Paulo,

fundações são questionadas

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egócios paralelos, que confundem as esferas pública e privada, têm colocado as três universidades estaduais de São Paulo – USP, Unesp e Unicamp – na mira de tribunais de contas, Judiciário e Ministério Público. Intermediações de convênios federais com terceirização de serviços, aluguel de espaço público, gestão de verbas da própria universidade e cobrança de taxas de administração são algumas das irregularidades envolvendo a atuação de fundações privadas ligadas às universidades. A cobrança por cursos continua ganhando espaço.

Na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), as atribuições e a gestão de recursos de uma fundação privada se misturam com as da própria instituição. A Funcamp gerencia almoxarifados, reforma e gere hospitais (há um convênio no valor de R$ 711 mil com o Hospital das Clínicas) e cobra taxa de administração de 6%. São atividades não permitidas e distantes da finalidade da fundação. A Funcamp também recebeu recursos originários da universidade, como taxas de inscrição em vestibulares, de formaturas, comercialização de livros, publicações de periódicos, venda de camundongos, softwares, mudas, plantas e realização de eventos.

Praticamente toda atuação da Funcamp foi considerada irregular pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE) no fim do ano passado – seria uma “terceirização exagerada”. O convênio feito para tocar as atividades é prorrogado desde 1987, o que por si só já viola a legislação.

Uma das principais fundações de apoio à USP, a Fusp, foi questionada pela Controladoria Geral da União (CGU) em dezembro. Ela é titular de um convênio com o Ministério da Cultura (MinC) para o projeto da Incubadora Tecnológica de Cooperativas Populares (ITCP). Além de intermediar o serviço, o que é ilegal, a Fusp ainda subcontrataria uma ONG, chamada Capina, para o projeto de economia criativa. Também cobrava um aluguel pelo uso de um dos espaços da universidade, no valor de R$ 79 mil. Depois que a CGU reprovou o convênio, de R$ 502 mil, a União congelou o repasse do MinC. A USP informou que trabalha para avançar com a proposta, argumentando que a “interrupção tem acarretado desmobilização da equipe e dos empreendimentos”.

 

Contas pouco transparentes

Dos R$ 88 milhões movimentados em 2014 por cursos e convênios, a USP ficou com 5% – ou R$ 4 milhões. A universidade criou um fundo específico para essas os valores recebidos de fundações que, em março tinha R$ 15,4 milhões. Valor irrisório perto dos volume de negócios. Só a Fusp, que mantém 26 convênios com a universidade, recebeu R$ 740 milhões em projetos da instituição entre 2007 e 2013. As contas não são transparentes: a própria universidade informou que só as fundações poderiam indicar seus recursos totais.

Sindicatos de professores são críticos ao que consideram um processo de privatização estimulado pelas fundações.

– Essa relação fere o princípio da separação entre público e privado, não há transparência. Se um professor está nessa situação, ele está mais vinculado à fundação ou à universidade? – questiona diz o presidente da Associação de Docentes da USP, Ciro Correia.

O atual presidente da Fusp, José Roberto Cardoso, defende que o modelo é imprescindível para o desenvolvimento de pesquisas, intensificando a interlocução com o setor produtivo.

– As fundações surgiram como uma oportunidade de o professor aumentar seus ganhos e não sair para o mercado. Mas não é só o dinheiro, o professor quer realizar trabalhos que a universidade não tem oportunidade de tocar sozinha.

 

Ações judiciais contra cursos

Pelo menos duas ações civis públicas correm na Justiça de São Paulo contra a cobrança de cursos — na USP e na Universidade Estadual Paulista (Unesp). Para o presidente do Associação dos Docentes da Unesp, Milton do Prado Junior, o sistema mina o caráter público da universidade:

– É um espaço público gerando produto privado com retorno muito pequeno.

A Unesp defende que os cursos oferecidos pela FDCT com a participação de professores da Faculdade de Engenharia da Unesp de Guaratinguetá estão de acordo com a legislação da universidade.

“As aulas são em salas da Unesp, mas em contrapartida, a unidade e o departamento envolvido recebem 30%” ressalta, em nota.