Notícias

Santa 40 anos  | 21/09/2011 16h59min

Agradecido como um cão*

EDGAR GONÇALVES JR.  |  Editor-chefe

Nasci quatro anos, dois meses e 12 dias antes do Jornal de Santa Catarina. Sou de 67, ele é de 71. Vim ao mundo sem alarde em Alegrete, interior do Rio Grande do Sul, e o Santa surgiu com pompas em Blumenau. Eu era o caçula de uma fornada de quatro; ele, filho único. Mas podemos afirmar que somos da mesma geração.

Quando nos conhecemos, eu tinha 25 anos e o Santa, 21. Lá se vão quase 19 anos... Eu era aquele magricela ali da foto, ele exibia um ar já sério como se espera de um jornal. Os dois buscávamos aquilo que os jovens perseguem com muito entusiasmo — e nem sempre lucidez. Ambos contávamos histórias de uma infância feliz, eu no mundinho da minha rua, ele na conquista de espaço e respeito. Mas às vezes silenciávamos. Havia turbulências, comuns na adolescência.

Queríamos os dois provar algo, o Santa e eu, cada qual do seu tamanho. Pra mim, o desafio era ser um bom jornalista sem esquecer de ser íntegro como meus pais e jamais perder o brilho dos olhos. Ele queria ser essencial para muita gente. Também pudera, sempre se esperou muito mais dele do que de mim.

E assim fomos lado a lado, trabalhando muito e sem perceber a marcha ininterrupta do tempo.





 

Passamos pelo mar tempestuoso dos 30 anos. Alimentamos vaidades, sim, mas hoje sabemos que elas se perdem em alguma curva do caminho e a gente nem lembra mais delas. Estivemos juntos em solenidades. Ouvimos vozes sinceras de apreço, mas também ouvimos crítica. Engraçado, quando se tem 30 anos a sensação é de que o mundo é uma fruta madura à nossa espera. Basta colher.

E colhemos, só que cada um com seu apetite. Eu colhi aprendizado, amigos e mestres que me serviram de guia, acho que colhi aquela coisa vaga chamada experiência. Me transformei num jornalista, sabe lá se o jornalista que o rapaz da foto gostaria de ser, mas íntegro e com brilho nos olhos — ah, isto sim! Ele colheu mais, afinal sempre se esperou muito dele. Legitimidade, reconhecimento, respeito, popularidade até. Hoje não há quem não olhe pra ele e diga: "Esse jornal tem personalidade", goste ou não dele. E, cá pra nós, ele é cada vez mais lido.

Lembro dos dias em que nos lançaram olhares de reprovação. É engraçado como um cara de Alegrete e um jornal de Blumenau conseguiram viver coisas tão parecidas. Quando nos questionaram as intenções e chegaram até a suspeitar que orquestrávamos crimes. Não, nunca orquestramos nada contra ninguém. Trabalhamos, isto sim, e até erramos em algum momento. Quem não erra? Mas não foram poucas as vezes em que admitimos nossos erros. Com integridade e brilho nos olhos.

Hoje somos quarentões, o Santa e eu. Mario Quintana um dia encontrou um retrato antigo e logo guardou na gaveta. "Sei lá o que estará pensando de mim aquele guri?", indagou o poeta. Pois quero dizer que, de minha parte, não escondo na gaveta a fotografia aí de cima. E pelo que conheço do Santa, ele também não se envergonha do jornal ali ao lado.

Com todos os acertos e erros, com os imperceptíveis retoques de um tempo que nos tornou mais simples, hoje é dia de comemorar os 40 anos desse companheiro de jornada, assim como fiz quatro anos atrás. Não é tempo de olhar para trás nem de sentir saudade. Aos 40, ainda há muito hoje. Não dá vontade de ficar no ontem nem de parar. O que quero mesmo dizer neste 22 de setembro é um muito obrigado ao jornal e a todos que ajudaram a cuidar dele, porque ele nunca me negou a mão. Por ter chegado até aqui, Santa, hoje te abraço e me sinto agradecido como um cão.

* Título de um poema do cubano Rafael Alcides Perez que traduz bem a trajetória de quem chega aos 40 anos.

 

Grupo RBS  Dúvidas Frequentes | Fale Conosco | Anuncie | Trabalhe no Grupo RBS - © 2024 clicRBS.com.br • Todos os direitos reservados.