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Geral  | 29/07/2013 22h24min

Papa surpreende com declaração sobre homossexualidade

No retorno ao Vaticano, o Pontífice falou sobre temas como sexo e casamento gay

André Mags e Larissa Roso  |  andre.mags@zerohora.com.br / larissa.roso@zerohora.com.br

Uma frase pronunciada nos céus causou um rebuliço planetário nesta segunda-feira.

O papa Francisco viajava de volta à Itália, após sua estada no Brasil para a Jornada Mundial da Juventude, quando declarou, em entrevista coletiva a jornalistas dentro do avião da Alitalia: "Se uma pessoa é gay, procura Deus e tem boa vontade, quem sou eu para julgá-la?".

>> Leia todas as matérias sobre a vinda do Papa ao Brasil

Os reflexos foram imediatos à divulgação deste e de outros pronunciamentos de Jorge Mario Bergoglio na viagem. Grupos gays e padres progressistas comemoraram, notícias circularam com mensagens positivas sobre o começo da aceitação da homossexualidade no catolicismo.

Nem tanto, nem tão pouco. Ainda que possa ter sido a melhor receptividade de um papa aos gays na história, a homossexualidade ainda está longe de ser tolerada pelo Vaticano.

Ao mesmo tempo em que afirmou que não se deve marginalizar os gays, o Pontífice reiterou que as relações entre pessoas do mesmo sexo não passaram a ser aceitas pela Igreja. Ainda assim, há vaticanistas que enxergam uma abertura sem volta nessa reflexão.

É o caso do frei franciscano Jorge Hartmann, que trabalhou durante três anos na Rádio do Vaticano e hoje é comissário da Terra Santa no Rio Grande do Sul. O frei não teme dizer que a "porteira está aberta" para a discussão de outros tabus, como a ordenação de homens casados.

- Creio que, em breve, também a questão da falta de vocações deve entrar em pauta. O Papa mandou a Igreja ir para a rua, ao encontro do povo, né? Bem aquilo que Jesus fazia. Mas não temos pessoas. Como fazer? Aí vem a questão da ordenação de homens casados — aponta Hartmann.

Entre estudiosos, a frase de Francisco não esteve impregnada de grande novidade. Leandro Chiarello, diretor da Faculdade de Teologia da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), citou as divergências entre o estilo do argentino e o dos seus antecessores como a grande causa para a declaração ter surtido efeito.

Espontaneidade, improvisação e proximidade são características claras que em pouco tempo se tornaram uma marca do "papa latino", que, para os religiosos europeus mais ortodoxos, é pejorativamente um "moderninho".

- Não é que seja novidade o que o Papa disse. É o modo como ele fala. O papa Francisco tem inovado e usado uma forma bastante coloquial. Ele tem se apresentado como um legítimo pastor, que conversa com suas ovelhas paroquianas, orientando-as - diz Chiarello.

Satisfeitos, ativistas do movimento gay exaltaram o potencial de conscientização do discurso. Membro do Diversidade Católica, grupo do Rio de Janeiro formado por leigos que buscam a inclusão de homossexuais na Igreja, Cristiana Serra também destacou o contraste entre as palavras de Francisco e as de ocupantes anteriores do cargo.

Francisco não sinalizou qualquer mudança de princípios, mas deixou evidente, segundo ela, a condenação da violência e da exclusão.

- Embora a doutrina diga que é preciso acolher o gay com respeito, por parte da hierarquia e dos fiéis nem sempre era isso que a gente via. Bento XVI não perdia oportunidade para levantar a bandeira contra os gays. Francisco vem criticando as pessoas que tranformam a Igreja numa instância de vigilância, de controle moral. Falar abertamente pela acolhida e pelo respeito vem trazer uma mudança muito grande - avaliou Cristiana.

Célio Golin, coordenador do Nuances - Grupo pela Livre Expressão Sexual, declarou-se surpreso com as respostas do Papa e confiante que a discriminação possa ser amenizada. Ele evita, entretanto, prever avanços na abordagem de questões como o casamento gay.

- É a posição do Vaticano ou é uma posição mais individual do Papa? Essa é a pergunta que ainda não tem uma resposta. Os documentos que o Vaticano divulga em relação à homossexualidade são muito conservadores e preconceituosos. Vamos ver se vai ter algum desdobramento - afirmou Golin.

>> Leia mais opiniões sobre a frase do papa Francisco

 

Os outros papas

João Paulo II (1978-2005)

Foi implacável com os gays, as liberdades sexuais, o aborto e a contracepção. Durante seu pontificado, a Igreja adotou uma linha inflexível em relação a esses temas, não admitindo nem mesmo o uso de preservativos.

- O homossexualismo é uma ofensa aos cristãos - disse, ao falar a uma multidão na Praça de São Pedro, em 2000.

Bento XVI (2005-2013)

Manteve a postura rígida quanto às questões morais - como cardeal, Joseph Ratzinger foi um dos pilares do pontificado de João Paulo II na defesa dessa linha. Em sua gestão, o Vaticano chegou a organizar conferências para frear a legalização de casamentos gays.

- A Igreja classifica os casamentos homossexuais como imorais, artificiais e nocivos - declarou Bento.

 

As palavras do Vaticano

Os parágrafos 2357 a 2359 do Catecismo da Igreja Católica tratam de Castidade e Homossexualidade:

"A homossexualidade designa as relações entre homens ou mulheres, que experimentam uma atração sexual exclusiva ou predominante para pessoas do mesmo sexo. Tem-se revestido de formas muito variadas, através dos séculos e das culturas. A sua génese psíquica continua em grande parte por explicar. Apoiando-se na Sagrada Escritura, que os apresenta como depravações graves (103) a Tradição sempre declarou que 'os atos de homossexualidade são intrinsecamente desordenados'. São contrários à lei natural, fecham o ato sexual ao dom da vida, não procedem duma verdadeira complementaridade afetiva sexual, não podem, em caso algum, ser aprovados."

"Um número considerável de homens e de mulheres apresenta tendências homossexuais profundamente radicadas. Esta propensão, objetivamente desordenada, constitui, para a maior parte deles, uma provação. Devem ser acolhidos com respeito, compaixão e delicadeza. Evitar-se-á, em relação a eles, qualquer sinal de discriminação injusta. Estas pessoas são chamadas a realizar na sua vida a vontade de Deus e, se forem cristãs, a unir ao sacrifício da cruz do Senhor as dificuldades que podem encontrar devido à sua condição."

"As pessoas homossexuais são chamadas à castidade. Pelas virtudes do autodomínio, educadoras da liberdade interior, e, às vezes, pelo apoio duma amizade desinteressada, pela oração e pela graça sacramental, podem e devem aproximar-se, gradual e resolutamente, da perfeição cristã."

Fonte: www.vatican.va

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