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Geral  | 23/02/2013 12h02min

Game usado por professores vira febre entre crianças e adolescentes

Espécie de Lego em formato de videogame permite montar, por exemplo, casas e cidades

Itamar Melo  |  itamar.melo@zerohora.com.br

Se você é pai de uma criança ou adolescente, são enormes as chances de que dentro de sua casa haja um infectado pela febre chamada Minecraft. Lançado há dois anos sem alarde ou expectativas, esse game de apresentação gráfica quase rudimentar se transformou rapidamente em um dos maiores sucessos da história dos videogames, com cerca de 40 milhões de adeptos. Muitos deles são professores que utilizam o jogo como plataforma para ensinar.

Criado pelo sueco Markus Persson, o Minecraft tem sido descrito como uma espécie de Lego em formato de videogame. A proposta é que o jogador construa o que sua criatividade mandar a partir das peças e recursos oferecidos — é possível erigir casas, cidades, mundos. Não há nenhum objetivo definido, nem possibilidade de vitória, mas a garotada vidrou.

— No início, não achei muito interessante, porque eu não sabia nada. Depois fui aprendendo a construir as coisas. É um jogo que permite criar um mundo novo desde o início — diz um dos fãs, o morador de Porto Alegre Bernardo Nassau, 12 anos, que já desenvolveu vários mundos no Minecraft.

Enquanto joga e descobre como manusear os blocos, Bernardo se comunica via Skype com uma legião de amigos entretidos na mesma atividade. Ele também consulta na internet vídeos que mostram mundos feitos por outros jogadores, geralmente acompanhados de explicações divertidas do criador. Os vídeos no You Tube se transformaram em um fenômeno à parte.

>>> Leia mais: Escolas usam games para ensinar

A mãe do garoto, a engenheira eletrônica e de telecomunicações Graziela Nassau, diz que é preciso ter pulso firme, ou o filho perde a noção do tempo e passa o dia inteiro a jogar. Ao mesmo tempo, ela vê virtudes no game:

— Ele tem recursos que estimulam a criatividade, a visão espacial, a arquitetura. Outro dia, o Bernardo ficou empolgado porque descobriu como usar um recurso de energia elétrica que permitiu automatizar o esconderijo dele. É um jogo que pode fazer bem, mas entendo que tem de haver limites.

Disciplina obrigatória

O potencial do game foi detectado rapidamente por escolas de todos os cantos do planeta. Na Suécia, um estabelecimento chegou a transformar o Minecraft em disciplina obrigatória. O interesse educacional levou os desenvolvedores do game a criar, em parceria com programadores e educadores da Finlândia e dos Estados Unidos, o projeto Minecraft.edu, para facilitar o acesso e o uso do jogo nas escolas. Até a Organização das Nações Unidas (ONU) está usando o game, em um programa para engajar jovens no desenvolvimento de propostas de revitalização de áreas degradadas.

Atrativo diferenciado

Para a professora Léa Fagundes, da UFRGS, um jogo como o Minecraft é uma prova de que o grande atrativo dos videogames não está na violência ou nos gráficos elaborados, e sim na possibilidade de permitir descobertas — o que os torna adequados para uso na educação.

— Os programadores não conhecem a psicologia da criança e imaginam que é a violência e a destruição que tornam os jogos atrativos. Mas o lúdico está em experimentar, explorar objetos, fazer descobertas — explica.

Confira vídeo feito por um jogador de Minecraft, que já alcançou mais de 1,8 milhão de visualizações no YouTube:

Entrevista: Gilson Schwartz, diretor do Games for Change Latin America


Foto: Joyce Budal, Divulgação

O professor da Universidade de São Paulo (USP) Gilson Schwartz dirige há dois anos a Games for Change Latin America, uma instituição sem fins lucrativos que promove a criação e a utilização de jogos digitais como recurso educacional. O objetivo da rede, que nasceu em 2004 nos Estados Unidos, é usar os games para transformar o ensino, a economia e a sociedade. Na entrevista a seguir, Schwartz fala das potencialidades dos jogos — e também de seus perigos. Confira os principais trechos.

ZH – Quais são os trunfos dos games para servir como aliados da escola?

Schwartz – O trunfo do game de qualidade é manter o jogador numa posição de protagonismo e interesse. Na escola, despertar a curiosidade, manter a atenção e estimular a criatividade dos alunos são os principais desafios. Há um potencial de aproveitamento de tecnologias, interfaces e mecânicas de jogo em todas as disciplinas. De outro lado, as escolas são espaços competitivos, de classificação por notas em provas, trabalhos, seminários. É preciso cuidado para usar os games não apenas como mais uma esfera onde a competitividade é exacerbada.

ZH – Um game produzido para o mercado pode ser usado na educação ou é mais adequado que se recorra a jogos desenvolvidos para fins educativos?

Schwartz – Há espaço para as duas possibilidades. A escolha dependerá da qualificação do professor e da criatividade dos alunos.

ZH – Como um professor pode utilizar um game para trabalhar o currículo de sua disciplina?

Schwartz – O maior erro é enxergar no game apenas um instrumento adicional para estimular a competição entre os alunos. Insisto na importância dos games como produtos audiovisuais estimulantes e imersivos, ou seja, com enorme potencial para despertar a criatividade, a imaginação, a fantasia. Submeter o aprendizado a uma tecnologia que apenas agiliza ou massifica a competição por posicionamento em rankings é o maior erro numa perspectiva pedagógica que pretenda ir além do adestramento, da decoreba e da massificação.

ZH – Para muitos pais, os games são um motivo de preocupação. Existe a ideia de que eles tomam um tempo que poderia ser melhor aproveitado. Essa é uma maneira errada de encarar a questão?

Schwartz – Corretíssima. Os games são criados e desenvolvidos com base no que há de mais avançado em tecnologia, neurociência e efeitos especiais. São cientificamente produzidos para criar uma imersão, uma entrega total ao espaço virtual, que tem o evidente impacto de alienar o jogador do tempo real, para que possa mergulhar intensamente no tempo simbólico. Assim como a TV, a produção de games conta com a exploração total do tempo disponível, e não são poucos os casos de vício, dependência e alienação do tempo real. O cuidado com a organização do tempo é uma dimensão essencial da educação saudável.

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