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Política  | 18/08/2012 18h15min

Tensão marca julgamento do mensalão no Supremo

Responsáveis pelos primeiros votos na ação do mensalão, os ministros Joaquim Barbosa e Ricardo Lewandowski expõem clima de guerra que envolve o maior julgamento da Corte

Fábio Schaffner e Guilherme Mazui  |  fabio.schaffner@gruporbs.com.br; guilherme.mazui@gruporbs.com.br

O Supremo Tribunal Federal (STF) está em guerra. Classificada como "serpentário" pelos próprios ministros, a mais alta Corte do país julga o processo do mensalão em um ambiente beligerante e de franca divergência entre os dois juízes centrais da Ação Penal 470.

Não há sessão sem que o relator Joaquim Barbosa e o revisor Ricardo Lewandowski se estranhem. Desde o início do julgamento, no dia 2 de agosto, a dupla permanece intransigente na defesa de seus pontos de vista. As discussões invariavelmente têm descambado para o grito, como na última quinta-feira. Na ocasião, eles atrasaram em quase uma hora o começo da sessão por causa de um bate-boca em torno da metodologia de votação. Irritado, Lewandowski chegou ao ponto de ameaçar abandonar a revisão do caso.

A rusga prosseguiu em plenário, transmitida ao vivo pela televisão e internet, tão logo Barbosa anunciou que teria um voto fatiado, julgando por etapas cada um dos sete itens da denúncia elaborada pelo Ministério Público Federal. Lewandowski, que elaborou um voto para cada réu, opôs-se. Pela função, cabe a ele revisar toda a ação e tecer um voto em paralelo ao do relator. Nos bastidores, Lewandowski disse que faria um contraponto a Barbosa.

— Estaremos adotando a ótica do Ministério Público. Essa tentativa de fatiar a leitura do voto é antirregimental — reagiu.

— Isso é uma ofensa — rebateu Barbosa.

O episódio resultou em mais 30 minutos de embate, com intervenções constantes do ministro Marco Aurélio Mello. Nem mesmo o presidente Carlos Ayres Britto, reconhecido pela fidalguia, conseguiu desfazer o mal-estar. Somente ao final da sessão, Lewandowski foi persuadido por outros ministros e acabou cedendo à proposta do antagonista.

— O que está em jogo é a instituição, que ficará manchada se nós não formos capazes de chegar a esse consenso — avalia Marco Aurélio.

O atrito expôs como o temperamento do relator e do revisor estão à flor da pele no mensalão. Com fama de intratável na Corte, Barbosa tem interpelado todos os ministros que discordam de suas opiniões, postura que fez Mello chamá-lo de "todo-poderoso". Já Lewandowski tem deixado claro seu desconforto com a rapidez que o STF imprimiu ao processo.

Especialista aponta falta de diálogo entre os membros da Corte

Em 2007, no recebimento da denúncia, ele foi o ministro que mais discordou do voto de Barbosa. No primeiro dia de julgamento do mensalão, foi chamado de desleal pelo relator. Perplexos com a tensão reinante no plenário, os advogados dos réus argumentam que a culpa é do próprio STF, que não desmembrou o processo e hoje se vê obrigado a julgar um caso inédito na Corte pela complexidade e extensão.

— Esse processo, com quase 40 réus, é indomável. Tudo pode acontecer — diz um dos criminalistas.

Com mestrado e doutorado sobre o STF, o professor de direito Daniel Barile da Silveira condena o comportamento bélico. Para Silveira, a tensão é fruto do sistema adotado na Corte, segundo o qual cada ministro escolhe a sua tese e faz seu voto, sem discussão prévia com os colegas. Na Suprema Corte americana, exemplifica o professor, os ministros formam um consenso antes do início dos julgamentos.

— A discussão evidenciou que não existe uma sintonia na Corte, não poderia ter ocorrido na frente das câmeras. A credibilidade do Supremo está em jogo — critica Silveira.

Confira o que vai acontecer nos próximos dias:

l As sessões serão na segunda, quarta e quinta-feira, a partir das 14h. Segunda-feira, o julgamento será retomado com o voto de Lewandowski.

l Conforme definido na semana passada, os votos serão fatiados. Ou seja, Lewandowski votará apenas sobre o item abordado por Joaquim Barbosa, referente a quatro dos 37 réus: o deputado federal João Paulo Cunha (PT-SP), o empresário Marcos Valério e dois ex-sócios dele, Cristiano Paz e Ramon Hollerbach.

l Trata-se do terceiro item da denúncia, que, no total, soma sete itens. Em seu voto, Barbosa condenou Cunha por crimes de corrupção passiva, lavagem de dinheiro e peculato. Também votou pela condenação de Valério e seus sócios por corrupção ativa e peculato.

l Depois de Lewandowski, votam os demais nove ministros, em ordem inversa de antiguidade, ou seja, do último nomeado até o mais antigo na Corte. O presidente é o último a se pronunciar.

 
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