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Geral  | 06/08/2012 00h59min

Brasil entre os campeões de mortes por Gripe A no mundo

Três Estados do Sul concentram maior parte dos óbitos provocados pelo vírus

Marcelo Gonzatto  |  marcelo.gonzatto@zerohora.com.br

As 257 mortes registradas até a semana passada colocam o país entre as regiões mais afetadas no planeta pelo vírus Influenza A (H1N1) — em um patamar semelhante ao verificado no México durante o último inverno no Hemisfério Norte e superior ao registrado atualmente em nações muito mais populosas como a Índia.

Os três Estados do Sul concentram a maior parte dos óbitos provocados pela agressividade do vírus, com pelo menos 157 vítimas no Rio Grande do Sul, no Paraná e em Santa Catarina. Esse número poderá aumentar hoje, quando o Estado deve divulgar um novo boletim sobre o avanço da doença. Somente o sul do Brasil, onde vivem 27 milhões de pessoas, supera o número de mortes registradas até a última semana de julho na Índia. Lá, onde vivem 1,2 bilhão de habitantes, foram verificados 122 mortos.

Não há como estabelecer um ranking preciso do impacto do H1N1 no mundo, porque as notificações demoram para chegar à Organização Mundial da Saúde (OMS), os dados dos países do Hemisfério Sul são menos completos do que os do Hemisfério Norte, onde o inverno já acabou, e os padrões de vigilância epidemiológica variam bastante. Porém, as informações disponíveis fazem com que a infectologista Nancy Bellei, professora da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e uma das principais especialistas em Influenza do país, sustente que o Brasil tem uma das piores situações conhecidas em relação ao H1N1 este ano.

— Os dados demoram muito para chegar aos órgãos internacionais, mas a situação mais complicada que vemos hoje é no Brasil, sobretudo no Sul. É importante lembrar que, em 2009, o Paraná já havia registrado a mais alta taxa de mortalidade do H1N1 no mundo. Claro que o clima interfere, mas isso tem de ser melhor estudado porque outros países frios não enfrentam o mesmo cenário — afirma a especialista.

Uma das razões para o Brasil padecer com a gripe A é que outras regiões do Hemisfério Sul, como Argentina, Chile, Austrália ou Nova Zelândia, estão apresentando circulação predominante de outros tipos de vírus Influenza, como o B ou o H3N2. O problema, segundo o epidemiologista gaúcho Jair Ferreira, é que o H1N1 tende a provocar mais danos em suas vítimas.

— Além de a população ser mais suscetível pelo fato de ser um vírus novo, ele também dá mostras de ser mais virulento do que outros tipos de Influenza — avalia o especialista.

Além disso, na avaliação de especialistas, a falta de uma política de prevenção específica para o Sul do Brasil e deficiências no atendimento primário como a demora para a aplicação do antiviral Tamiflu (veja quadro) ajudam a explicar por que o país apresenta uma escalada de mortes superior a outras regiões do globo. Os demais países, como Estados Unidos, Canadá, os europeus ou vizinhos como Argentina e Chile utilizam estratégias semelhantes às do Brasil — vacinação de grupos de risco e tratamento com antiviral.

Porém, Conforme Nancy, a preocupação em tomar a vacina de forma gratuita ou no setor privado é maior nesses outros países, e a cultura de atendimento está mais adiantada no tratamento precoce com o antiviral. O infectologista da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) Rodrigo Angerami concorda com essa avaliação:

— Acredito que reforçar as medidas educativas, não apenas junto à população, mas em relação aos profissionais da saúde quanto à importância de recomendar a vacinação anual e incorporar o uso precoce de antiviral quando houver indicação são imprescindíveis.

AS RAZÕES DO SURTO

Confira alguns dos motivos que sujeitam o Brasil a ser um foco mundial do H1N1:

Falta de estratégias regionais

Especialistas consideram um erro, para um país com o tamanho e as variações geográficas, climáticas e populacionais do Brasil ter uma estratégia unificada de combate ao vírus. Regiões costumeiramente mais afetadas pelo vírus Influenza, como o sul do Brasil, deveriam contar com um tratamento diferenciado. Isso poderia incluir, por exemplo, vacinações mais abrangentes — incluindo mais faixas etárias do que a regra nacional de menos de dois ou mais de 60 anos, por exemplo.

Falhas no atendimento

A epidemia de 2009 deixou importantes lições sobre como lidar com o vírus Influenza, mas também legou maus hábitos ao sistema de atendimento médico. Na avaliação da infectologista Nancy Bellei, os profissionais de saúde do país ainda não apresentam a agilidade necessária para ministrar o antiviral Tamiflu no prazo indicado de 48 horas desde o início dos sintomas — ainda por reflexo da política oficial adotada na época da epidemia.

— Muitos pacientes que foram a óbito receberam tratamento tardio. Isso é um problema que precisa ser resolvido na rede primária de atendimento — observa Nancy.

Falta de agilidade

Por ser uma doença considerada "explosiva", ou seja, de rápida disseminação, a gripe tende a desafiar as estruturas burocráticas destinadas a monitorá-la e combatê-la. Segundo a infectologista Nancy Bellei, atualmente no país se demora até seis semanas desde que o vírus Influenza começa a circular para essa informação chegar ao conhecimento das autoridades oficialmente. São cerca de três semanas para ocorrerem os primeiros casos graves, e outras duas ou três semanas para o resultado de exames ser inserido em boletins oficiais. Países próximos como Argentina e Chile, segundo ela, conseguiriam rastrear os surtos em menos tempo do que o Brasil.

Relaxamento da população

Não é apenas o setor governamental que deve aprimorar o monitoramento e à reação ao traiçoeiro vírus da gripe. Depois da pandemia de 2009, parte da população brasileira abandonou hábitos fundamentais como higienizar adequadamente as mãos ou se vacinar precocemente para enfrentar o período mais rigoroso do inverno. Mesmo os grupos que tinham direito à vacinação gratuita subestimaram a importância das doses — a campanha acabou sendo prorrogada duas vezes no Rio Grande do Sul, por exemplo.

Padrões de circulação do vírus

Além de fatores estratégicos, a circulação de um determinado tipo de vírus também depende de elementos naturais difíceis de controlar como a circulação de pessoas infectadas, variações climáticas e outros. Em alguns países, o H1N1 é o vírus predominante. Em outros, porém, a Influenza B ou outros tipos de Influenza A acabam se tornando os mais frequentes. Outros países do Hemisfério Sul estão enfrentando surtos de gripe, como Austrália e Nova Zelândia — mas provocada pelo subtipo H3N2.

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