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Política  | 15/07/2012 08h03min

"Precisamos enfrentar o problema da impunidade", afirma cientista político

Fernando Filgueiras aponta que Brasil precisa ampliar mecanismos de punição à corrupção

Guilherme Mazui  |  guilherme.mazui@gruporbs.com.br

Um dos autores do livro Corrupção e Sistema Político no Brasil, o cientista político Fernando Filgueiras acredita que, no país, cada vez mais amadurece a democracia, mas é preciso ampliar os mecanismos de punição para frear a sucessão de escândalos.

Professor do departamento de Ciência Política da Universidade Federal de Minas Gerais, Filgueiras reclama das falhas no processo de investigação e salienta que a corrupção não é cultural no Brasil, mas sim fruto da falta de aprimoramento dos mecanismos de controle.

Confira a entrevista que o professor concedeu a ZH:

Zero Hora — Por que o país produz escândalos em série?

Fernando Filgueiras — Os escândalos podem fazer parecer que a corrupção é muito mais regra do que exceção no país. Não é o caso. Desde a Constituição de 1988, o Estado brasileiro tem aprimorado suas instituições de controle. O aprimoramento cria uma virtude ambígua. Melhora a gestão mas, por outro lado, desvela a corrupção no sistema político e na administração pública. Apesar disso, o enfrentamento da corrupção ainda tem muito o que ser aprimorado.

ZH — O foro privilegiado incentiva a corrupção e a impunidade?

Filgueiras — O foro especial é muitas vezes necessário nas democracias. Foi criado para proteger os parlamentares do arbítrio. O problema é o modo como construímos isso no Brasil. O que era para ser especial tornou-se um privilégio de políticos para se verem livres de responsabilidade e de punição.

ZH — A Justiça tem sua contribuição na realidade da política brasileira?

Filgueiras — Sim. O Judiciário não pune a corrupção, especialmente na política. Todavia, esse cenário vem mudando. E a responsabilidade não é apenas do Judiciário, mas do sistema judicial como um todo. Existem ainda muitos problemas nos processos de investigação que impedem a punição da corrupção.

ZH — O eleitor também tem sua parcela de culpa?

Filgueiras — O eleitor é o último dos culpados. Ele é submetido a um processo confuso e escandaloso de informações e é vítima da desigualdade que a própria corrupção produz. Não podemos culpar o eleitor. Até porque ele não tem mecanismos para punir os políticos durante o mandato.

ZH — Pode se dizer que a corrupção é cultural no Brasil?

Filgueiras — Essa questão é muito pobre. O brasileiro apoia a democracia, desconfia dos políticos e das instituições e é extremamente crítico à corrupção. O problema da corrupção não é cultural. O que existe é uma enorme ambivalência em relação aos valores e ao interesse público.

ZH — Como combater a corrupção?

Filgueiras — Devemos manter a rota de construção institucional dos controles públicos e fortalecer a democracia. Não há outro remédio. Mas, imediatamente, no caso brasileiro, precisamos enfrentar o problema da impunidade.

ZH — A ética nas relações políticas é mais retórica do que prática, como se viu no caso do senador Demóstenes Torres?

Filgueiras — Não se trata de retórica. Tem de haver valores públicos para que haja uma perspectiva ética na política. A ética é uma perspectiva prática, porque ela tem a ver com o que construímos no cotidiano. Ainda temos muito o que avançar, por isso precisamos estar calcados em instituições fortes, que sejam capazes de produzir e reproduzir valores éticos.

ZH — Qual a expectativa do senhor em relação ao julgamento do mensalão pelo Supremo Tribunal Federal?

Filgueiras — O cenário é um pouco nebuloso ainda. Independentemente do processo judicial e do emaranhado de leis que serão evocadas durante o julgamento, existe uma escolha política a ser feita. Acredito que o STF não vai querer se desmoralizar inocentando os envolvidos no mensalão.

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