Porto Alegre até no nome
No dia em que a Capital completa 243 anos,
ZH conta a história de uma família que homenageou a cidade
adotando-a como sobrenome
Alberto pulou de uma cidade para outra durante três décadas, mas só conseguiu sentir-se em casa quando retornou a Porto Alegre. Vive cercado pelos morros do bairro Cascata, em uma residência de madeira construída há mais de 70 anos, a mesma em que passou a adolescência.
Elisabeth não queria viver no mato, mas um dia aceitou deixar o Menino Deus de sua infância porque o mato havia se transformado em metrópole. Construiu uma casa em Ipanema, perto da praia em que costumava nadar até o sol mergulhar no Guaíba.
Aquiles habitou até os 25 anos um casarão em pleno coração da cidade, na Rua Riachuelo, onde via o pai engenheiro traçar os destinos da Capital. Morador pioneiro do bairro Intercap, hoje prefere manter distância do Centro, que não visita desde 2013.
Alberto, Elisabeth e Aquiles não se conheciam até a sexta-feira, quando foram reunidos por ZH, mas sempre tiveram em comum o fato de Porto Alegre correr em suas veias. Não só porque suas trajetórias pessoais estão entrelaçadas com a evolução da Capital, que comemora hoje 243 anos. O que os três compartilham é um sobrenome raro, evocativo e recheado de histórias. Alberto, Elisabeth e Aquiles carregam a cidade no nome. Eles se chamam Porto Alegre.
Parte 1: O encontro
Alberto (camisa clara) abriu sua casa de 1944 para conhecer outros membros da família Porto Alegre: Aquiles e as irmãs Elisabeth (à esquerda) e Margareth
Foto: Anderson Fetter
O  encontro entre Alberto, Aquiles, Elisabeth e sua irmã, Margareth, ocorreu na manhã da última sexta-feira, na residência de Alberto, uma casa de madeira daquelas que eram o padrão nos bairros da Capital até poucas décadas atrás, mas que agora estão em célere processo de desaparecimento. — A única coisa da casa que não é original são os cupins — brinca o proprietário.
À medida que a conversa entre os primos distantes avançava, os quatro Porto Alegre buscavam parentes em comum e tentavam encaixar uma ou outra peça do seu quebra-cabeça genealógico.
O meu pai era Armindo, de Cruz Alta — contou Alberto
Ah, sei! O meu pai falava dele — respondeu Aquiles.
Margareth contou que seu avô, Alcibíades, também era de Cruz Alta.
Era irmão do meu avô Armindo! — concluiu Alberto.
Armindo? Meu avô falava muito dele — lembrou Elisabeth.
Em instantes, o quarteto trocava histórias sobre as origens da família, o costume de usar nomes iniciados em "A" e um suposto livro perdido com toda a genealogia dos Porto Alegre.
Isso eu tenho, mas não é um livro — atalhou Aquiles, atraindo atenções generalizadas.
O encontro terminou com a troca de uma série de papelotes com nomes e números de telefone e promessas generalizadas de que a aproximação terá continuidade. 
Vai ser bacana. Ainda estamos meio confusos com o parentesco, porque são muitos nomes iguais e histórias que se repetem. Temos de sentar e dar um sentido a isso tudo — afirmou Aquiles.
Parte 2: Versões sobre um sobrenome
O escritor Apolinário (1844 - 1904) e o inventário de seu pai, Antônio José, o criador do sobrenome
Foto: Acervo Benedito Saldanha
Em uma pasta, em meio a outras relíquias, Aquiles, 69 anos, conserva uma monografia universitária sobre a origem do sobrenome da família, elaborada a partir de depoimentos concedidos pelo pai, o engenheiro Alcindo Guanabara Porto Alegre. Conforme esse relato, o primeiro a adotar o nome teria sido Antônio José Gomes (1818 — 1863), um filho de portugueses nomeado inspetor do porto em Rio Grande.
Consta que, na mesma cidade, havia outra pessoa com nome idêntico, um rematado malandro mencionado com frequência na crônica policial. Alvo de brincadeiras e constrangido pela possibilidade de ser confundido com o homônimo, o inspetor encaminhou ao Rio de Janeiro uma solicitação para troca do nome. Pediu para ser Porto Alegre. Com anuência do Império, virou Antônio José Gomes Porto Alegre. 
Não sei o motivo da escolha, se era porque ele pretendia mudar para Porto Alegre — comenta Aquiles.
O certo é que três filhos de Antônio viriam a sacudir o mundo intelectual da capital gaúcha anos depois, os escritores e jornalistas Apolinário Porto Alegre (1844 — 1904), Aquiles Porto Alegre (1848 — 1926) e Apeles Porto Alegre (1850 — 1917), fundadores da Sociedade Partenon Literário.
Os prenomes do trio não começam com "A" por acaso. Reza a tradição familiar que, ao adotar a nova identidade, Antônio José Gomes determinou que os homens da família, gerações afora, deveriam sempre receber um nome iniciado com a primeira letra do alfabeto, de forma que as iniciais de todos os varões fossem APA. 
Quem consulta a lista telefônica comprova que a tradição é mantida até hoje por vários ramos da família. Os nomes iniciados por "A" predominam, inclusive entre as mulheres. Tome-se o caso de Aquiles, o morador do bairro Intercap. Ele é bisneto do Aquiles original, neto de Alfredo, filho de Alcindo e irmão de Alfredo e de Apeles. Batizou os filhos de Atílio, Andiara, Andressa e Augusto. Em uma ocasião, soube da existência de outro Aquiles Porto Alegre na cidade. Foi investigar e descobriu tratar-se de um negro — ou seja, a família ganhou diversidade, mas não perdeu o costume do "A". 
Parte 3: Mais versões sobre um sobrenome
No caso de Alberto, 63 anos, o morador do bairro Cascata, a tradição foi interrompida. Seu avô chamava-se Armindo. O pai, Altamiro. Mas na hora de escolher o nome dos filhos, ele pendeu para o "TH": Thiago, Thales e Themis.
Fugi da regra — reconhece.
A causa talvez seja o fato de Altamiro, o pai, não ter falado muito na história da família. Alberto nem sabe de qual dos primeiros irmãos Porto Alegre ele descende. Ouviu algo sobre a origem do sobrenome por outras fontes, em uma versão um pouco diferente da que é contada por Aquiles.
O que ouvi é que havia em Rio Grande e Porto Alegre dois comerciantes com o mesmo nome. Eles eram do mesmo ramo, não sei qual, e ocorriam desencontros de remessas. Então o de Rio Grande resolveu incluir o Porto Alegre no nome. Não sei porque não foi o de Porto Alegre que fez isso, acho meio inverossímil. Nossa família vem desse comerciante de Rio Grande. O que ouvi é que esse Gomes teria pedido ao Dom Pedro para acrescentar o Porto Alegre, mas não sei se isso já não é engrandecimento da história — diz Alberto. 
Uma terceira versão corria na família de Elisabeth, 64 anos, a moradora de Ipanema:
Meu avô dizia que quando os casais açorianos vieram para cá, era a família Gomes. Aqui, eles colocaram o nome de Porto Alegre, porque o porto era muito cheio de festas e de música — conta ela.
Parte 4: Elisabeth e a expansão para o sul
A família de Elisabeth tinha um empreendimento que se tornou mítico, o Cine Ipanema
Foto: Anderson Fetter
"Mais um cinema deverá ser inaugurado, amanhã, dia 28, nesta Capital. Trata-se do Cine Ipanema, localizado na Avenida Flamengo, 381, no Balneário Ipanema, pertencente à Cinematográfica Ipanema Ltda. De construção moderna, a nova casa de espetáculos deverá desempenhar importante papel na vida social do populoso bairro do 6º Distrito. Dotado de moderna aparelhagem, contará o Cine Ipanema com todos os últimos sistemas de projeção. Na sessão inaugural, com seu início marcado para às 20 horas, será exibido o belíssimo filme musical Serenata no México".
A notícia de jornal, publicada em 27 de novembro de 1958, anunciava uma enorme mudança na rotina de Elisabeth Porto Alegre, então uma garota de oito anos. O novo cinema, que ganharia um status mítico na história da cidade, era um empreendimento conjunto do pai, José Arcílio Porto Alegre, e do tio, Antônio Carlos Porto Alegre. Mais de meio século depois, ainda soa na memória de Elisabeth a sirene acionada para avisar que um filme estava para começar, marca registrada do estabelecimento.
Dava para ouvir a sirene em toda Ipanema. Havia sessões na quarta, na sexta, no sábado e no domingo. Quarta-feira era o dia das damas, quando as mulheres não pagavam. Lembro que o palco era lindo, com cortinas coloridas — conta.
Praia de Ipanema era um point nos anos 1960
Foto: Reprodução
Além de ser personagem de uma era em que os cinemas de bairro reinavam, Elisabeth protagonizou outro enredo fundamental na história recente da cidade, o do crescimento urbano e da consequente expansão para a Zona Sul. Apesar de a notícia de jornal definir Ipanema como uma área populosa, a lembrança que Beth tem do bairro nos anos 1960 é a de uma região remota, com poucos moradores e muitas casas de veraneio. Ipanema era, essencialmente, um balneário — um tio dela mantinha à beira do Guaíba um insólito estabelecimento que alugava biquínis e sungas para os visitantes que chegavam em ônibus lotados para passar o dia na praia.
A praia de Ipanema era um desfile — conta a irmã de Elisabeth, Margareth, 57 anos. A família tinha terras no bairro, mas durante décadas Elisabeth resistiu à ideia de mudar-se para lá. Os terrenos eram um matagal. Ela vivia no Menino Deus. O Guaíba também ficava perto, a uns poucos passos — até ir embora, levado para longe pelos aterramentos que deram origem ao Parque Marinha do Brasil. Na esquina, situava-se o fim da linha do bonde. Antes de embarcar para o Centro, era preciso entrar numa roupa elegante e subir no salto, requisitos básicos para desfilar na Rua da Praia.
Eu amava o Menino Deus. Era como uma cidadezinha do interior. Não havia medo de nada, não tinha assalto — conta Elisabeth.
Várias vezes por semana, ela e a irmã viajavam à distante Ipanema, para rondar os bastidores do velho cinema. No verão, quando Porto Alegre inteira se encontrava lá, de sunga e biquíni, o movimento na bilheteria explodia.
O cinema lotava. Se era filme do Roberto Carlos, meu Deus do céu! Todo mundo sapateava no piso de madeira. Em filmes do Teixeirinha, a fila ia até a praça — conta Margareth.
As irmãs Porto Alegre, como milhares de porto-alegrenses, decidiram migrar para o sul. O Menino Deus transformou-se em bairro agitado, de prédios e comércio. Enquanto isso, os matagais da família em Ipanema viraram zona urbanizada. Elisabeth construiu sua casa lá, a uma pequena distância da praia em que nadava nos dias de meninice.
Quando eu tinha meus 14, 15 anos, era maravilhoso tomar banho no Guaíba. Hoje não dá para ir nem na areia — lamenta.
Parte 5: Aquiles e o declínio do Centro
Aquiles vivia no centro. Hoje, prefere não andar por lá nem à luz do dia
Foto: Anderson Fetter
Depois de visitar a namorada, no bairro Petrópolis, Aquiles Porto Alegre apanhava um micro-ônibus para o Centro. Desembarcava tarde da noite, cruzava a penumbra da Praça da Alfândega a pé e subia por ruas vazias até chegar em casa, na Riachuelo. Nunca foi assaltado. Sequer foi importunado.
Essa é uma história de 50 anos atrás. Hoje, o ex-servidor do Tribunal Regional do Trabalho, como tantos outros moradores da Capital, prefere manter-se longe da área central da cidade mesmo durante o dia.
Na sala de sua casa do bairro Intercap, é por meio de imagens do Centro que Aquiles homenageia Porto Alegre. Logo na entrada, vê-se fixado à parede uma peça de madeira na qual a silhueta da cidade foi recortada prédio a prédio, a partir de uma foto feita do Guaíba. Mais adiante, em lugar de honra ao lado da lareira, Aquiles afixou um pôster com uma foto da Igreja do Rosário — o prédio original, construído por escravos e depois demolido para que se levantasse o templo atual.
Na campanha da Legalidade, Aquiles viu vizinhança encher-se de soldados
Jornal Última Hora
A imagem tinha o tamanho de uma carteira de cigarro, mas Aquiles achou um professor de fotografia que conseguiu ampliá-la dezenas de vezes. O pôster é um orgulho para ele:
Eu fiz isso pela beleza e porque nunca mais vai se ter isso aí. Essa foto é brilhante. Está judiada, mas pelo amor de Deus, que fique aí. Pouca gente conhece isso.
A dualidade na relação com o Centro é tão típica de Porto Alegre quanto o Laçador ou o pôr do sol no Guaíba. Por um lado, a região atrai — por causa do apelo sentimental, pela História que é a seiva de suas ruas. Mas também repele.
Vítima de um terrível processo de degradação nos anos 1970 e 80, virou sinônimo de trânsito caótico, falta de lugar para estacionar, insegurança, comércio pouco sofisticado, burburinho, confusão, protestos.
Aquiles viveu o Centro no tempo em que ele era, literalmente, o centro. Morador da Riachuelo, podia acompanhar os fatos históricos espiando pela janela. Durante a Legalidade, foi na calçada diante de sua casa que os soldados acamparam. Uns poucos passos permitiram a Aquiles testemunhar eventos marcantes, como os incêndios do lendário Grande Hotel, na Rua da Praia, ou do Cadeião, na ponta do Gasômetro. Ele estava no centro de tudo, mas da porta para dentro a vida era de arrabalde. O pátio dos fundos tinha uvas e bergamotas. Em cima, a laje servia de quadra para o futebol.
Aquiles não precisava sair de casa para ver as mudanças na cidade. Engenheiro da prefeitura, o pai, Alcindo Guanabara Porto Alegre, trabalhava no Plano Diretor.  Era uma espécie de GPS ambulante. Se alguém precisava deslocar-se a algum ponto menos conhecido, ligava para ele e recebia indicações precisas e instantâneas. Quando Leonel Brizola foi prefeito, entre 1956 e 1958, Alcindo assumiu como secretário municipal de Obras. Às vezes, levava Aquiles para ver os projetos em andamento nas fronteiras em expansão da cidade.
Aquiles morou no Centro até os 25 anos, em 1970. Mudou-se ao casar com a namorada do bairro Petrópolis, Imara Cavedon. Foi morar na Rua Eça de Queiroz. Mais tarde, com quatro filhos, construiu a primeira casa do quarteirão no bairro Intercap.
Hoje isso aqui é perto, mas quando viemos não tinha nada, era uma viagem — conta.
Aquiles diz que passa um ano inteiro sem pôr os pés no Centro, que procura fazer tudo o que precisa em outros lugares. Imara revela que os filhos nem conhecem a região central.
Se tiverem de ir sozinhos e destrinchar, não vão saber. Eles se criaram em bairro, em shopping — explica.
Parte 6: Alberto e o que a cidade não perdeu
Alberto mudou-se para o bairro Cascata e redescobriu a Porto Alegre da adolescência
Foto: Anderson Fetter
A cidade cresceu e se transformou, mas de alguma forma permaneceu a mesma. Através das décadas, manteve algo de essencial e indefinível capaz de provocar em seus filhos uma sensação imediata de pertencimento, por mais que ao redor tudo pareça diferente. Pelo menos essa é a história que nos revela um dos Porto Alegre, o coronel do Exército Alberto.
Filho de militar, ele viveu os primeiros anos na Serraria, nos confins da zona sul. Toda manhã, ainda escuro, era visto a percorrer com a capa preta do uniforme a calçada do quartel, para embarcar no ônibus das 5h40min e fazer a viagem de uma hora ao longo de descampados. Descia no Pão dos Pobres e completava a pé o trajeto até o Colégio Militar. Quando voltava para casa já eram quase 15h. Ainda dava tempo de um banho no Guaíba.
Bondes deixaram saudade em Alberto, que usava o meio de transporte para ir do bairro Cascata até o Colégio Militar, nos anos 1960
Foto: Shigueru Nagasawa
Com exceção das viagens ao colégio, só se saía da Serraria em ocasiões especiais, em algum domingo no qual a família colocava a melhor beca para vir tomar sorvete no Centro — recorda Alberto.
Em 1966, aos 14 anos, as distâncias diminuíram. A família transferiu-se para uma rua do atual bairro Cascata. Depois de ajudar com a mudança, Alberto sentou-se nos degraus diante da casa e viu a gurizada da vizinhança se reunir para jogar futebol na rua. Minutos depois, fazia parte de um dos times.
Alberto jogou futebol com os vizinhos quase todos os dias, até 1970, quando foi embora para a Academia Militar das Agulhas Negras, em Resende (RJ). Começava ali um período de três décadas distante de Porto Alegre. O oficial viveu em Cachoeira do Sul, Ipameri (GO), Caracaraí (RR), Belém (PA), Juiz de Fora (MG), Manaus (AM), Natal (RN), Rio de Janeiro. Casou, teve filhos, separou-se, montou casas. Mas:
Em todos os lugares onde andei, eu sentia que estava só de passagem. Não eram o meu chão.
No final dos anos 1990, quando estava se retirando com o posto de coronel, Alberto decidiu a voltar ao lar. A decisão significava distância dos três filhos, criados e ambientados no Rio. Instalou-se em um apartamento nas franjas da Redenção.
É difícil definir o que me atraiu de volta. Não tem uma coisa específica. Talvez tenha a ver com o sobrenome, que sempre foi meu nome de guerra. Eu sempre fui o tenente Porto Alegre, o capitão Porto Alegre. O certo é que eu tinha a sensação de que minha casa era aqui. Não me via em outro lugar. O Rio era bonito, mas eu não encaixava.
Ao voltar, Alberto abriu no Centro, perto do Quartel General, uma livraria voltada ao público militar. Em dado período, chegou a trazer os dois filhos mais velhos para ajudar. Cariocas da gema, eles não se adaptaram e voltaram ao Rio depois de um tempo. Carregam Porto Alegre no nome, mas não mantêm ligações com a cidade.
Foi como livreiro que o coronel da reserva conheceu os meandros da capital gaúcha. Ele dirigia por todos os cantos para fazer entregas e participar de feiras. Surpreendeu-se com o que viu.
Eu andei por tudo de mapa na mão. Barbaridade o que cresceu! Que troço grandão! Lá para a Zona Norte tem uma cidade inteira que eu nem sabia que existia — espanta-se ainda hoje.
Há um ano, Alberto descobriu que podia viajar de volta à adolescência e viver outra vez na Porto Alegre dos anos 1960. Mudou-se para a velha casa de madeira do bairro Cascata, construída em 1944. Os matos e morros ao redor haviam sido tomados por moradores, mas Alberto reconheceu a mesma escada onde sentou-se no dia da mudança, encontrou os mesmos vizinhos com quem jogou bola, notou que a rua estava igual. Em caminhadas, escalou as encostas de morro onde costumava colher macela na Sexta-Feira Santa, admirando a cidade inteira lá embaixo.
Não tem grande diferença. É o mesmo bairro de casas antigas, sem prédios. Lembra aquele tempo maravilhoso.
Parte 7: O peso do nome
Augusto Porto Alegre celebrou a família e a cidade em tatuagem
Foto: Adriana Franciosi
Augusto Porto Alegre, filho de Aquiles, estava em meio a uma temporada de seis meses na Nova Zelândia, em 2004, quando decidiu que precisava fazer uma tatuagem. Pesavam sobre ele as saudades da família e da cidade natal. De volta à capital gaúcha, tatuou nas costas as palavras "Porto Alegre", uma dupla homenagem. Foi sua primeira e única tatuagem.
Tatuagem é para sempre. Tu não podes te arrepender. E eu nunca vou me arrepender. Por causa do meu nome, acho que tenho uma relação meio mística, que torna mais forte o laço com Porto Alegre — diz o servidor público de 32 anos.
Como no caso dele, a coincidência entre o sobrenome e o nome da cidade acaba criando uma conexão de uma coisa com a outra entre muitos integrantes da família. O pai, Aquiles, relata que as confusões são frequentes (quando se apresenta, as pessoas em geral acham que ele está dizendo de que cidade é), mas considera-se honrado por carregar o nome.
Eu me sinto mais ligado à cidade. Apesar de todos os problemas que ela tem, criou-se um carinho especial.
Elisabeth, que todo mundo conhece como Beth Porto Alegre, apesar de ela levar também um "Zimermann" herdado do marido, afirma que o nome é tão forte que não há como fugir dele:
Vira uma marca registrada.
O militar Alberto, nome de guerra Porto Alegre em todos os quartéis por onde passou, sente-se mais próximo do solo onde nasceu:
Eu gosto do nome porque fico imaginando que tenho raiz no passado da cidade e também porque tenho afeição pela cidade. Vem tudo embrulhado.
Texto: Itamar Melo
Design e programação: Michel Fontes