Publicado em 18 de junho de 2016
REPORTAGEM
Cristiane Bazilio
cristiane.bazilio@diariogaucho.com.br
EDIÇÃO
Flávia Requião
flavia.requiao@diariogaucho.com.br
FOTOS
Carlos Macedo
carlos.macedo@zerohora.com.br
DESENVOLVIMENTO
Brunno Lorenzoni
brunno.lorenzoni@diariogaucho.com.br
Anna Fernandes
anna.fernandes@diariogaucho.com.br
Os astros de Hollywood Ashton Kutcher e a sua então mulher, Demi Moore, aproveitam a passagem pelo Brasil para um evento e tiram uns dias para relaxar na casa do amigo Luciano Huck, em Angra dos Reis, no Rio de Janeiro. Para evitar a aproximação de fãs e dos paparazzi, Guarda Costeira e seguranças privados são mobilizados.
O que eles nem imaginam é que uma operação de guerra está sendo montada. Uma equipe de cinco fotógrafos, entre eles, Gabriel Reis, 37 anos, não medirá esforços para captar imagens exclusivas do casal.
Assim que recebe a informação de que os atores se deslocam em direção à casa de Huck, ele aciona Dilson Silva, Gabriel Rangel, Délcio Silva e André Freitas, e todos partem rumo a Angra. Durante cinco dias, a rotina é uma só: sair às 5h para procurar, por mar ou terra, a melhor visão da casa do apresentador.
De lancha, a primeira tentativa é frustrada pela Guarda Costeira, que reboca o grupo alegando ilegalidade na documentação da embarcação. O jeito é se embrenhar na mata. Após horas sob sol forte, guiados por um morador, eles encontram o ponto de onde podem avistar o casal mergulhando no mar.
Estratégia certeira
Ali, lotam cartões de memória com registros dos astros, até serem avisados de que o segurança de Ashton, um israelense com experiência em selva, está caçando os paparazzi. Todos voltam, à exceção de Gabriel, que permanece no local, mas com a sua câmera vazia. Ao ser encontrado, tem o seu equipamento revistado pelo segurança e finge um ataque cardíaco para ser retirado da mata.
De volta à pousada, ele se junta ao grupo, que não se dá por vencido: enquanto três servem de isca na lancha, os outros dois alugam um barco a remo e, fingindo ser pescadores, aproximam-se da costa.
Foi assim, em fevereiro de 2011, que eles chegaram ao flagra que correu o mundo em sites e revistas como a edição espanhola da In Touch.
— O Rangel ligou chorando: “A gente tá rico! Fiz eles nus!”. Começamos a pular, gritar — lembra Gabriel, garantindo que “foi muito dinheiro”.
Há alguns anos, um flagra como este poderia ser o pé de meia de uma vida como paparazzi, fotógrafos de celebridades que integram uma indústria tão lucrativa como polêmica, movida por glamour, preconceito e um jogo de gato e rato em que, às vezes, os papéis de caça e caçador se invertem.
Hoje, a realidade é mais modesta, e a rotina, menos aventureira. O Diário Gaúcho passou três dias no Rio de Janeiro, no encalço destes profissionais que fazem girar o mercado de notícias sobre celebridades. Mergulhe na indústria dos paparazzi.
A palavra “paparazzo” é de origem italiana. Foi popularizada por um personagem do filme
LA DOLCE VITA (1960),
de Federico Fellini, um fotógrafo de celebridades que se chamava, justamente, Paparazzo.
Carlos Macedo
No Brasil, o Rio de Janeiro é o polo destes profissionais. Reduto de artistas e principal cidade turística do país, uma pedalada pela orla da Zona Sul ou Barra da Tijuca, dificilmente, não resultará no encontro com um rosto conhecido da tevê, da música ou dos sites de fofoca.
É lá que está sediada a maior agência de paparazzi da cidade, a AgNews, que, há 16 anos, abastece sites e revistas de celebridades do país, com um braço forte em São Paulo. Com um casting que gira em torno de 30 fotógrafos, entre freelancers e fixos, atende uma cartela de, aproximadamente, 60 clientes no Brasil e no Exterior.
Comissão boa lá fora
A estrutura deste tipo de agência funciona assim: fotógrafos contratados ganham um salário fixo e uma porcentagem entre 60% e 70% pelas fotos vendidas para o Exterior, já que as imagens nacionais integram o pacote pago pela clientela e não têm valor individual agregado. Freelancers ganham por trabalho.
Quem está há anos nessa empreitada e entre os mais conceituados paparazzi do Brasil (aqueles que flagram celebridades de primeiro escalão com exclusividade) garante que dá para tirar o sustento.
— Eu vivo bem, moro bem (em Ipanema, bairro nobre do Rio), tiro férias todo ano e já tivea oportunidade de viajar para diversos países. Se você consegue uma entrada para a venda internacional, tira uma grana muito boa — afirma André Freitas, 44 anos, 11 atuando na AgNews.
Carlos Macedo
Mas o que torna uma imagem um produto rentável? Critérios como popularidade da personalidade, o tipo de flagra e a informação que o clique revela fazem a sua cotação subir.
— A melhor é a de biquíni. Se tiver de roupa, não ganha muita grana. Mas botou biquíni, virou sucesso, e a galera já fica ouvindo aquele “trim, trim, trim” do dinheiro caindo na conta (risos) — diverte-se Dilson Silva, 36 anos, sete como paparazzo da AgNews.
Com o esquema dos pacotes para jornais, sites e revistas do Brasil, o jeito é investir em celebridades que têm valor fora do país.
— Como a Gisele Bündchen não desfila mais, a Alessandra Ambrósio (outra top gaúcha) cresceu muito no ranking, ficou mais em evidência lá fora, e o passe dela subiu. Se descer aqui e pegar praia de biquíni, a primeira coisa que fazemos é mandar a imagem para fora — exemplifica André, enquanto faz plantão em frente ao Hotel Fasano, em Ipanema, onde a modelo estava hospedada.
Editor da coluna Retratos da Vida, do jornal carioca Extra, que trabalha com uma agenda de quatro paparazzi exclusivos deles, Leonardo Ferreira aponta os critérios que elevam a cotação da foto e alavancam cliques no site. O espaço do jornal é famoso por dar, com exclusividade, registros como a primeira imagem de Paolla Oliveira com o novo namorado, o diretor da TV Globo Rogério Gomes, o Papinha.
Na ocasião, um fotógrafo escalado pelo Extra seguiu o diretor na saída da Globo até um barzinho discreto onde ele encontrou a atriz. Estava feito o flagra que confirmava o que os dois insistiam em negar.
— Mas um casal novo, de quem ninguém sabe a respeito, vale mais do que um que as pessoas sabem, mas não têm a primeira foto — salienta Leo, lembrando, ainda, a foto que revelou o romance de de Fábio Assunção com Carol Macedo.
— Aí, vêm um galã e uma notícia de namoro que ninguém sabia. Isso “cresce” a foto — explica.
No topo
O valor mais alto pago pelo jornal carioca por uma foto de paparazzi foi o equivalente a R$ 5 mil, em 2010, quando o casalzinho da saga Crepúsculo, Kristen Stewart e Robert Pattinson, esteve no Brasil para filmar Amanhecer. Eles negavam que estivessem juntos, mas foram flagrados numa cachoeira, em Paraty.
O responsável pelo cobiçado clique é Gabriel, o mesmo da epopeia de Ashton e Demi, parceiro da AgNews. Mestre na arte de caçar personalidades estrangeiras, ele faturou alto com a venda do precioso flagra dos jovens astros de Hollywood para revistas internacionais. Embora não fale em valores, uma reportagem de 2011 da revista Superinteressante revelou que ele teria faturado US$ 100 mil (cerca de R$ 348 mil) pelas imagens.
— Isso, na época em que paparazzo ficava rico! Comprei apartamento, carro zero... Mas acabou, são outros tempos. Com a crise mundial, tabloides estrangeiros quebraram, muito por conta dos processos que sofreram. Ninguém mais paga as fortunas que bancavam antigamente. Hoje, caíram em 80% aqueles valores — afirma o paparazzo, responsável por muitos
dos maiores flagras de gringos no nosso país.
Chapa-branca
O Brasil também já teve seus feitos que resultaram em altas cifras. O primeiro registro de Theo, um ano e 11 meses, filho de Sandy com o músico gaúcho Lucas Lima, foi um deles.
— Essa imagem vendeu bem, porque ninguém tinha mostrado o rosto da criança ainda. Esse tipo de foto tem um preço alto — conta o paulista Rafael Cusato, 33 anos, 13 como paparazzo e, atualmente, fotógrafo da Brazil News, agência que atua em São Paulo e no Rio.
Entre as personalidades nacionais mais bombadas e rentáveis, estão nomes como Juliana Paes, Grazi Massafera, Cauã Reymond e Bruna Marquezine, que ultrapassam a temporalidade de um trabalho no ar. Estejam ou não na telinha, o desejo e o interesse por imagens suas continuam existindo.
No entanto, por aqui, o trabalho dos paparazzi é limitado a flagras triviais e não comprometedores, já que revistas e sites, geralmente, dependem da boa vontade e da disponibilidade das suas estrelas para sobreviverem.
— Elas (publicações) sabem que podem perder matérias, entrevistas e ensaios com famosos que se irritarem com alguma foto sua indiscreta ou reveladora — avalia Rafael.
O fotógrafo Gabriel faz coro ao colega e entrega os bastidores desse mercado chapa-branca:
— Já cansei de fotografar ator com nariz branco de cocaína. Mas, ao contrário de outros países, aqui, ninguém publica.
Carlos Macedo
Nos Estados Unidos e na Europa, a cultura dos paparazzi existe há, pelo menos, meio século.
Os sites dos tabloides ingleses The Sun e Daily Mail e a revista norte-americana People estão entre os maiores e mais populares do mundo a cobrir o universo das celebridades.
Engana-se quem pensa que, em uma cidade como o Rio de Janeiro, povoada por estrelas da televisão e das capas de revistas, basta sair com uma câmera em punho, mirar no alvo e faturar alto com um flagra. O trabalho é árduo, exige paciência, agilidade, perspicácia e, acima de tudo, uma poderosa rede de contatos que vai facilitar e, na maioria das vezes, colocar o fotógrafo no lugar certo, na hora certa.
Isso inclui garis, funcionários de quiosques nas praias, porteiros de prédios, funcionários de diferentes estabelecimentos e flanelinhas. Saber as placas dos carros dos famosos, aliás, é uma mão na roda dos paparazzi, e a maioria tem acesso a elas graças a essa rede.
Paga quanto?
Qualquer ligação por celular ou mensagem via WhatsApp tem um preço a ser negociado. O custo de uma cobertura internacional pode ultrapassar R$ 5 mil com o pagamento de informantes, liberação de acesso a locais estratégicos, informações sobre hóspedes de hotéis, aluguel de carros, barcos e o que mais for preciso para garantir o acesso ao melhor local para o melhor clique.
— Eles (paparazzi) pedem pra mandar um “zap” quando tem um famoso. Eu fico de olho e aviso. Eles ficam aqui, na beira da praia, sobem em árvores, fazem de tudo! Depois, nos dão um agrado. Onde tem famoso, tem paparazzo — revela o atendente Deivison Nascimento Bernardo, 25 anos, que trabalha em um quiosque, em Ipanema.
Carlos Macedo
No Brasil, a prática ganhou propulsão no início dos anos 2000, com a popularização da internet e o surgimento de sites como O Fuxico, em 2000, e Ego, em 2006, dois dos maiores portais de celebridades brasileiros atualmente.
IInformação na mão e câmera a postos, é hora de exercitar a paciência. Uma cobertura pode exigir dias de plantão.
De 27 a 30 de maio, um time de estrelas brasileiras e internacionais agitou o entorno do hotel Fasano, no Rio, durante um evento da grife francesa Louis Vuitton. Três profissionais da AgNews foram fazer plantão no local, em busca do melhor clique de nomes como Alessandra Ambrósio, Alicia Vikander, vencedora do Oscar de melhor atriz coadjuvante neste ano, e Jaden Smith, filho do ator Will Smith. Isso, sem falar nas pratas da casa como Marina Ruy Barbosa — na época, na reta final da novela Totalmente Demais, da qual foi protagonista.
Em uma média de dez horas de trabalho por dia, cada aparição na sacada, no saguão ou na saída do hotel é a largada para a ação. Câmeras com lentes para curta ou longa distância são tiradas das mochilas ou debaixo dos moletons, enquanto uma moto e um carro ficam estacionados, se for preciso ir atrás da celebridade em foco.
Não há descanso: um piscar de olhos pode ser decisivo, e o almoço não passa de um lanche em um quiosque que serve de Q.G.. Do alto de um prédio próximo, um paparazzo faz o registro da cobertura do hotel onde Jaden diverte-se na piscina. Enquanto espera, Dilson lembra dos perrengues:
— Fotografei o Marcelo Falcão, do Rappa, na praia, e ele não gostou. Começou a me encarar, e enquanto eu fazia a foto e me esquivava, roubaram a minha moto.
Todo dia é dia
Com André, a ousadia custou mais caro. Enquanto tentava fotografar Ricky Martin no morro do Vidigal, caiu de um barranco e quebrou a clavícula. Resultado: ficou três meses imobilizado.
Isso quando eles não são multados por excesso de velocidade ou por estacionar em local proibido, atrás da “caça”. Mas longe dos grandes eventos, a rotina dos paparazzi é bem menos aventureira, em rondas por praias, restaurantes, aeroportos e shoppings da cidade.
Dilson fica “batendo praia” de ponta a ponta de moto. Focado nas orlas mais afastadas e discretas, como Barra, Reserva, Recreio, Prainha, Grumari e Joatinga, gaba-se de conseguir fotografar o que ele chama de “personagens bons” como Grazi e Cauã.
— Se precisar, chego perto mesmo. Eles esbravejam, encaram, mas os deixo falando sozinhos quando estão estressadinhos — relata Dilson.
André passa os dias pedalando de Ipanema a Leblon, na Zona Sul, à procura de famosos. A violência, no entanto, tirou as estrelas das suas rotinas:
— A gente fazia sete, dez, 12 materiais num dia, na orla. Hoje, tá muito ruim por causa dos ladrões. Tem artista que não pega mais praia na Zona Sul. Se faço três, quatro materiais num dia, tô com sorte.
Carlos Macedo
Com a morte da princesa Diana, da monarquia britânica, e do seu namorado Dodi Al Fayed, em 1997, em Paris, os paparazzi passaram a ser vistos como inimigos públicos dos famosos.
Na ocasião, eles eram perseguidos por fotógrafos quando se envolveram em um acidente de carro que vitimou os dois.
Outra premissa do trabalho dos paparazzi é a agilidade, e a máxima “tempo é dinheiro” também acaba sendo levada ao pé da letra. Já foi a época em que os fotógrafos andavam com computadores a tiracolo.
Hoje em dia, um chip compatível com máquinas e celulares, além de aplicativos para smartphones que permitem o tratamento das imagens, fazem com que elas sejam enviadas com a velocidade de um flash.
Investimento
Os equipamentos são de propriedade e responsabilidade dos fotógrafos, que investem alto para garantir a melhor imagem. Uma câmera como a usada por André custa cerca de R$ 6,8 mil.
— É um investimento que se paga em pouco tempo com as fotos vendidas para o Exterior — sentencia o paparazzo.
Estar bem-equipado é fundamental e decisivo na hora de garantir o clique extraoficial. Nessa hora, não dá para marcar bobeira. Gabriel sabe bem disso. Ao contratar um fotógrafo para uma gravação de novela na rua, em São Paulo, foi surpreendido.
O profissional disse que não conseguiu fazer porque não liberaram o acesso e ele não tinha lente para longa distância:
— Não pode! Tem que ter todo tipo de equipamento. Paparazzi é fazer o que não é liberado, é se virar e garantir a foto!
Carlos Macedo
SSe paciência é palavra de ordem para assegurar o melhor clique, ela é ainda mais necessária na hora de lidar com quem está sendo fotografado.
— Eu odeio celebridades brasileiras. Elas se acham — sentencia Gabriel, que já foi agredido por Luana Piovani quando gravava imagens dela caminhando na rua, para um programa de tevê.
O vídeo foi parar no YouTube e tem quase 400 mil visualizações.
Perdas e danos
No seu currículo, Gabriel orgulha-se de ter, ainda, outros registros como os de Mick Jagger, em 2011, com a então nova namorada, a estilista e modelo L’Wren Scott, morta em 2014, e do filho brasileiro, Luccas, em Macchu Picchu, no Peru, além da clássica imagem de Justin Bieber pichando um muro de um hotel abandonado em São Conrado, no Rio de Janeiro, em 2013.
Na primeira tentativa, o paparazzo flagrou o astro juvenil em situações comprometedoras e foi agredido por um segurança do cantor.
— Tomou o meu equipamento, jogou no chão, quebrou a lente, tirou os meus cartões, me deu socos. Teria vendido muito lá fora! — lembra.
Até que, em outra ocasião, conseguiu o registro do cantor pichando. Mas não sem mais um prejuízo:
— Desta vez, os seguranças dele quebraram o meu carro inteirinho.
O astro do futebol inglês David Beckham também deu trabalho ao paparazzo André, em duas passagens pelo Brasil:
— Eu fotografava de longe, e ele, com o segurança do lado, porque só é valente com segurança, ficou me enchendo de xingão. Eu pensava “Cara! É um ícone do futebol mundial batendo boca comigo!”.
Professora e pesquisadora de comunicação digital e entretenimento da Unisinos, Adriana Amaral destaca que, muitas vezes, esses profissionais têm uma postura invasiva, ultrapassando os limites do bom senso e atéda humanidade.
— Já vimos questões de morte, como a princesa Diana, e de exposição familiar. Embora sejam figuras públicas, têm direito ao seu lado privado, esse desejo é legítimo — avalia.
Dos 102 milhões de usuários de internet no Brasil, 88% consomem conteúdo de entretenimento. Os dados são da comScore, empresa de pesquisa de mercado no universo digital
Corta clima
Além de Luana, que é unanimidade entre os paparazzi quando o assunto é barraco, Paulinho Vilhena, Murilo Benício e Paolla Oliveira são nomes recorrentes no quesito “artista ruim de fotografar”.
— A Paolla pilha muito o Papinha para tirar as caras com a gente. Um dia, ele passava de bicicleta, e ela vinha logo atrás. Ele me viu e parou, pronto para vir pra cima de mim. Desceram para a praia, mas a impressão que dava era de que havia acabado o passeio, o clima era péssimo. Ele olhava o tempo todo para ver se alguém estava fotografando — recorda Dilson, que fez o registro dos dois de dentro de um quiosque, em 2015.
Na contramão dos que fogem, estão algumas subcelebridades que até forjam flagras para ganhar os holofotes.
— Já teve mulher-fruta que me pagou. Elas ficam na praia, fingindo que não estão nos vendo, fazendo pose — entrega Dilson.
Gente fina
Nem só de brigas é feita a relação entre paparazzi e celebridades. Há quem dê exemplo de camaradagem.
— O Cauã é muito gente fina. Sempre educado e respeitoso. É um cara fácil de trabalhar. Me cumprimenta e brinca: “Você de novo? Tá em todos os lugares?” — conta Dilson sobre o ator.
André complementa citando o astro do cinema John Travolta:
— Conversa comigo, me chama pelo nome. Quando vai embora, me dá dois beijos no rosto.
Nessa lista de gente boa, que bate papo e é cordial com os paparazzi, citada por André, também estão Alexandre Borges e Luiza Brunet.
— Ele é o mais bacana para fazer foto, nem liga. E ela me vê no calçadão, conversa e dá até beijo.
E, quando o assunto é vaidade, há quem faça jus ao título de galã:
— Rodrigo Santoro pede para ver as fotos e para a gente mandar só as que ele ficou bem.
Jornal popular do Rio de Janeiro, o Extra tem a coluna Retratos da Vida como carro-chefe da versão on-line da publicação, responsável por uma fatia que varia de 50% a 60% da audiência de todo o site, o que reforça o interesse do público pelos famosos.
Cabe a Leo, que gere uma equipe de quatro pessoas, avaliar as fotos que chegam à Redação conforme alguns critérios que ele explica:
— A primeira coisa a ser levada em conta é como conseguiu a foto. Não pode romper o limite, invadir casa, pular muro e oferecer perigo ao fotografado.
A gente deixou de publicar uma foto da Vera Fischer na clínica de reabilitação porque infringia esses critérios, e ela estava com um visual degradante. Precisa ter esse cuidado.
Bônus x ônus
Outro caso mais recente envolveu a nova namorada de Cauã Reymond, Mariana Goldfarb, clicada dentro da casa do ator, na praia da Joatinga. Da areia, é possível fotografar a janela do galã.
— Tínhamos uma imagem dela nua. Não publicamos. Todos já sabiam que era a nova namorada dele. Talvez, se não soubessem, valeria como informação — pondera o editor, ressaltando que, nesse caso, o ônus seria maior do que o bônus:
— Você cria um desconforto para o artista e uma situação que poderia trazer mais prejuízos legais.
Carlos Macedo
Apreocupação com a parte legal ou com a ética nem sempre norteia o trabalho de quem vive para revelar a intimidade alheia.
— A gente respeita. Mas, se puder passar um pouquinho, passa. É no diferencial que a gente ganha — argumenta Dilson.
Foi esse paparazzo quem gravou, em 2014, um áudio de Grazi Massafera no qual ela dizia que o ex-marido, Cauã Reymond, estava com a atriz Isis Valverde.
— Grazi é de conversar e brincar com a gente. E já tinha dado a letra de que era para irmos atrás do Cauã, que ele tava com a Isis. Naquele dia, segui Grazi nas compras, no cabeleireiro e na igreja. Quando saiu, baixei a câmera, mas deixei ligada. Ela podia largar outra dessas, e eu não queria perder. Dito e feito! Falou, e eu estava gravando — conta.
Gentileza gera gentileza
Para André Freitas, negócio é negócio. Porém, em certas circunstâncias, a consciência e a solidariedade acabam falando mais alto.
— Se você é uma pessoa pública e dá mole, alguém pode estar te fotografando,
e essa foto vai rodar. Mas eu já deixei de publicar imagem porque a pessoa veio falar comigo — admite ele, que registrou a primeira aparição de Betty Lago (a atriz morreu em 2015) durante o seu tratamento de câncer, em um passeio, pelo Leblon.
— O filho dela veio pra cima de mim, e ela, gentilmente, se aproximou e pediu desculpas por ele. Disse: “Bom dia, tudo bem? Você fez foto minha, né? Queria te pedir muitas desculpas em relação ao meu filho, ele tá de cabeça quente. Eu sei que você tá fazendo o seu trabalho” — recorda André, que surpreendeu a atriz.
— Falei: “Betty, eu sei que você se chateou, tô vendo que não tá com a carinha boa, eu vou deletar o cartão aqui”. Ela sorriu e perguntou: “Você faria isso?”. Eu disse: “Só não faria se tivesse um concorrente aqui, pois eu seria cobrado”. Deletei na frente dela — finaliza.
Embora a Constituição Federal ateste que a intimidade e a vida privada são invioláveis, a lei não é clara o suficiente quando se trata de pessoas públicas. Nesses casos, o direito à privacidade e à imagem costuma ser relativizado e reduzido, pois entende-se que há interesse na sua veiculação, em caráter informativo, uma vez que são consideradas formadoras de opinião.
Nos tribunais, no entanto, cada processo depende da avaliação do magistrado. Essa subjetividade e a linha tênue entre a liberdade de informar e o abuso desse direito fomentam a eterna rivalidade entre paparazzi e celebridades.
— Sempre que a utilização da imagem tiver fins comerciais, ou seja, se for feita com o objetivo de lucrar com propaganda ou anúncio, não apenas como informação, exigirá autorização — explica o advogado e professor de Direito da Puc e da Faculdade do Ministério Público Plínio Melgaré.
Contudo, segundo ele, se a artista está na praia, e entende-se que isso é de interesse público, a divulgação em sites e jornais não deve causar problemas.
— É passível de processo o abuso na liberdade de informar, causando dano ao sujeito. E, aí, sim, cabe indenização por dano moral — orienta Plínio.
Postura decisiva
A forma como a celebridade se posiciona diante de sua vida privada pode ser decisiva no resultado da ação. Após o flagra em um aeroporto, que mostrou, pela primeira vez, o rosto do seu filho, Theo, a cantora Sandy enviou uma carta registrada em cartório a redações de revistas, jornais e sites, pedindo que não fossem mais divulgadas imagens da criança. Em suas redes sociais, não há registros do pequeno. Sendo assim, a precaução somada à discrição da artista, muito provavelmente, resultariam em ganho de causa em uma disputa judicial.
Ninguém gosta. Eu acho muito invasivo, porque você está na rua, e é claro que está em um lugar público. Mas é um momento em que não está trabalhando, pode ser de lazer, um momento íntimo. Eu não sei se eles podem pegar a sua imagem e ganhar dinheiro com aquilo, sem alguém autorizar.
NATHALIA DILL, ATRIZ
Lamento, porque tira de você algo que seria privado. Já tem tanta coisa minha que é pública. Meus filhos não gostam, não se sentem à vontade. Às vezes, você está andando e falando, sorrindo, e vem alguém com uma câmera na sua frente. Aquilo corta o clima familiar, tira de você o direito de fazer algo que todo mundo faz. E isso é chato, muito chato. São o ônus e o bônus do meu trabalho. Não tenho o que fazer, não vou dar murro em ponta de faca.
FÁTIMA BERNARDES, APRESENTADORA
Em algum momento, incomoda, mas eu lido muito bem com isso. Eu conheço todos os paparazzi, eles me respeitam, e eu respeito eles. Não há uma invasão. A gente conversa bastante, e tudo depende de como você se posiciona e trata as pessoas. Não me privo de fazer nada por conta do trabalho deles.
SHERON MENEZZES, ATRIZ
Mas o que torna uma imagem um produto rentável? Critérios como popularidade da personalidade, o tipo de flagra e a informação que o clique revela fazem a sua cotação subir.
— A melhor é a de biquíni. Se tiver de roupa, não ganha muita grana. Mas botou biquíni, virou sucesso, e a galera já fica ouvindo aquele “trim, trim, trim” do dinheiro caindo na conta (risos) — diverte-se Dilson Silva, 36 anos, sete como paparazzo da AgNews.
Com o esquema dos pacotes para jornais, sites e revistas do Brasil, o jeito é investir em celebridades que têm valor fora do país.
— Como a Gisele Bündchen não desfila mais, a Alessandra Ambrósio (outra top gaúcha) cresceu muito no ranking, ficou mais em evidência lá fora, e o passe dela subiu. Se descer aqui e pegar praia de biquíni, a primeira coisa que fazemos é mandar a imagem para fora — exemplifica André, enquanto faz plantão em frente ao Hotel Fasano, em Ipanema, onde a modelo estava hospedada.
Editor da coluna Retratos da Vida, do jornal carioca Extra, que trabalha com uma agenda de quatro paparazzi exclusivos deles, Leonardo Ferreira aponta os critérios que elevam a cotação da foto e alavancam cliques no site. O espaço do jornal é famoso por dar, com exclusividade, registros como a primeira imagem de Paolla Oliveira com o novo namorado, o diretor da TV Globo Rogério Gomes, o Papinha.
Na ocasião, um fotógrafo escalado pelo Extra seguiu o diretor na saída da Globo até um barzinho discreto onde ele encontrou a atriz. Estava feito o flagra que confirmava o que os dois insistiam em negar.
— Mas um casal novo, de quem ninguém sabe a respeito, vale mais do que um que as pessoas sabem, mas não têm a primeira foto — salienta Leo, lembrando, ainda, a foto que revelou o romance de de Fábio Assunção com Carol Macedo.
— Aí, vêm um galã e uma notícia de namoro que ninguém sabia. Isso “cresce” a foto — explica.
No topo
O valor mais alto pago pelo jornal carioca por uma foto de paparazzi foi o equivalente a R$ 5 mil, em 2010, quando o casalzinho da saga Crepúsculo, Kristen Stewart e Robert Pattinson, esteve no Brasil para filmar Amanhecer. Eles negavam que estivessem juntos, mas foram flagrados numa cachoeira, em Paraty.
O responsável pelo cobiçado clique é Gabriel, o mesmo da epopeia de Ashton e Demi, parceiro da AgNews. Mestre na arte de caçar personalidades estrangeiras, ele faturou alto com a venda do precioso flagra dos jovens astros de Hollywood para revistas internacionais. Embora não fale em valores, uma reportagem de 2011 da revista Superinteressante revelou que ele teria faturado US$ 100 mil (cerca de R$ 348 mil) pelas imagens.
— Isso, na época em que paparazzo ficava rico! Comprei apartamento, carro zero... Mas acabou, são outros tempos. Com a crise mundial, tabloides estrangeiros quebraram, muito por conta dos processos que sofreram. Ninguém mais paga as fortunas que bancavam antigamente. Hoje, caíram em 80% aqueles valores — afirma o paparazzo, responsável por muitos
dos maiores flagras de gringos no nosso país.
Chapa-branca
O Brasil também já teve seus feitos que resultaram em altas cifras. O primeiro registro de Theo, um ano e 11 meses, filho de Sandy com o músico gaúcho Lucas Lima, foi um deles.
— Essa imagem vendeu bem, porque ninguém tinha mostrado o rosto da criança ainda. Esse tipo de foto tem um preço alto — conta o paulista Rafael Cusato, 33 anos, 13 como paparazzo e, atualmente, fotógrafo da Brazil News, agência que atua em São Paulo e no Rio.
Entre as personalidades nacionais mais bombadas e rentáveis, estão nomes como Juliana Paes, Grazi Massafera, Cauã Reymond e Bruna Marquezine, que ultrapassam a temporalidade de um trabalho no ar. Estejam ou não na telinha, o desejo e o interesse por imagens suas continuam existindo.
No entanto, por aqui, o trabalho dos paparazzi é limitado a flagras triviais e não comprometedores, já que revistas e sites, geralmente, dependem da boa vontade e da disponibilidade das suas estrelas para sobreviverem.
— Elas (publicações) sabem que podem perder matérias, entrevistas e ensaios com famosos que se irritarem com alguma foto sua indiscreta ou reveladora — avalia Rafael.
O fotógrafo Gabriel faz coro ao colega e entrega os bastidores desse mercado chapa-branca:
— Já cansei de fotografar ator com nariz branco de cocaína. Mas, ao contrário de outros países, aqui, ninguém publica.
Apreocupação com a parte legal ou com a ética nem sempre norteia o trabalho de quem vive para revelar a intimidade alheia.
— A gente respeita. Mas, se puder passar um pouquinho, passa. É no diferencial que a gente ganha — argumenta Dilson.
Foi esse paparazzo quem gravou, em 2014, um áudio de Grazi Massafera no qual ela dizia que o ex-marido, Cauã Reymond, estava com a atriz Isis Valverde.
— Grazi é de conversar e brincar com a gente. E já tinha dado a letra de que era para irmos atrás do Cauã, que ele tava com a Isis. Naquele dia, segui Grazi nas compras, no cabeleireiro e na igreja. Quando saiu, baixei a câmera, mas deixei ligada. Ela podia largar outra dessas, e eu não queria perder. Dito e feito! Falou, e eu estava gravando — conta.
Gentileza gera gentileza
Para André Freitas, negócio é negócio. Porém, em certas circunstâncias, a consciência e a solidariedade acabam falando mais alto.
— Se você é uma pessoa pública e dá mole, alguém pode estar te fotografando,
e essa foto vai rodar. Mas eu já deixei de publicar imagem porque a pessoa veio falar comigo — admite ele, que registrou a primeira aparição de Betty Lago (a atriz morreu em 2015) durante o seu tratamento de câncer, em um passeio, pelo Leblon.
— O filho dela veio pra cima de mim, e ela, gentilmente, se aproximou e pediu desculpas por ele. Disse: “Bom dia, tudo bem? Você fez foto minha, né? Queria te pedir muitas desculpas em relação ao meu filho, ele tá de cabeça quente. Eu sei que você tá fazendo o seu trabalho” — recorda André, que surpreendeu a atriz.
— Falei: “Betty, eu sei que você se chateou, tô vendo que não tá com a carinha boa, eu vou deletar o cartão aqui”. Ela sorriu e perguntou: “Você faria isso?”. Eu disse: “Só não faria se tivesse um concorrente aqui, pois eu seria cobrado”. Deletei na frente dela — finaliza.