A vocação de Itajaí como cidade portuária é tão emblemática que a torna um caso inédito no país. É o único município que tem a autorização da União para administrar seu porto – emparelhando a cidade de cerca de 200 mil habitantes a outros 10 Estados, inclusive Santa Catarina, que são responsáveis por tocar os demais 17 portos públicos delegados. É essa a condição única conquistada pelos itajaienses em 1998 que está no centro do desafio do próximo prefeito.
A delegação termina em 2023 sendo renovável por mais 25 anos. Entretanto, o desafio é maior do que a simples renovação dessa autorização. A Lei dos Portos sancionada em 2013, mudou a relação entre o governo federal e os portos delegados, levando para Brasília praticamente todas as decisões. Governos estaduais que administram portos – em Santa Catarina é o caso das unidades de Imbituba e São Francisco do Sul – estão mobilizados para alterar a lei e recuperar as condições de gerenciar, de fato, os portos pelos quais são responsáveis. É a luta da próxima administração.
– A constituição diz que é da União a competência sobre os portos. A lei de 2013, diz que o governo federal é o poder concedente, mas não qual órgão. O decreto que regulamentou disse que era a Secretaria de Portos, agora será o Ministério dos Transportes. O que se está lutando é para incluir “ou quem tem a delegação” – afirma o atual superintendente do porto, Antônio Ayres.
Embora busque reconquistar os direitos sobre a realização de projetos, editais, arrendamentos e outras medidas práticas, não é o órgão municipal que toca as atividades portuárias. A operação dos contêineres é arrendada à multinacional APM Terminals, cujo contrato de concessão expira junto com a delegação a Itajaí e que pleiteia a renovação antecipada para ampliar investimentos no porto. Antes da Lei de Portos de 2013, todo o processo poderia ser tocado pela autoridade portuária local para posterior aprovação da Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq). Nas regras em vigor, tudo é feito em Brasília.
– A marina de Itajaí foi o último contrato feito na lei anterior. Fizemos editais, licenciamentos. Agora todo o processo de montagem é feito em Brasília. Se fosse assim, não teria marina – acredita Ayres.
As amarras impostas aos portos delegados, a falta de recursos do governo federal para obras essenciais como a dragagem do porto e a reforma de dois dos quatro berços de atracação – que deveriam ter sido concluídas no primeiro semestre do ano passado e ainda se arrastam – fizeram com que Itajaí perdesse em competitividade em relação ao vizinho privado Portonave, de Navegantes. Além disso, por ser público, o Porto de Itajaí tem um regime de contratação de mão de obra diferenciado, por escala, considerado mais caro. Essa soma de fatores teve um efeito quase catastrófico em 2015, quando metade das linhas que utilizavam o porto itajaiense migraram para Navegantes, na outra margem do rio Itajaí-Açu.
Professor de Gestão Portuária e Logística na Univali e diretor-executivo do Órgão Gestor de Mão de Obra do Porto de Itajaí, Luciano Angel Rodriguez soma mais dois elementos para a crise: falta de influência política dos representantes locais e de diretrizes claras do município sobre sua relação com o porto.
- Na prática, nenhum administração teve uma gestão clara definida como atividade portuária. Vou mais longe, a forma como a prefeitura faz hoje, joga os munícipes contra o porto. Por exemplo, ao mesmo tempo que existe uma estrutura portuária decente, nossas ruas continuam iguais. A via portuária já foi parte da campanha de todos os candidatos. Cada um que vem, diz que vai completar - afirma Rodriguez.
Ele defende que seja criada uma secretaria que articule todas atividades ligadas ao setor náutico em Itajaí. Desde a atividade portuária até o turismo, passando pelas questões de mobilidade que envolve toda a chamada “economia do mar”. De todas as cidades portuárias brasileiras, apenas Santos tem uma estrutura semelhante. Além disso, aponta a necessidade de ampliação da área portuária, em parceria com a APM, e a construção de vias de acesso exclusivo ao porto.
- Pseudolalia é quando você mente e passa a acreditar na mentira. É o que nós sofremos. Imaginamos que o nosso porto continua cinco estrelas. Três já foram. Quando a gente chega em um ponto bom quando chegamos, os outros copiam.