Entre as décadas de 1920 e de 1960, as famílias Ramos e Konder Bornhausen protagonizaram a maior rivalidade política da história de Santa Catarina. Curiosamente, essa história começa com um noivado que prometia entrelaçar as famílias. O noivado de Victor e Ruth.
Um noivado para unir as famílias Konder e Ramos
Os clãs convivem
nos bancos escolares
A eleição de Hercílio Luz
Os Ramos e os Konder se ajudam na política
Domingo
Os Ramos tentam medir forças com o governador Hercílio Luz e o episódio coloca a família e os Konder em lados opostos pela primeira vez. Na disputa entre Ramos e Hercílio, o clã Konder está com o governador. Em meio a essa briga política, o noivado entre Victor e Ruth é desfeito.
O início da rivalidade entre as famílias de Victor e Ruth
Victor e Adolfo integram o governo de Hercílio
A construção da ponte na Capital
O mistério com
o fim da relação
Segunda-feira
Na secretaria da Fazenda, Viação e Obras Públicas, Victor transforma o sonho da construção da ponte em realidade e, com isso, ganha projeção estadual e nacional. Abalada com o fim do compromisso, Ruth deixa Lages para passar um tempo em Florianópolis.
Após a separação, ex-noivos seguem novos caminhos
A nova mulher
na vida de Victor
Washington Luiz se impressiona com o secretário catarinense
Terça-feira
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Um noivado para
unir as duas famílias
Entre as décadas de 1920 e de 1960, as famílias Ramos e Konder Bornhausen protagonizaram a maior rivalidade política da história de SC. Os nomes e os partidos mudavam, mas a polarização entre os clãs de Lages e de Itajaí servia de baliza para acirradas disputas voto a voto. Curiosamente, essa história começa com um noivado que prometia entrelaçar as duas famílias. O noivado de Victor e Ruth.
Deputado estadual pela região de Blumenau, Victor Konder passou uma pequena temporada em Lages, terra da tradicional família Ramos, em janeiro de 1920. Ficou na Serra por cerca de 10 dias, segundo relatos da imprensa. Antes de voltar ao Vale do Itajaí, fez uma parada em Florianópolis, onde deixou a notícia: estava noivo.
Os dois principais jornais da Capital deram a notícia. O Estado no dia 26 de janeiro de 1920, o República no dia seguinte: Ruth Ramos, a filha de 19 anos do senador e ex-governador Vidal Ramos, estava noiva do deputado Victor Konder. A importância das famílias na sociedade catarinense fez a novidade ecoar até à imprensa do Rio de Janeiro, capital da República, onde o tradicional Correio da Manhã deu a nota exatamente um mês depois.
A notícia não causava choque algum. Podia-se dizer que era até esperada. A rivalidade entre as famílias Ramos e Konder ainda não demarcava os limites da política catarinense. Naquele momento da história, o noivado de Victor e Ruth apenas consumava uma relação iniciada na década anterior, quando o lageano Vidal governava Santa Catarina e os irmãos itajaienses Marcos, Adolfo e Victor tentavam entrar na linha de frente da política estadual. As duas famílias integravam o Partido Repúblicano Catarinense, único partido do Estado – liderado pelos senadores Lauro Müller e Hercílio Luz.
A partir daquele momento, o destino dos clãs Ramos e Konder estaria entrelaçado pelo próximo meio século. Mas não seria por causa desse noivado.
Os clãs Konder e Ramos convivem nos bancos escolares e na faculdade de Direito
Os irmãos Marcos, Adolfo e Victor eram filhos do imigrante alemão Marcos Konder Sênior e da brasileira Adelaide Flores Konder. Mais velho dos três, Marcos assumiu o comando dos negócios da família com a morte prematura do pai aos 44 anos, em 1898. Tinha apenas 16 anos e se sacrificou para que Adolfo e Victor vivessem o sonho de ascensão social e política da família, representado pelo diploma de bacharel da tradicional Faculdade de Direito de São Paulo. Ambos partiram para a capital paulista em 1903. Dois anos depois, outro catarinense chegava para estudar no Largo São Francisco. Era o lageano Nereu Ramos, filho do governador Vidal Ramos.
Victor
Konder
Nereu
Ramos
Adolfo Konder
A convivência não era uma novidade. Os três também foram contemporâneos no Colégio Conceição, instituição jesuíta localizada em São Leopoldo (RS), por onde passou boa parte da elite política gaúcha e catarinense da época.
Em São Paulo, Adolfo, Victor e Nereu se destacam e integram a diretoria do Centro Acadêmico XI de Agosto — momento registrado em uma fotografia histórica de todo o grupo com o político, jurista e escritor Joaquim Nabuco.
De volta a Santa Catarina depois de suas formaturas, os três dedicam-se à advocacia e ao jornalismo. O lageano era redator político do jornal O Dia, enquanto Adolfo e Victor dirigiam o Novidades. Advocacia, jornalismo e política eram atividades indissociáveis nos primórdios da República – e política logo chegaria para Adolfo, Victor e Nereu.
Os Ramos e os Konder se ajudam
na política e intensificam suas relações
Por volta de 1912, Victor Konder toma uma decisão que mudaria completamente seu destino. A Itajaí da época não comportava os dois bacharéis — ele e o irmão Adolfo, formados juntos na Faculdade de Direito de São Paulo quatro anos antes. Então, Victor decide se mudar para Blumenau, onde se estabelece como advogado. A vida na cidade do Vale contagia Victor. Fluente em alemão, ele logo conquista clientela e simpatia no principal reduto de colonização germânica do Estado.
Ajudava na ambientação a presença do grande amigo Pedro Silva, juiz, com quem compartilhava o mesmo espírito boêmio. A amizade era mais um laço a aproximar Victor da família Ramos, porque Pedro era marido de Rachel, filha mais velha do governador Vidal Ramos. Ligação que fez de Victor padrinho de batismo do filho do casal, Aderbal Ramos da Silva — nascido no Palácio do Governo. As cinco filhas do governador moravam no palácio, inclusive Rachel, que deixara Blumenau por causa de uma enchente de 1911 para ter o filho na Capital. Entre elas, estava a pequena Ruth, de 10 anos, futura noiva de Victor.
É nessa época que Nereu Ramos entra para a política, com a bênção do pai governador e ajuda dos Konder. O jovem lageano se elege deputado estadual concorrendo pela região de Itajaí. O voto era distrital, com cada região votando em seu representante. Com a morte do deputado Pedro Ferreira da Silva, o sistema previa uma eleição avulsa. O PRC indicou Nereu, sem adversários, e as urnas confirmaram seu nome — como confirmavam todas as decisões do PRC na República Velha.
Nereu não completaria o mandato, trocando o Legislativo por um cargo na delegação brasileira que iria a Haya e Bruxelas discutir direito marítimo, chefiada por Rui Barbosa. Na volta ao Brasil, trabalhou no gabinete do pai, ainda governador. Com Vidal no governo e — segundo o próprio governador, em seu livro de memórias —, ajudados por ele, os Konder chegam à Assembleia, elegendo Marcos Konder em 1913.
A eleição do governador Hercílio Luz
Quando Vidal Ramos deixou o governo, em 1915, assumiu a vaga de Felipe Schmidt no Senado. Schmidt, por sua vez, foi escolhido governador. A operação tinha o aval do senador Lauro Müller, a principal liderança nacional de Santa Catarina na época. Era ele que confirmava os nomes dos deputados federais, senadores e o governador do Estado.
Para a indicação dos cargos estaduais, era maior o peso do senador Hercílio Luz e do governador que estivesse ocupando o posto. Radicado no Rio de Janeiro, como senador e ministro de dois presidentes, Lauro interferia na política estadual apenas para evitar crises no Partido Republicano Catarinense – o único que Santa Catarina tinha na época. Foi assim, por exemplo, no primeiro mandato de Vidal como governador, em 1902. Sem consenso para a escolha, Lauro indicou a si mesmo e a Vidal como vice. Eleito, renunciou no mesmo ano.
Em 1918, Lauro Müller teve que intervir novamente. Hercílio queria ser o governador, mas Felipe Schmidt, com o controle da cúpula do PRC, apoiava o secretário Fúlvio Aducci. Com força na base do partido, Hercílio pressionou e colocou em xeque a própria liderança de Lauro, que chamou de "mítica".
Provocado, Lauro desceu ao Estado com a velha fórmula: indicou-se candidato, com Hercílio de vice. Vidal Ramos foi um dos entusiastas do acordo, vislumbrando nesse cenário maiores possibilidades futuras para seu clã.
Lauro nem vai a Florianópolis assumir o governo. Plantando a manobra que garantiria sua reeleição — proibida na época — Hercílio assume, mas assina todos os atos como "vice-governador em exercício".
Os planos de Hercílio não cabiam em apenas um mandato. Deles faziam parte uma inimaginável ponte ligando a Ilha de Santa Catarina ao Continente. Para isso, contava com a família Konder. Indicou Adolfo Konder como secretário de Fazenda, Viação e Obras Públicas, cargo que criou naquele mandato. Em 1919, Victor Konder se elege deputado estadual por Blumenau, fazendo companhia ao irmão Marcos – reeleito pela região de Itajaí. Por Lages, Nereu Ramos também volta para a Assembleia. Estavam todos na base de apoio ao governo Hercílio Luz, mas não por muito tempo.
Hercílio Luz veta candidatura de Nereu e passa a ser combatido
A década de 1920 em Santa Catarina foi marcada pelas duas grandes obras do governador Hercílio Luz. Uma, a construção da ponte que liga a ilha e o continente em Florianópolis. Outra, a guerra política que colocou em lados opostos os clãs Ramos e Konder. Em meio ao fogo cruzado, estavam Victor, Ruth e uma pergunta: o fim do noivado separou os políticos ou a política separou os noivos?
Era março de 1920, fazia cerca de dois meses que o deputado estadual Victor Konder havia oficializado o noivado com Ruth, filha do senador Vidal Ramos e irmã de seu colega de Assembleia Legislativa, Nereu Ramos. Todos integravam o único partido do Estado, o Partido Republicano Catarinense, e apoiavam o governo de Hercílio Luz, iniciado dois anos antes. Naquele mês, Hercílio viajou para Lages e foi recebido com entusiasmo pela população da cidade, Vidal à frente.
Os Ramos, que dominavam a política na cidade, eram mais próximos do outro grande líder do PRC: o senador Lauro Müller. Viviam um raro momento de aliança com Hercílio Luz, mantida a desconfiança mútua. Na visita, o governador se entusiasmou tanto com a recepção dos anfitriões quanto com a descoberta de que existia um grupo de descontentes com a liderança da família do coronel Vidal.
A aliança não resistiu às eleições para deputado federal. As quatro vagas de Santa Catarina seriam disputadas em fevereiro de 1921 e Vidal queria uma delas para o filho, Nereu. O sistema eleitoral previa a indicação de três nomes pelo PRC e que a quarta vaga seria escolhida fora dos quadros da legenda. Vidal era o vice-presidente do partido e tentou incluir Nereu na chapa oficial. Foi impedido: os Ramos, donos de uma cadeira no Senado, não ficariam com uma das três que o PRC teria para a Câmara.
Vidal e Nereu não se conformaram e lançaram candidatura para a vaga que caberia às minorias. Hercílio Luz volta a intervir, dizendo que o filho do vice-presidente do partido não poderia ocupar uma vaga destinada à oposição. Vidal reagiu, renunciando ao posto, e recebeu o troco. O governador destituiu todo o diretório lageano do PRC, fazendo assumir aquele grupo de descontentes que conhecera na visita à cidade serrana.
Os Ramos desistiram da vaga, mas se prepararam para medir forças com Hercílio Luz na eleição presidencial, em março. Apoiaram o oposicionista de Nilo Peçanha, que enfrentaria o governador mineiro Arthur Bernardes. Um enfrentamento desigual. Com o governo e o partido nas mãos, Hercílio elegeria quem quisesse. Não havia voto secreto e cada cédula colocada na urna tinha a vigilância atenta de chefes políticos locais. O voto aberto se somava às mais variadas pressões do Estado — remoções de funcionários, demissões, coação policial — para produzir a fábrica de maiorias forçadas conhecida hoje pela alcunha de República Velha.
Os resultados deixam isso claro. Bernardes recebeu 12.044 votos no Estado, contra 4.364 de Peçanha. Mesmo em Lages, as urnas foram impiedosas: 1.249 a 573 para o candidato de Hercílio Luz. Com o resultado, os Ramos não ousaram lançar candidatura para a eleição que escolheria o novo governador. O clã lageano reconhecia que aquela batalha fora perdida. A guerra estava apenas começando.
Eleito para um segundo mandato, Hercílio Luz coloca Konder e Ramos em lados opostos pela primeira vez
A derrota nas urnas na eleição presidencial fez a família Ramos evitar lançar candidatura ao governo do Estado em 1922. O senador Vidal Ramos até chegou a ser cogitado, mas não quis um novo confronto contra a máquina eleitoral do Partido Republicano Catarinense. Assim, o governador Hercílio Luz pôde colocar em prática o plano que engendrara ainda em 1918.
Naquele ano, ele só assumiu o governo após um acordo em que Lauro Müller se indicou candidato a governador, com Hercílio de vice. O senador nem veio ao Estado assumir o cargo. Com o governo na mão, Hercílio passou a assinar todos os atos do mandato como "vice-governador em exercício".
Era a brecha legal que permitira sua reeleição, que era proibida pela Constituição Estadual. Hercílio disputou e venceu como candidato único.
Na guerra entre Hercílio Luz e o clã Ramos, os irmãos Konder eram soldados do primeiro. Adolfo Konder, companheiro de Victor e Nereu na Faculdade de Direito de São Paulo, era o secretário de Fazenda, Viação e Obras Públicas. A poderosa pasta reunia o controle das finanças e das obras estaduais.
Bem-sucedido, Adolfo ganhou vaga na chapa oficial do PRC para a Câmara dos Deputados — aquela que Hercílio negou a Nereu Ramos, iniciando o conflito com a família lageana. Ao reassumir o governo em setembro de 1922, Hercílio indicou Victor Konder para substituir o irmão na secretaria.
Os irmãos Konder tocam o grande projeto de
Hercílio Luz: uma ponte ligando a ilha ao continente
Os irmãos Adolfo e Victor Konder tiveram participação direta na realização do maior sonho do governador Hercílio Luz: a construção de uma ponte ligando a Ilha de Santa Catarina ao Continente, em Florianópolis.
Ao assumir o governo em 1918, Hercílio criou a Secretaria da Fazenda, Viação e Obras Públicas e Agricultura. O órgão funcionava junto ao governador, no primeiro andar do Palácio de Governo — hoje Cruz e Souza. Adolfo foi nomeado para a pasta, tendo como principal missão correr atrás dos financiamentos para construção da obra. Já tinha até nome: Ponte Independência.
Ele se destacou no cargo e dele saiu para concorrer a uma vaga de deputado federal. Na época, eram quatro cadeiras para Santa Catarina e Adolfo conseguiu ser incluído na chapa oficial do Partido Republicano Catarinense.
Ao assumir o segundo mandato, Hercílio recorreu a outro irmão Konder para comandar a poderosa pasta que reunia as finanças e as obras públicas: Victor. Se a um Konder coube financiar o sonho, a missão do outro era transformá-lo em estrutura metálica e aposentar a lancha da família Valente que fazia a ligação entre ilha e continente.
As obras da Ponte Independência começam em novembro de 1922, apenas dois meses depois de Victor assumir o cargo. Os laços do secretário com Blumenau são tão fortes que ele nem fixa residência na Capital, preferindo ficar hospedado no Hotel Metropol, próximo ao Mercado Público. A partir de 1923, Victor vai conciliar a secretaria com a presidência do Conselho de Blumenau, equivalente hoje à Câmara de Vereadores.
Depois de quatro anos de compromisso,
acaba o noivado de Victor Konder e Ruth Ramos
É certo que o compromisso entre Victor Konder e Ruth Ramos não resistiu ao vendaval político. De um lado, a família Ramos em guerra aberta contra Hercílio Luz. De outro, os Konder aliados ao governador e se preparando para assumir o controle do Partido Republicano Catarinense. Mesmo assim, o noivado teria durado pelo menos quatro anos, acabando em 1924, deixando sem serventia um vestido de noiva pronto, à espera da cerimônia.
A data é imprecisa, mas um fato é recorrente nas versões da história: o deputado estadual Marcos Konder e o desembargador Pedro Silva vão a Lages para uma séria conversa com o senador Vidal Ramos, pai de Ruth. Na biografia que escreveu sobre Aderbal Ramos da Silva, governador entre 1947 e 1950, o jornalista Luiz Henrique Tancredo trata do episódio.
"O noivado prolongava-se, parecendo uma sinfonia interminável. E ele nada de se explicar. Até que certo dia, num papo de mesa de bar, Pedro Silva abordou o assunto, insistindo no sentido de que o amigo tomasse uma decisão, ou seja, que atasse ou desatasse. Conversa vai, conversa vem e Victor, meio sem jeito, acabou confessando que o casamento não fazia parte de seus planos", relata.
A confissão coloca o desembargador em posição complicada. Ele é marido de Rachel Ramos, irmã de Ruth. Por sugestão dele, Victor foi escolhido padrinho de Aderbal. Doutor Pedrinho, como era conhecido, convence o amigo a acabar com o noivado. Victor não quer ir a Lages, mas aceita a ida de Marcos e Pedro. O episódio é relatado pelo ex-senador Jorge Bornhausen, sobrinho de Victor Konder, na biografia escrita pelo jornalista Luiz Gutemberg.
"A mensagem que Marcos Konder leva ao Coronel Vidal é curta e conclusiva: Victor pede dispensa do compromisso matrimonial assumido e manda dizer que não pretende mais casar com Ruth. O noivado estava desfeito. Victor não alegava o motivo, era uma decisão de foro íntimo, que lamentava tomar e pela qual se desculpava. Ruth ficará solteira e nunca falará, nem para chorar mágoas, nem para imprecar contra o destino, muito menos para atacar o ex-noivo. Cala até a morte. Rompido o noivado, as famílias rompem relações", conta.
Há uma pequena variação na história quando ela é lembrada por descendentes da família Ramos. A comitiva formada por Marcos Konder e Doutor Pedrinho não teria a missão de encerrar o compromisso, mas de dizer a Vidal Ramos algo que ele deveria saber antes do enlace. Diante da informação, teria sido do coronel lageano a iniciativa de brecar o casamento. Fala-se até que uma doença seria a causa do fim do noivado.
Se foi a política, a boa vida de solteiro ou a saúde de Victor que levaram ao fim da relação com Ruth, é difícil responder. Certo é que em setembro de 1924, ele pede licença da Secretaria da Fazenda e do Conselho de Blumenau. Embarca às pressas para a Europa, onde vai passar por um tratamento de saúde. Ficaria cinco meses fora do Brasil.
Os Konder se destacam
no cenário político e os Ramos ficam isolados
Com as mortes de Hercílio Luz e Lauro Müller, os Konder assumem o comando político de Santa Catarina e mantêm isolada a família Ramos. Com um discurso, boas estradas e uma ponte magnífica, Victor Konder conquista o presidente eleito Washington Luiz e vira, para surpresa geral, ministro. A ex-noiva Ruth terá agora a missão de cuidar do pai e dos irmãos mais novos.
O último mandado de Hercílio Luz seria interrompido diversas vezes por licenças para tratamento de saúde no Rio de Janeiro e na Europa. Por coincidência, o secretário Victor Konder também começa a apresentar problemas de saúde e precisa tirar uma longa licença entre setembro de 1924 e janeiro de 1925, quando viaja para a Alemanha.
Victor ainda estava fora do país quando piora a situação de Hercílio. Em outubro de 1924, ele faz a última viagem do Rio para Florianópolis. Sua saúde está tão debilitada que o jornal O Estado recomenda que as pessoas saiam para recebê-lo no Trapiche Rita Maria. Mesmo assim, de acordo com a descrição feita pelo jornal República, as autoridades foram esperar por ele.
O temor de que Hercílio não conseguisse inaugurar a Ponte Independência, ainda em obras, fez com que fosse montada uma réplica, em madeira, na Praça Fernando Machado. Ao chegar, o governador inaugurou a pequena ponte e foi para seu palacete localizado em frente à Praça Etelvina Luz. Duas semanas depois estava morto, aos 64 anos. Em sua homenagem, a Assembleia Legislativa aprovou projeto para que a ponte se chamasse Hercílio Luz — hipótese sempre rejeitada por ele. O coronel Antonio Pereira e Oliveira assume o governo.
Quando Victor volta, já em 1925, retorna à Secretaria da Fazenda e à presidência do Conselho de Blumenau, que acumulava. Banquetes são oferecidos e até uma missa é rezada por sua boa recuperação. As obras da ponte já chamavam atenção da imprensa nacional, em reportagens que destacam os líderes do PRC, especialmente Adolfo Konder, que se elegeria governador no ano seguinte, em candidatura única.
Em maio, Victor deixa mais uma vez a Fazenda para cuidar da saúde. O irmão Marcos Konder, que acumulava uma cadeira de deputado estadual e a superintendência de Itajaí (equivalente hoje à prefeitura) chegou a ser convidado para assumir o cargo, mas recusou.
Victor passou algumas semanas descansando em Rio do Sul, distrito de Blumenau e retomou ao Conselho, mas não ao governo. Em agosto, elegeu-se deputado federal, na vaga de Adolfo.
A saída da Fazenda e a volta ao Vale impediram que Victor inaugurasse a Hercílio Luz, em maio daquele ano. Quando deixou o governo, a ponte estava concluída, mas faltava terminar os acessos.
Enquanto os Konder tomavam o PRC, a família Ramos continuava isolada em sua trincheira lageana. Para Ruth, o final da relação com Victor havia sido difícil.
Percebendo a filha triste e isolada, Tereza Fiúza Ramos escreve à amiga Maria Argentina Caldeira Bastos explicando a situação e pedindo que ela acolha Ruth por uns tempos em Florianópolis. Com cerca de 21 anos, a lageana voltava à capital do Estado, onde morou quando o pai era governador. Na casa dos Caldeira Bastos, nas proximidades da atual Praça Getúlio Vargas, ela se recompunha.
Logo caberia a ela um novo papel – que ela encararia sem titubear. Em fevereiro de 1924, morria sua mãe Tereza. Mais velha das filhas solteiras, ela cuidaria do pai Vidal Ramos e dos irmãos mais jovens.
Vidal caminhava para o final do mandato no Senado sem perspectiva de concorrer à reeleição. Nereu Ramos, irmão de Ruth, não tinha mandato e morava em Florianópolis, dedicado à advogacia e aos textos políticos no jornal O Dia. As portas do poder estavam fechadas para o clã nos planos estadual e federal.
Depois de Ruth, Victor começa um novo relacionamento com Mariechen Bulcão Vianna
Com a morte de Hercílio Luz, o cargo de governador ficou com o vice Antonio Pereira e Oliveira. Mas o veterano político do Partido Republicano Catarinense não ficou muito tempo no cargo, porque se elegeu senador. Com isso, o comando do Estado passa para o presidente da Assembleia Legislativa, Antonio Bulcão Vianna — que completaria o mandato até a posse do novo governador eleito em 1926: Adolfo Konder.
O médico e político Bulcão Vianna era descendente de duas tradicionais famílias de políticos baianos, radicados no Rio de Janeiro. O irmão Francisco Bulcão Vianna, já falecido, fora deputado federal no início do século, eleito pela Bahia. Uma de suas filhas, Mariechen, esteve em Florianópolis em 1926, hospedada na casa do tio.
Com o compromisso com Ruth Ramos encerrado há cerca de dois anos, Victor Konder conhece Mariechen e eles ficam noivos em abril daquele ano. O compromisso teve destaque na imprensa local e na do Rio de Janeiro — mais por causa da noiva do que do noivo.
O noivado foi desfeito em algum momento da história que os jornais da época não conseguiram registrar.
O discurso de Victor Konder e a Ponte Hercílio
Luz encantam o presidente eleito Washington Luiz
Naquele ano de 1926, o Brasil vivia o final do governo Arthur Bernardes e já tinha um sucessor eleito. Era Washington Luiz, escolhido sem disputa. No ciclo "café-com-leite", depois do mineiro Bernardes, era a vez do governador paulista. Entre a eleição em março e a posse em setembro, Washington viajou o Brasil, incluindo no roteiro as catarinenses Joinville, Blumenau e Florianópolis.
Os blumenauenses prepararam um banquete e colocaram Victor Konder para discursar ao novo presidente. Washington lembrou-se dele, da época em que despontou como promessa na Faculdade de Direito paulista. Victor faz jus à fama e brilha em seu discurso. Narra ao presidente eleito como um grupo de colonizadores alemães transformou Blumenau em uma bela e ordeira cidade de 93 mil habitantes e 30 mil quilômetros de estradas internas, que conseguia a proeza de investir 80,5% de tudo que arrecadava. Washington ficou impressionado. Ficaria ainda mais com o que veria no dia seguinte, em Florianópolis.
O orgulho dos catarinenses pela Ponte Hercílio Luz, recém-inaugurada, era tão grande que a festa para receber o presidente foi feita na cabeceira continental. Quando ele chegou, por volta do meio-dia, estavam lá as autoridades, com direito a banda de música e participação popular. Washington não conseguiu esconder o entusiasmo pela nova ponte. Ao discursar, lembrou que seu mote era "governar é construir estradas". Via o futuro sob as rodas dos automóveis.
Depois de alguns discursos e visitas, Washington decidiu voltar para a ponte para uma inspeção detalhada. Desceu do carro e contemplou as várias peças que formavam a maravilhosa estrutura da quinta maior ponte pênsil do planeta. A bengala, sempre a mão, deve ter sido utilizada para pequenas batidas no metal.
O presidente ainda olhou demoradamente para a vista das duas baías da Ilha de Santa Catarina, tão exuberantes quanto a construção. Voltou de carro para o Palácio, onde seguiu a programação de discursos e banquetes. Embarcou para o Rio Grande do Sul por volta das 23h com aquela imagem e uma surpreendente ideia na cabeça — novamente com direito a banda de música.
Era 13 de outubro de 1926, quatro meses depois da visita do presidente eleito Washington Luiz. Florianópolis acordou com um boato, que no início da tarde vira rumor e se confirma como notícia antes do anoitecer: um telegrama do Rio de Janeiro confirmava que o catarinense Victor Konder seria o novo ministro de Viação e Obras Públicas de seu governo.
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LINHA DO TEMPO
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GALERIA
Em São Paulo, onde cursaram a faculdade de Direito, os irmãos Konder e Nereu Ramos se destacam. Integrando a diretoria do Centro Acadêmico, foram fotografados com o político e escritor Joaquim Nabuco (ao centro).
Construção da ponte Hercílio Luz na década de 1920
Túmulo de Victor Konder, no cemitério São João Batista, no Rio de Janeiro
Ruth (à direita) cuidou de Vidal Ramos até 1954, quando ele morreu aos 87 anos. Viveria sozinha no Rio até 1991. Completam a foto as irmãs Daura, Rachel e Maria Júlia
Revolução de 30
Revolução de 30
Karla Eickhoff vivia no Rio na época em que Victor era ministro. Foi modelo de pintura de Oswaldo Teixeira para a Exposição de Belas Artes de 1930. Casou-se com Victor em Portugal
Forte de Copacabana, para onde foram levados o presidente Washington Luiz e seus ministros, entre eles Victor Konder, na revolução de 1930
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A série
Personagens
Linha do tempo
Edição
Mayara Rinaldi
Design
Gabriel Arones Guenther
Reportagem
Upiara Boschi