60 anos

Publicado em 8 de junho de 2016

Uma ousada senhora

Quando o novo Centro Cultural da Sociedade Cultura Artística (Scar) foi inaugurado em Jaraguá do Sul, havia um burburinho pessimista de que aquele espaço seria um “elefante branco”, quer dizer, que os custos para sua manutenção seriam muito mais altos do que os benefícios que ele traria à comunidade. Afinal, 14 anos haviam se passado entre a colocação da pedra fundamental da construção, em junho de 1989, e a assinatura da última ata da comissão de construção, em maio de 2003, e as colunas de sustentação haviam passado tempo demais sendo exibidas a quem passava pela rua Jorge Czerniewicz enquanto a obra esperava recursos para ser concluída.

Hoje, o Centro Cultural tem 10 mil metros quadrados divididos em seis pisos. Abriga dois teatros: um com mil lugares e outro com 250, além de 17 salas multiúso, um piano-bar e um salão panorâmico.

— Temos, realmente, uma estrutura magnífica em Jaraguá do Sul graças a algumas poucas pessoas que há muitos anos imaginaram ter uma construção deste porte — afirma o presidente da Scar, Udo Wagner.

O local é um órgão pulsante de cultura, pelo qual passeiam pessoas de todas as idades, com diferentes graus de escolaridade e nível financeiro, carregando instrumentos musicais, trajando figurinos de dança ou exibindo maquiagens de personagens do teatro. Lá dentro, quase mil alunos participam de cursos de artes e têm a oportunidade de, depois, apresentar estas lições no mesmo palco por onde passam profissionais e estrelas. Só
no ano passado, 340 eventos ocorreram na Scar, fazendo com que cerca de 130 mil pessoas tenham entrado por suas portas para consumir, principalmente, cultura.

— Nós temos um objetivo: Jaraguá tem entre 150 mil e 160 mil habitantes e queremos alcançar esse número de visitantes por ano. Simbolizaria que cada jaraguaense vai ao teatro pelo menos uma vez por ano — conta Udo.

— Óbvio que uma vai dez vezes, e dez pessoas, nenhuma. Mas a gente tem que mirar na Lua para alcançar as estrelas.

Reportagem

Claudia Morriesen

 

Imagens

Maykon Lammerhirt, Banco

de Dados e Scar/divulgação

Edição

Genara Rigotti

 

Design

Juliano Souza

Gestão pensada

para a cultura

Há oito anos, Udo Wagner está à frente da presidência da Scar. Mas suas decisões não acontecem sozinho: além de uma diretoria formada também por um vice-presidente e um diretor administrativo-financeiro, há um conselho formado por 25 pessoas, com conselheiros fixos — os ex-presidentes — e pessoas da sociedade que têm afinidade com a área da cultura. De dois em dois anos, um terço do grupo é trocado para garantir a oxigenação de opiniões e ideias.

A última decisão foi a intervenção artística com grafites nas paredes externas do Centro Cultural. O conselho foi unânime em concordar com a ideia como uma das ações em comemoração aos 60 anos da fundação da Sociedade Cultura Artística. Cinco artistas de São Paulo foram contratados para colorir o prédio de 10 mil metros quadrados com temas que mostrassem do lado de fora o que acontece lá dentro, como uma forma de também tirar a austeridade que o local ainda possa conservar. A partir da experiência, já foi decidido que a arte em grafite entrará para a grade de cursos oferecidos pela Scar até o fim do ano para que, em um futuro não muito distante, as intervenções em arte urbana possam ser produzidas por artistas locais.

— Eu diria que a Scar é uma senhora de 60 anos com ideias avançadas, atuais, inovadoras e ousadas. Nestes altos e baixos destes 60 anos, estamos vivendo o auge na produção cultural e na difusão de cultura, que é o nosso objetivo.

Udo Wagner está à frente da presidência da Scar há oito anos

A história e a herança

A música já ultrapassava os limites das paredes da sala de piano de Adélia Piazera Fischer no início dos anos de 1950, quando ela, ao lado do marido, Francisco, e dos filhos Yara e Guido, formava um quarteto para animar as noites da família. Sentada diante do R. Vierling alemão, que também podia ser assumido por Yara, enquanto os homens tocavam violino, eles faziam o som chegar à rua Expedicionário João Zapella, no Centro de Jaraguá do Sul. Com o tempo, sobrinhos e amigos uniram-se ao grupo, criando uma pequena orquestra familiar.

Ao tocar as teclas do instrumento, na metade do século 20, Adélia orquestrava as próximas décadas da cultura na cidade, em um efeito borboleta que ninguém poderia prever, mas que começou a ser sonhado naquela sala de piano.

Adélia nasceu em 1912 em Jaraguá e teve o talento para a música despertado ainda na infância. Aos dez anos, tornou-se aluna de piano. Emocionado com o bom desempenho da menina, o pai, Ângelo Piazera, a presenteou com o piano deixado por uma família de imigrantes alemães que voltavam para a Europa. Dois anos depois, a freira que a ensinava também retornou para a Alemanha, e Jaraguá do Sul ficou sem professores de piano — o que não impediu Adélia de continuar estudando sozinha.

— Minha mãe foi uma criatura auto-didata e sabia mais que muitas pessoas formadas que passavam por aqui. Todo artista que vinha de fora era acompanhado por ela — recorda Yara, filha de Adélia.

— A gente nasceu no meio da música, e meu irmão e eu aprendemos também.

Foi na sala de casa que Adélia tornou-se a professora de piano que os jaraguaenses precisavam e onde passou a oferecer, em parceria com a professora Liselotte Trinks, de Joinville, aulas de balé clássico. Do R. Vierling, saíam trilhas de balés de repertório enquanto as meninas faziam os movimentos recém-aprendidos. Elas participavam do início do maior projeto cultural de Jaraguá do Sul.

Yara, no centro da foto, com o acordeom. As apresentações ocorriam no Clube Atlético Baependi, no Salão Cristo Rei e no
Cine Buhr

Um nome para marcar

Em 1952, o jovem médico Fernando Springmann chegava a Jaraguá. Solteiro, sem conhecer ninguém na cidade, suas noites eram na companhia de um violino em um quarto alugado. O instrumento estivera presente na vida de Fernando desde a infância e, com ele, o florianopolitano participara de bandas e orquestras. Para preencher o silêncio das noites em uma cidade nova, Fernando ensaiava. Ao passar por ali, a caminho de casa, o trompetista Joaquim Piazera podia ouvi-lo.

— Ele chegou para os tios, dona Adélia e seu Chico, e contou sobre esse indivíduo que morava na casa da frente. Me convidaram a fazer parte da orquestra, quer dizer, na verdade, era um conjunto, com meia dúzia de pessoas — recorda Fernando, hoje com 90 anos.

O grupo era formado basicamente pela família Piazera Fischer, e não demorou para Fernando também tornar-se integrante: ele casou com Yara e tomou a linha de frente na pequena orquestra. Jaraguá do Sul já estava acostumada a ver suas festas embaladas por aqueles instrumentistas quando a ideia de criar uma sociedade nasceu. O professor Aleixo Dellagiustina, que não era músico, mas um entusiasta da orquestra em potencial, buscou referências na Sociedade Harmonia-Lyra, de Joinville, e na Sociedade Dramático- musical Carlos Gomes, de Blumenau, para criar o estatuto. Mas foi Fernando quem pensou nas palavras que formavam a sigla Scar, já planejando marcar profundamente o futuro de Jaraguá.

— Eu disse: “Vamos dar um nome simples, mas que seja mais abrangente, e ficou Sociedade Cultura Artística — recorda Fernando, que foi o primeiro presidente eleito.

Quando a Scar foi fundada, em 8 de junho de 1956, a sociedade já abrigava orquestra, coral, grupos de dança e de teatro. E, seguindo o conceito do termo, os integrantes realizavam atividades em conjunto, desenvolvendo espetáculos que uniam todas as áreas. Assim, a orquestra tocava para o coral cantar e para as meninas de Liselotte Trinks dançarem, por exemplo. Dessa forma, criavam a programação que movimentava a cidadezinha, que contava apenas 23.197 moradores em 1960 — a maior parte deles, vivendo na área rural.

— A gente fazia muitas apresentações, produzia um programa e depois aperfeiçoava. E como levávamos gente! Os homens e mulheres iam muito bem arrumados — recorda Yara.

Para a atual gerente executiva da Scar, Edilma Lemanhê, os depoimentos e registros daquele tempo mostram como as atividades de entretenimento de Jaraguá giravam em torno das apresentações dos grupos da Scar.

— As grandes emoções da cidade, as atividades sociais de Jaraguá, eram prestigiar esses eventos — analisa ela.

As apresentações ocorriam no Clube Atlético Baependi, no Salão Cristo Rei e no Cine Buhr, que também passaram a abrigar os ensaios da orquestra. Com o tempo, a sala de dona Adélia ficou pequena demais para a grandiosidade do sonho dos fundadores da Scar.

O casal Springmann (Yara e Fernando) faz parte do grupo de fundadores da Sociedade Cultura Artística

A primeira aluna

Quando fez 14 anos e começou a namorar, a jaraguaense Neusa Stamge ouviu Adélia Fischer dizer, em um dia de aula de piano:

— Fala para a sua mãe trazer um tecido aqui que eu vou te ensinar a bordar uma espiga de trigo, porque para o casal ser feliz precisa ter bordado de trigo no enxoval.

Era sinal da proximidade de uma professora que a conhecia desde os sete anos e que Neusa considerava uma segunda mãe. Ela cruzava a porta da casa que foi a primeira sede da Scar para aulas de piano com Adélia e de balé com Liselotte Trinks.

— Dona Adélia formou a orquestrinha com as crianças e tocávamos nas apresentações. Ela adorava as músicas de Zequinha de Abreu. As mães nos arrumavam com as melhores roupas porque era muito chique tocar na frente de toda a cidade — lembra ela.

A empolgação de Neusa nas atividades da Scar levaram até o namorado, Milton, a participar de uma apresentação de balé. Liselotte queria montar uma coreografia com a música Eu, Você e a Rosa, de Clara Nunes, mas precisava de um bailarino para o trabalho.

— Imagina se havia meninos fazendo balé em Jaraguá naquele tempo. Então eu sugeri convidar meu namorado, que era um ótimo dançarino de salão — conta Neusa.

A coreografia estreou em 1968 e foi um sucesso, levada para apresentações em outras cidades da região, como Joinville e Corupá. Na época, Adélia Fischer já apresentava sinais da doença que a levaria em 1970 e se ausentou das aulas de piano. Por um tempo, a cidade ficou novamente sem professora, até a chegada de Wania D’Aquino Pinho, em 1980. Quando concluiu os estudos, Neusa tornou-se professora também, com o título de ser a primeira aluna formada em piano pela Scar. Atualmente, ela trabalha na secretaria do Centro Cultural. De namorado e parceiro de dança, Milton virou marido — e os lençóis bordados com espiga de trigo continuam guardados, garantindo a felicidade do casal, como Adélia prometeu.

Neusa foi a 1ª aluna formada em piano na Scar. Fez aulas com Adélia Fischer

Novos ares

Magnus Behling, que atualmente é professor de violino e diretor artístico da Orquestra Filarmônica da Scar, faz parte de uma nova fase da Sociedade Cultura Artística. Quando ele começou a estudar piano, aos oito anos, as aulas das escolas de música, pintura e dança ocorriam em salas alugadas, mas já havia, no início dos anos 1980, a união de forças para construção de uma sede própria. Os professores eram “importados” da Escola de Música Donaldo Ritzmann, de São Bento do Sul. Entre eles estava Cilene Sluminski Gumz, que, aos 13 anos, foi contratada para aplicar o método Suzuki no ensino de violino.

— O nome dela tem que ser gravado porque é muito importante. O efeito da vinda dela para Jaraguá foi absurdo, uma explosão. A quantidade de alunos era inacreditável, havia lista de espera e as vagas eram disputadas “a tapa” — relembra Magnus.

Este momento foi marcado pelo ressurgimento de uma orquestra para a Scar, que estava em hiato havia mais de uma década. Ela ressurgiu graças aos movimentos para ampliação de aulas de instrumentos de cordas na Escola de Música, já que, antes da vinda de Cilene, os cursos eram limitados a poucas opções, como flauta, piano e violão.

O maestro Ricardo Feldens é um dos grandes responsáveis pelo renascimento. Ele já havia participado de um momento importante da Scar quando, em 1960, foi o regente do primeiro espetáculo de Natal da sociedade, que uniu a orquestra com o coral da Igreja Evangélica. Mudou para o Rio de Janeiro e voltou apenas em 1978, quando assumiu o coral da Scar. Com os filhos crescendo, Ricardo sonhava que eles tivessem uma formação musical clássica e fez o pedido à diretoria, que se encarregou de encontrar professores. Então, ele próprio virou aluno de violoncelo com professores de outras cidades, que chegaram a dar aulas aos domingos para garantir a formação de pessoas que, como Ricardo, tornaram-se professores da Scar.

— Com os alunos virando professores, a educação musical nunca mais morreu. Quando vimos, havia muitos violinistas, violoncelistas e violistas e pensamos: “Por que não formar uma orquestra?” — conta Ricardo.

A primeira orquestra de câmara da Scar teve início em 1987, com cerca de 15 músicos de sete a 70 anos, com diferentes níveis de conhecimento, e Ricardo à frente, na regência. Em 1991, os mais experientes formaram a Camerata, que conquistou um currículo respeitável: começou a fazer turnês pelo Estado, depois pelo Sul e pela América do Sul. Em 1999, fez a primeira das três viagens para apresentações na Europa — a próxima já está marcada para 2017.

— Muitos alunos da escola que passaram pela Orquestra de Cordas e pela Camerata foram estudar música em cursos superiores. Quem não seguiu carreira na área, nós sabemos que desenvolveu responsabilidade, disciplina e é um cidadão melhor — afirma o maestro, que também viu seus filhos crescendo para virarem maestros, mestres em música e uma advogada que sabe tocar violino.

O maestro Ricardo Feldens é
um dos responsáveis pelo renascimento da Scar

Magnus Behling é professor de violino e diretor artístico da Orquestra Filarmônica

Dinamismo e responsabilidade

para criar cultura

A Cia. Colher de Pau é um dos exemplos mais perfeitos de como os programas de cultura dentro da Scar podem evoluir a ponto de se “autoalimentar” e, com isso, garantir a produção ininterrupta. Seus integrantes eram alunos do curso de teatro oferecido pela Sociedade Cultura Artística há dez anos. Quando as aulas acabaram, houve quem não quisesse deixar o aprendizado apenas na lembrança, e assim nasceu o grupo, estreando com uma esquete em 2007. Hoje, eles atuam profissionalmente e tornaram-se um dos núcleos de produção da instituição, garantindo a programação interna da Scar.

— No início, era apenas um

hobby, mas foram surgindo projetos que levaram à continuidade do grupo. O ponto de mudança foi em 2010, com a montagem de O Inspetor Geral, que exigia estudos e ensaios o dia inteiro — recorda Maykon Junkes.

Pode parecer incrível que, em uma cidade industrial como Jaraguá do Sul, quatro pessoas saiam de casa todos os dias em direção a um grande prédio para, durante oito horas, fazerem pesquisas, passarem por treinamentos físicos e ensaiarem textos. Mas esta é a rotina da Cia. Colher de Pau, que tem nas artes cênicas sua profissão e, por meio da parceria da Scar, consegue fazer isso de uma forma com que outras companhias profissionais podem apenas sonhar. Com status de núcleo de produção, o grupo utiliza uma sala para seus trabalhos e ensaios sem a obrigação de pagar locação — essa taxa é paga quando a companhia é contemplada em editais que permitam a inclusão deste valor. E, da mesma forma que ocorria quando a Scar era apenas um pequeno grupo de pessoas se reunindo na sala de casa de Adélia Fischer, há colaboração entre os outros núcleos da sociedade: o operador de luz dos teatros do centro cultural está sempre presente para criar a iluminação cênica dos espetáculos, e as trilhas sonoras são originais, com professores de música atuando na composição.

— Fazer teatro e viver disso é quase uma utopia — avalia Maykon.

— Mas dentro da Scar temos todas as condições por causa desta parceria. Estamos protegidos por ela.

Ao poder viver de arte, os integrantes da Colher de Pau realmente assumiram este papel: deixaram seus antigos empregos — inclusive alguns deles na indústria, em empresas com vagas disputadas na região — para dedicarem-se em tempo integral à produção de espetáculos. Experiências parecidas podem ser encontradas na orquestra: os alunos de projetos sociais e cursos de música são convidados a participar da Orquestra das Crianças e da Orquestra Jovem, e estas os preparam para a Filarmônica. Assim, muitos músicos da Scar também podem assumir esta profissão para valer.

— Existe um equívoco muito grande de achar que o artista tem que trabalhar de graça. Ele tem que viver, comer, abastecer carro e pagar o aluguel como qualquer outra pessoa — defende o presidente da Scar, Udo Wagner.

— Enquanto se encarar como um hobby, o nível dele fica onde está. Ele não se aprimora e quem espera mais dele não pode esperar, porque se ele não é remunerado, não é profissão.

Antes de artistas, cidadãos

Ainda que tenha nascido sob o signo da música, a Scar fortaleceu o trabalho nesta área nos últimos 13 anos, desde que virou a casa do Festival de Música de Santa Catarina (Femusc). Além de ganhar relevância internacional, uma vez que o evento atrai estudantes de todas as partes do mundo para ter aulas com professores que também vêm de outros países,
o Femusc ainda chamou a atenção dos próprios jaraguaenses para esta
forma de arte. Desde que teve início, a procura por aulas de instrumentos musicais aumentou, causada, principalmente, pelo acesso aos concertos gratuitos nas noites do Festival.

Ao mesmo tempo, o Femusc garantiu benefícios para a estrutura do centro cultural, como a doação de instrumentos musicais necessários
para os cursos oferecidos naqueles dez dias de janeiro, como pianos, violoncelos e harpas — das 40 registradas no Brasil, 17 estão em Jaraguá do Sul, dentro da Scar. A contrapartida social da Sociedade Cultura Artística para a sociedade em geral está nos projetos sociais que possibilitam que crianças, jovens e adultos de baixa renda também possam aprender a tocar estes instrumentos. A mensalidade dos cursos particulares de música variam entre R$ 170 e R$ 200, mas os selecionados para projetos como o Música para Todos (MPT) têm a mesma grade curricular em aulas gratuitas.

Atualmente, os bolsistas dos projetos sociais representam quase metade dos 965 alunos da Scar. Segundo o professor Roberto Koch, cerca de 800 pessoas participam da seleção para o MPT todos os anos, e são escolhidas a partir da renda mensal da família e da aptidão para a música. Além da aula prática do instrumento, aprendem educação musical, percussão corporal e canto coral.

— Alguns alunos, ainda na adolescência, já estão começando a formar grupos musicais e ganhar cachê — conta Roberto, que é coordenador do MPT.

— Mas, além da formação como profissionais, eles também desenvolvem responsabilidades como cidadãos.

Linha de produção cultural

Atualmente, a Scar conta com um grupo de teatro, dois grupos de dança, uma banda, um coral com 55 membros e três orquestras. Todos eles atuam dentro da sociedade como a Colher de Pau, quer dizer, como um núcleo de produção independente. Desta forma, eles podem se habilitar
a conseguir recursos a partir de editais municipais, estaduais e federais, além de patrocínios sem incentivo fiscal. Em troca da estrutura do Centro Cultural Scar, fomentam a programação do local e pagam locação quando há recursos disponíveis.

— Eu encaro a Scar como uma empresa, e nós temos produtos. Se alguém quer contratar um duo ou um trio para tocar, uma banda, um
coral ou uma orquestra com pessoas de qualquer idade, nós temos — afirma Udo Wagner.

— Essas arrecadações não ficam para a instituição, vão para os artistas. Com que objetivo? Profissionalização. Como vamos melhorar o desempenho das nossas atividades se não tivermos uma visão empresarial?

Para a comunidade, tudo isso volta como formação e lazer. A Scar promove eventos como A Escola vai ao Teatro, que oferece sessões de espetáculos para estudantes a preços populares, e assim espera a criação de plateia, com crianças se acostumando a frequentar apresentações culturais. A produção interna garante o complemento para a programação nacional e internacional, que ocorre com tanta frequência quanto em cidades com duas a três vezes mais moradores, como Blumenau e Joinville.

— Espetáculos grandes exigem um teatro com infraestrutura, o
que até pouco tempo não havia em Joinville — diz a produtora cultural Albertina Tuma.

— Por isso, títulos como Callas, Esquina Carlos Gardel e Meninos Cantores de Viena foram apenas para a Scar.

Gestão empresarial

e sustentabilidade

Mais do que uma instituição que promove cultura e um prédio que abriga suas atividades, a Sociedade Cultura Artística tornou-se referência em estrutura em Jaraguá do Sul. Seus teatros e suas salas multiúso são utilizadas para eventos de todas as áreas, de palestras e convenções empresariais a coquetéis e casamentos. E, claro, espetáculos, shows, festivais e feiras culturais, que têm prioridade dentro do centro cultural. É a locação destes espaços que gera a maior parte da renda que mantém a instituição, que é sem fins lucrativos. A administração da bilheteria e as aulas de artes particulares também colaboram em uma parte do orçamento da Scar, que tem o objetivo de ter equilíbrio financeiro e gestão cada vez mais enxuta.

— A Scar é definida como uma entidade prestadora de serviços na área cultural — afirma o presidente da sociedade, Udo Wagner.

O vice-presidente administrativo e financeiro Celso Fritzen reforça o foco da produção cultural, mas salienta que, para conseguir se manter, é necessário abrir as portas para outros tipos de eventos.

— O espaço não pode ficar ocioso, se pode ser ocupado. Em uma empresa, nenhuma máquina fica parada se há produção — avalia ele.

Para garantir que o Centro Cultural funcione com custo mais baixo, a equipe é formada por apenas 12 colaboradores fixos: duas zeladoras, três técnicos e sete pessoas fazem a gestão da locação de todos os 10 mil metros quadrados, cuidam da escola com quase mil alunos e 55 professores. Além disso, recentemente a preocupação com a sustentabilidade ambiental também levou a Scar a promover mudanças: um sistema com nove filtros, dois poços artesianos no terreno e captação da água da chuva garantem água tratada para todo o prédio.

— Toda a água consumida e usada em banheiro, limpeza interna ou externa é de poço ou captação de água da chuva — conta Udo.

Entre as ideias para marcar os 60 anos da Scar, está a produção de energia elétrica pelo sistema fotovoltaico. Desta forma, 75% da energia consumida no prédio a partir do mês de junho de 2016 estarão sendo produzidos ali mesmo, em placas instaladas no telhado. O investimento de R$ 900 mil foi possível a partir da doação de cinco pessoas, que doaram R$ 150 mil cada, e da empresa de Jaraguá do Sul que produz o sistema fotovoltaico.

— O fato de termos um prédio sustentável também pretende colocar a Scar no roteiro de eventos que tratam de meio ambiente. Assim, além de gerar economia, também irá atrair novos negócios e aumentar a receita — avalia a gerente executiva Edilma Lemanhê.

75% da energia elétrica consumida na Scar são gerados pelo sistema fotovoltaico instalado no telhado do prédio

Doação para a cidade

A doação de pessoas e de empresas para a Sociedade Cultura Artística para a instalação do sistema fotovoltaico não surpreende quem conhece o funcionamento da instituição. Desde o início, a Scar foi possível porque a comunidade se envolveu — principalmente a comunidade empresarial. Já no início, ainda nos anos 1950 e 60, a orquestra de Adélia Fischer recebia instrumentos e eram patrocinados pelos industriais da cidade.

— Precisávamos de dinheiro até para comprar partituras, que depois copiávamos à mão, porque não existia tecnologias como xérox. Sem a ajuda dos patrocinadores, não teríamos conseguido — recorda Fernando Springmann, o primeiro presidente da Scar.

A conscientização da cidade sobre a importância de um centro cultural também ficou clara quando, por duas vezes nos anos 1980, a Scar precisou construir imóveis para abrigar suas atividades. A primeira, na rua Amazonas, levou boa parte daquela década, até ser inaugurado em 1986. Logo em seguida, começaram as discussões sobre um teatro para Jaraguá do Sul, que acabou crescendo para tornar-se a nova sede, que seria finalizada apenas em 2003. Ela foi construída com recursos da iniciativa privada a partir de mecanismos como a Lei Rouanet e o mecenato estadual.

São estes, também, que hoje possibilitam os projetos que ocorrem dentro da Scar, tanto no campo da formação quanto da programação. Projetos sociais que oferecem aulas de dança, música e teatro são possíveis a partir do patrocínio de uma única empresa de Jaraguá do Sul.

—  Muitas gente acha que o incentivo fiscal penaliza a empresa porque não dominam a legislação — diz Udo Wagner.

Ele acredita que Jaraguá é diferente das outras cidades, onde artistas e instituições sofrem para conseguir patrocínio, porque boa parte dos proprietários de empresas é nascida na cidade e em seu entorno. Por isso, há compreensão de que o próprio doador, sua família e seus funcionários serão beneficiados.

— Em outras cidades, com as necessidades da fusões, o gestor principal vem do eixo Rio-São Paulo, quando não é do exterior. Ele não tem a mesma paixão pela cidade como a nossa gente tem — analisa ele .

— Estou falando desta geração, mas espero que os descendentes pensem da mesma forma.

Para Edilma, a existência de um centro cultural como a Scar em uma cidade como Jaraguá do Sul também garante às empresas a contratação de profissionais de outras regiões do País que dão preferência para lugares com estrutura. Como é uma cidade industrial, mas de pequeno porte, a programação cultural está entre os itens que a diferenciam de municípios semelhantes.

— Eles têm um entendimento de que a cultura não é uma atividade que fala por si, mas que está formando um cidadão melhor, mais engajado, que sabe trabalhar melhor o coletivo — afirma ela.

Edilma Lemanhê, gerente executiva da Scar, e Celso Fritzen, vice-presidente administrativo e financeiro

 

Scar 60 anos de cultura

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