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Conteúdo: novembrada  | 26/11/2009 16h42min

30 de novembro de 1979: o dia que Florianópolis confrontou a ditadura militar

Milhares de pessoas protestaram contra o presidente João Baptista Figueiredo

Renê Müller  |  rene.muller@diario.com.br

O 30 de novembro de 2009 marca exatos 30 anos do episódio em que, pela primeira vez, um presidente da República — um general, e em plena ditadura militar — partiu para a confrontação direta com populares.

O episódio, que ficou lembrado dali em diante como Novembrada, aconteceu em Florianópolis. Até hoje é lembrado como o primeiro sinal do enfraquecimento do regime militar, que de fato caminhou para o ocaso cinco anos depois. Foi um marco histórico na campanha pela redemocratização do Brasil.



Um manifesto organizado por 30 estudantes na Praça XV de Novembro — onde ficava a então sede do governo do Estado, o Palácio Cruz e Sousa — foi um dos fatores que desencadearam a ira do presidente João Baptista Figueiredo.

Mas não foram eles os únicos a protestarem. No caminho entre o aeroporto Hercílio Luz e o Centro da Capital, o presidente foi recepcionado por um "panelaço" de donas de casa, que batiam nas panelas reclamando que não tinham o que comer.

Na Praça XV, juntavam-se aos estudantes familiares das vítimas do Massacre de Anhatomirim, inconformados com a inauguração de uma placa em homenagem ao Marechal Floriano Peixoto, o presidente que deu origem ao nome Florianópolis, acusado de ter ordenado o traumático fuzilamento dos seus opositores federalistas.

Muita gente simples também queixava-se das condições de vida à época. Os taxistas (muitos deles com ponto na praça e nas redondezas) estavam inconformados com um novo aumento dos combustíveis.

Irritado com os protestos e palavras de ordem, o presidente, que participava de ato oficial dentro do palácio, resolveu ir à sacada. Dali, gesticulou de maneira polêmica com a mão direita. Os manifestantes entenderam o gesto como um insulto, e xingaram a mãe do presidente.

— Minha mãe não está em pauta — repetia um transtornado Figueiredo, que intempestivamente, e contrariando todos os conselhos (inclusive o do então governador Jorge Bornhausen), desceu à Praça para tirar satisfação com os manifestantes.

Mantendo a programação, o presidente ainda tomou um café no Senadinho, onde voltou a ser ofendido e criticado pela população da Capital.

No saldo final, sete estudantes foram presos, com base na lei de Segurança Nacional. A placa em homenagem a Floriano foi arrancada de seu pedestal, e vandalizada de todas as maneiras pelos manifestantes.

Prisões e mais protestos

Mas a agitação na Capital catarinense estava longe de terminar. A Novembrada ainda renderia capítulos ainda mais dolorosos. Nos dias subsequentes à manifestação, os serviços de segurança do Estado e a Polícia Federal empreenderam uma caça aos líderes estudantis que organizaram os protestos do dia 30.

Sete pessoas foram presas e enquadradas na Lei de Segurança Nacional: Adolfo Luiz Dias (presidente do Diretório Central dos Estudantes da UFSC), Lígia Giovanella (vice-presidente do DC e namorada de Dias), Amilton Alexandre, Geraldo Barbosa, Marize Lippel, Newton Vasconcelos Jr. e Geraldo Barbosa.

A prisão dos estudantes desencadeou uma nova torrente de reação popular que culminou com um ato público em 4 de dezembro, no largo da Catedral Metropolitana.

Políticos, ativistas dos direitos humanos, estudantes e uma multidão de populares tomaram as escadarias da catedral para exigir a libertação dos sete líderes estudantis. Como o governo do Estado já havia admitido que não toleraria qualquer tipo de "ação que colocasse em risco a ordem pública", a Polícia Militar se fez presente e reprimiu a manifestação, num confronto muito mais violento se comparado aos registrados durante a visita do presidente Figueiredo. Deputados, mulheres e até crianças foram espancados.

Determinados, os manifestantes não deixaram o local. A multidão ficou de frente para o pelotão de PMs na rua Acipreste Paiva e em coro cantou o Hino Nacional, protagonizando um dos momentos mais emocionantes da história da Novembrada. Após 15 dias de prisão, os estudantes foram libertados, mas a agonia ainda não havia acabado, pois seguiriam respondendo processo em liberdade.

Uma junta de notáveis juristas brasileiros (como Dalmo de Abreu Dallari, José Carlos Dias, Robeto Motta, dentre outros) foi reunida pelo advogado Nelson Wedekin, da Comissão de Paz e Justiça da Arquidiocese de Florianópolis, para cuidar da defesa dos sete acusados. Pode-se dizer que o desfecho da Novembrada ocorreu em fevereiro de 1980 com o julgamento promovido pela Justiça Militar em Curitiba. Todos foram absolvidos.

 
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