Notícias

Itapema FM  | 12/11/2015 16h16min

Cineasta catarinense aposta no subgênero slasher com o terror "Condado Macabro"

Confira a entrevista que o crítico de cinema do DC fez com diretor Marco DeBrito

Andrey Lehnemann*  |  clickfilmes@yahoo.com.br

Com uma carreira consolidada em curtas-metragens, nos experimentais OD e Universo, o catarinense Marco DeBrito quer explorar mares ainda pouco conhecidos no cinema brasileiro no seu primeiro longa, Condado Macabro. A procura pelo frame rápido e abordagem frenética (quase uma hip hop montage, espelhando-se nos primeiros de Aronofsky) denuncia as tentativas de um diretor buscando se infiltrar na narrativa: o negativo queimado pontualmente, o take inicial, além do paralelo trazido entre as duas condições trágicas impostas aos personagens. A comparação com O Massacre da Serra Elétrica é a mais óbvia, quando observamos o equipamento, o abatedouro, as máscaras, o interior abandonado, a submissão a uma figura familiar – até a Kombi dos amigos é trocada por uma van familiar.

Especial 007: os melhores e piores momentos da franquia

Condado Macabro pode não ser uma produção de grandes ideias, mas é um slasher (filmes que se originaram nas décadas de 70/80, nos quais assassinos seriais matam jovens aleatoriamente e geralmente há apenas uma mulher sobrevivente, o que se chama de final) sólido no cenário brasileiro. Sua essência underground, de filme independente, é explícita seja na construção de cada plano, seja na própria natureza da casa em que se passa toda a experiência ou na delegacia improvisada. Com isso, algumas coisas falham ao favorecer o exagero: se algumas das piadas ou o senso cínico dos amigos palhaços conseguem ter um bom efeito, o mesmo não pode se dizer dos outros homens estúpidos, os gracejos com os vômitos, o constante falatório sexual e a dramatização quase novelesca dos diálogos. Sem contar o óbvio clima cômico evidenciado pelas músicas bregas e o gordo/magro presente na interpretação dos palhaços.

Leia mais notícias sobre cinema

DeBrito, por outro lado, cria uma tensão suficiente para nos importarmos com o desenvolvimento, esperando principalmente a primeira aparição dos assassinos, que também são surpreendidos por presenças inesperadas. Não que isso freie o banho de sangue na narrativa. O extremo da cabeça de Beto num carro é resultado de uma linha tênue entre o gore e o bizarro, por exemplo. O mesmo que Theo encontrando o "Cabeça de Porco" nas matas. De qualquer maneira, o cineasta se submete a ser um dos primeiros a traduzir o slasher para uma linguagem tupiniquim. Com suas falhas e seus acertos.

Confira o trailer do filme

Outros terrores de Santa Catarina

Entre os longas-metragens, O Amuleto, que foi rodado em Santa Catarina, falhou miseravelmente em traduzir o horror registrado no misticismo e no sobrenatural. A Antropóloga, idem – serve mais como uma experiência cômica, com direito a lobisomens em barcos voadores –, diferentemente dos ótimos curtas Religare e O Segredo da Família Urso, que usam o drama como espelho para o terror.

Entrevista com o diretor

Marco DeBrito diz que é quase um nômade, vai aonde a carreira requer. O catarinense nasceu em Florianópolis, mas morou em Brasília, nos Estados Unidos e atualmente reside em São Paulo. Saiu da Ilha aos 18 anos, pois o curso de Cinema ainda não era uma realidade por aqui. Acabou se formando na FAAP, na capital paulista, e criando a equipe com a qual continua trabalhando. Atualmente o diretor se prepara para retornar a Floripa, mas atrás das câmeras – ele está negociando a estreia de Condado Macabro na cidade. Conversei com ele, na semana passada, sobre anseios, influências, representatividade e sua experiência no primeiro longa. A entrevista você confere abaixo:

Há quanto tempo o filme está sendo feito? Vocês ganharam o edital do proACde 2012 para finalizá-lo, certo? A ideia do longa-metragem surgiu bem antes?
Na verdade, ele surgiu de um curta-metragem de faculdade que eu e o André de Campos Mello havíamos dirigido em 1999. Resolvemos nos reunir de novo para fazer uma continuação comemorativa, mas como já tínhamos carreiras consolidadas como curta-metragistas, resolvi escrever um longa. Pouca coisa sobrou do original, apenas o título – que ia de acordo com a nossa proposta de homenagear clássicos do terror slasher – e o nome de um dos personagens. De resto, tudo foi modificado. Começamos as filmagens em janeiro de 2012 e levamos 40 dias, virando noite atrás de noite. Foi uma experiência traumatizante para todos da equipe e do elenco. Usamos a locação do filme como base e hospedagem, então ninguém saía de lá. Quem dormia, acordava no set ou se assustava com o som da motosserra rompendo a madrugada. Não esperávamos ganhar o ProAC. Foi uma surpresa e tanto, porque até então éramos amigos profissionais fazendo um filme em parceria, sem grana nenhuma. Mas quando obtivemos o apoio do edital, conseguimos finalizar como queríamos. O Condado está sendo só surpresas para nós. Além do ProAC, recentemente recebemos o apoio da rede Telecine também.

Qual o motivo de ter escolhido Mato Grosso do Sul para a experiência no terror?
Como havíamos proposto um filme sem verba, todos os custos tinham de ser minimizados. Minha família havia acabado de construir uma casa na região, e eu escrevi o roteiro com ela em mente para aproveitar o que tínhamos. E como tenho parentes na cidade onde filmamos, poderíamos contar com ajuda no set, pois nossa equipe técnica se resumia a dois diretores, que também faziam câmera e fotografia, um produtor, que além de controlar o set precisava montar maquinaria e fazer cumprir o cronograma, e um maquiador de efeitos especiais, que também fazia o som direto. O restante eram pessoas que queriam ajudar.

O terror nos últimos anos, desde 2008, tem ganhado uma cara interessante no Brasil – seja por meio do gore do Rodrigo Aragão, pelo terror familiar de Marco Dutra e Juliana Rojas ou pelo humor de Tiago Belotti. A sua escolha foi mais tradicional, o slasher, que ainda é um subgênero incomum no Brasil. Como foi trabalhar com a fórmula? O espectador pode esperar surpresas, já que você intercala com uma investigação policial?
Sempre adorei a pegada slasher. Conheço os realizadores nacionais de terror e sempre estranhei o fato de nenhum deles ter se aventurado no estilo. Aqui no Brasil, os realizadores têm uma tendência de se levarem muito a sério, então partem para filmes um pouco mais autorais que nem sempre agradam o grande público. Sinto que no gênero acontece um pouco disso também por aqui. Quando se faz algo mais sério, falta humor e sobra medo de errar. Já no slasher, pudemos nos dar o direito de ser debochados. Começando pelo título, Condado Macabro. Escolhemos esse nome pela sonoridade e também para brincar com uma tradução porca que títulos de filmes estrangeiros do gênero recebem por aqui. Muitos deles abusam das palavras county e massacre, então juntamos os dois. Internacionalmente, ele se chama Massacre County. Até mesmo a própria estética, que emula um negativo 16mm sujo e mal cortado em moviola, entrou como brincadeira para provocar um pouco o público. No entanto, nem tudo é zoeira. Temos piadas cretinas, sarcasmo, sangue, violência, mas também um suspense que é a parte séria. Como também sou romancista, gosto de amarrar todos os nós de uma trama e busquei fazer isso no roteiro, que é cheio de surpresas e reviravoltas. Desde o início sabemos que houve uma chacina, mas quem matou os jovens e como, vai sendo revelado aos poucos.

Gosto de perguntar para todo diretor: quais suas maiores influências? Algum filme serviu como referência para a concepção de Condado Macabro?
Por incrível que possa parecer, meus principais diretores referência não são do gênero. Como profissional do cinema, tento me espelhar em David Lynch, Darren Aronofsky, Coppola, Tarantino, Fritz Lang, Dziga Vertov, Christopher Nolan... Mas também tenho Sam Raimi, Guillermo del Toro, Rob Zombie e tantos outros do terror que me inspiram. Para o Condado Macabro em si, há referências óbvias aos grandes clássicos do gênero. Massacre da Serra Elétrica é inegavelmente o principal, mas longe de ser o único. Pegamos do Motel Hell, de 1980, a inspiração para uma das máscaras de porco que o personagem Jonas utiliza. O nome desse nosso personagem mais truculento, inclusive, é um anagrama de Jason, de Sexta-feira 13. Já a concepção visual é muito inspirada em Casa dos 1000 Corpos e Rejeitados pelo Diabo, ambos de Rob Zombie. Além disso, temos também dois palhaços que tiveram influência do filme espanhol Balada do Amor e do Ódio.

Tem interesse em lançar o filme em festivais internacionais e nacionais?
O filme começou em festivais. Estreamos no Fantaspoa, um dos principais do gênero fantástico da América Latina, e lá recebemos o prêmio de Melhor Filme Brasileiro. Tivemos também uma sessão inesquecível na Mostra de Cinema Latino-americano de São Paulo, onde ele foi ovacionado por mais de 500 pessoas, e estamos rodando pelo Brasil ainda. Mesmo com a estreia, fomos selecionados para um festival no Acre e outro em Manaus. Já fomos exibidos também no México, na Holanda e neste mês temos Espanha, Colômbia e Argentina. Conseguimos até representação internacional para o filme de uma empresa na Inglaterra e agora estamos negociando para estrear comercialmente em diversos países.

DIÁRIO CATARINENSE
Sintonize a Itapema em Florianópolis 98.7, em Joinville, sintonize 95.3

Grupo RBS Fale Conosco | Anuncie | Trabalhe no Grupo RBS - © 2009
clicRBS.com.br • Todos os direitos reservados.