O vazamento de documentos confidenciais da Sony, nesta semana, apontou que Amy Adams e Jennifer Lawrence receberam menos do que seus parceiros de elenco Bradley Cooper e Christian Bale para fazer Trapaça – 7% dos lucros do filme para as atrizes, 9% para os atores.

No Oscar deste ano, Cate Blanchett já havia chamado a atenção para a desigualdade de tratamento para as mulheres em Hollywood, num discurso em sintonia com o que disseram, depois, Meryl Streep e Juliette Binoche. No último Festival de Cannes, ao ser questionada sobre por que faz mais cinema europeu do que norte-americano, a francesa mencionou as dificuldades de encontrar produções da indústria dos EUA protagonizadas por mulheres, especialmente aquelas com mais de 40 anos.

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Não é novidade que Hollywood dá mais valor aos personagens masculinos. O cenário não mudaria justamente em uma época de investimentos maciços em longas de ação, franquias de super-heróis e infantilização dos blockbusters. Daí a pertinência do discurso de Cate Blanchett ao receber o Oscar de melhor atriz por Blue Jasmine, e seus ecos nos meses seguintes.

— Obrigado a quem ainda acredita em filmes protagonizados por mulheres. Eles não são produções de nicho: ainda dão dinheiro — afirmou Cate, depois de fazer uma piada aparentemente boba, mas que teve sua dose de provocação:

— Fiquem sentados (para ouvir seu discurso), vocês são muito velhos para ficar em pé.

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Crítica e jornalista brasileira radicada em Los Angeles, Ana Maria Bahiana observa que a televisão e a produção independente já não registram tanta disparidade no tratamento dos gêneros.

No cinema, conforme o último balanço divulgado pela Forbes (veja abaixo), apenas dois dos 10 intérpretes mais bem pagos são mulheres (Sandra Bullock e Jennifer Lawrence). Na TV, em compensação, a campeã de rendimentos, Sofia Vergara, faturou US$ 37 milhões entre julho de 2013 e junho de 2014, contra US$ 26 milhões do homem mais valorizado — Ashton Kutcher.

— Há mais igualdade e também mais ofertas na televisão — analisa Ana Maria Bahiana. 

— O que ocorre no cinema é que os grandes filmes comerciais ainda são impulsionados pelos papéis masculinos. Desde que comecei a cobrir a indústria de perto, isso não mudou muito — complementa ela, que mora desde 1987 na Califórnia.

Nem sempre os cachês são tornados públicos, mas estima-se que o valor pago por Hollywood aos atores seja 30% superior àquele que é pago às atrizes. O ranking de rendimentos abaixo, contudo, indica uma disparidade ainda maior: segundo a Forbes, o dinheiro investido em cachês para as 10 estrelas mais valorizadas do ano soma US$ 226 milhões, contra US$ 387 milhões para os astros mais caros — 71% a mais para os homens do que para as mulheres.

A desigualdade salta aos olhos, mas faz sentido, se analisarmos a lista dos filmes campeões de arrecadação — encabeçada, em 2014, por Transformers: A Era da Extinção e Os Guardiões da Galáxia. No top 10 das bilheterias deste ano, só dois são protagonizados por mulheres: Malévola, com Angelina Jolie, e Jogos Vorazes: A Esperança — Parte 1, com Jennifer Lawrence.

A verdade é que os números variam a cada temporada, assim como os próprios atores e atrizes mais bem pagos. Sandra Bullock, por exemplo, encabeça a lista feminina por conta de Gravidade — e dificilmente repetirá os ganhos no balanço dos 12 meses seguintes.

De todo modo, a desvalorização feminina é algo, por certos ângulos, difícil de compreender. Um deles: o fato de que a indústria paga mais para Dwayne Johnson mostrar os músculos em Hércules e pilotar as máquinas de Velozes e Furiosos do que para a própria Jennifer Lawrence, o rosto da hora na cultura pop, estar à frente da franquia Jogos Vorazes e de filmes como O Lado Bom da Vida.

Scarlett Johansson? Nem chega perto do top 10, mesmo que seu Lucy tenha faturado quase o dobro do que o próprio Hércules — os dois estrearam juntos nos EUA, em 25 de julho passado, e faturaram, respectivamente, US$ 458 milhões e US$ 243 milhões.

"Há esperança de algum progresso", escreveu Oliver Lyttelton na Indiewire, citando a intenção da Sony de produzir um longa sobre a super-heroína Gata Negra.

— Mas este ranking da Forbes prova que não evoluímos o suficiente.

Os números

10 atores mais bem pagos, segundo a última lista da Forbes (em valores recebidos de junho de 2013 a julho de 2014):
Robert Downey Jr.: US$ 75 milhões
Dwayne Johnson: US$ 52 milhões
Bradley Cooper: US$ 46 milhões
Leonardo DiCaprio: US$ 39 milhões
Chris Hemsworth: US$ 37 milhões
Liam Neeson: US$ 36 milhões
Ben Affleck: US$ 35 milhões
Christian Bale: US$ 35 milhões
Will Smith: US$ 32 milhões

10 atrizes, de acordo com o mesmo ranking:
Sandra Bullock: US$ 51 milhões
Jennifer Lawrence: US$ 34 milhões
Jennifer Aniston: US$ 31 milhões
Gwyneth Paltrow: US$ 19 milhões
Angelina Jolie: US$ 18 milhões
Cameron Diaz: US$ 18 milhões
Scarlett Johansson: US$ 17 milhões
Amy Adams: US$ 13 milhões
Natalie Portman: US$ 13 milhões
Kristen Stewart: US$ 12 milhões

Mal comparando...
O total recebido pelos 10 homens mais bem pagos em Hollywood, no mesmo período, segundo a Forbes, é de US$ 387 milhões. O total recebido pelas 10 mulheres mais valorizadas em Hollywood é de US$ 226 milhões.

80 por cento...
Entre os 10 intérpretes com maiores rendimentos no último ano em Hollywood, oito são homens e dois são mulheres — Sandra Bullock, a terceira colocada, e Jennifer Lawrence, a décima.

Em compensação...
Das cinco melhores relações custo-benefício de Hollywood, conforme a Forbes, quatro se dão com mulheres. Confira a lista (em dólares arrecadados nas bilheterias para cada US$ 1 pago em cachê):

Emma Stone: US$ 80,70
Mila Kunis: US$ 68,70
Jennifer Lawrence: US$ 68,60
Natalie Portman: US$ 31,30
Dwayne Johnson: US$ 31,10