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Educação Básica  | 12/11/2012 05h31min

Por que a maioria dos alunos matriculados no último ano do Ensino Fundamental não aprende o mínimo considerado adequado?

Mais de 85% dos jovens matriculados no último ano do Ensino Fundamental não sabem o mínimo esperado em matemática e 73,8% em não atingem o conhecimento adequado em língua portuguesa

Bruna Scirea  |  bruna.scirea@zerohora.com.br

Eles deixam de ser crianças, mas ainda estão distantes da idade adulta. O momento de ruptura caracteriza a etapa da vida em que se encontram os alunos dos anos finais do Ensino Fundamental. Essa transição, no entanto, ultrapassa a questão comportamental e os novos interesses revelados por esses estudantes. É verificada também, de forma brusca, na mudança da rotina escolar, na indefinição sobre como organizar essa fase da aprendizagem e em preocupantes números – indicadores que refletem um período esquecido entre a primeira fase do Fundamental e o Ensino Médio.

Como resposta a uma combinação de falhas que se arrastam do 6º ao 9º ano – entre elas um incentivo à leitura sem sucesso, um limbo escolar enfrentado por alunos que não recebem e precisam de acompanhamento pedagógico e um currículo desinteressante e limitador –, 85,3% dos jovens matriculados no último ano do Ensino Fundamental não sabem o mínimo esperado em matemática e 73,8% em língua portuguesa.

Especialistas consultados por Zero Hora interpretaram o fraco desempenho revelado pelo Relatório De Olho nas Metas 2011, do movimento Todos Pela Educação, baseado em dados da Prova Brasil e do Saeb 2009 (MEC/Inep). Conheça possíveis causas e exemplos inspiradores.

O bom exemplo mineiro

Um município de 13 mil habitantes no Triângulo Mineiro chama a atenção por liderar o ranking nacional para o 9º ano do Ensino Fundamental de rede municipal, no último Ideb. A cidade de Nova Ponte é exemplo em um país onde a educação se arrasta, especialmente a pública.

Ao atingir 6,8 na avaliação, superou em 84% a meta estipulada pelo MEC e dobrou em relação à nota 3,2, obtida dois anos antes. Satisfeita com o resultado, a secretária de Educação Maria Regina Silva sabe que o êxito é consequência de uma revolução no ensino, grandiosa, mas não muito complicada.

A receita reúne ideias inovadoras, mas grande parte do sucesso vem de medidas simples como a prática do reforço escolar no contraturno ou 20 minutos antes e depois das aulas. Além disso, professores podem contar com uma gratificação de R$ 200 no término do mês. O merecimento é medido por meio de avaliações pedagógicas e administrativas da escola juntamente com o parecer do educador.

Conforme a necessidade das turmas, até dois professores podem lecionar a mesma disciplina em classe. E nesse pacote, que ainda inclui programas de incentivo à leitura e ensino de matemática, também está o estímulo para que pais participem do processo de aprendizagem dos filhos.

– No início deste ano, trouxemos o projeto Família na Escola, no qual todos os professores visitaram as casas dos alunos para saber dos pais o que esperavam da escola, quais eram suas propostas, os interesses e as dificuldades presentes na família – explica a secretária.

Divididos em duas turmas, 70 alunos frequentam o 9º ano da Escola Municipal de Ensino Fundamental São Miguel – a 15ª colocada no ranking nacional para os anos finais do Fundamental, entre públicas e privadas. Este salto mais do que satisfatório é a prova, da qual a comunidade escolar de Nova Ponte pode se orgulhar: seus estudantes estão adiantados no processo que visa a aprimorar a Educação Básica no Brasil.

1 ACOMPANHAMENTO

Acostumados com o apoio e cuidados de poucos ou até mesmo de apenas um professor, os alunos ingressam na pluralidade que caracteriza os anos finais do Ensino Fundamental. As disciplinas tornam-se ainda mais específicas e, para cada uma delas, há um professor diferente. Se por um lado a diversidade de educadores possibilita aprofundamento e maior dedicação ao conteúdo que deve ser lecionado, por outro, acarreta uma dispersão na atenção conferida ao aluno.

A partir do 6º ano, o conhecimento do histórico, dos avanços e dos recuos de cada estudante em sala de aula deveria ser tarefa de um coordenador pedagógico, função raramente ocupada em escolas públicas e particulares do país.

– Nos anos finais, eles passam a ser mais um dentro de um universo de alunos para o qual cada professor se dedica. A ausência de um projeto pedagógico, que acolha essas crianças e adolescentes e mostre a importância e o porquê dessa pluralidade, impede a interdisciplinaridade e dificulta a atração do aluno pelo ensino – acredita Mozart Neves Ramos, conselheiro do Todos Pela Educação.

Exercício

Nos anos iniciais do Fundamental, os índices do Ideb costumam ser mais altos: na avaliação de 2011, a cidade gaúcha de Vista Alegre do Prata alcançou o índice de 8,2. Nos anos finais, esses números caem, alertando para os problemas dessa etapa do aprendizado.

Municípios gaúchos com os maiores índices no Ideb 2011

Anos iniciais do Ensino Fundamental, rede municipal:

Vista Alegre do Prata: 8,2

Montauri: 7,3

Nova Boa Vista: 7,2

Salvador das Missões: 7,2

Tupandi: 7,1

Anos finais do Ensino Fundamental, rede municipal:

Boa Vista do Buricá: 5,6

Campo Bom: 5,5

Victor Graeff: 5,5

Farroupilha: 5,4

Bento Gonçalves: 5,3

Números nacionais do Ideb 2011:

Média dos anos iniciais do Fundamental, rede municipal: 4,7

Média dos anos finais do Fundamental, rede municipal: 3,8

Tema de casa

— Apoio contínuo: as dificuldades de aprendizagem têm de ser trabalhadas assim que aparecem em sala de aula, evitando que se acumulem para o fim do ano.

— Aulas no contraturno ou turmas flexíveis podem ser uma boa solução para alunos da mesma série ou ciclo que precisem de reforço em conteúdos de determinada disciplina.

— Outra alternativa é a monitoria aluno-aluno, em que os próprios colegas atuam como monitores, prática que, além de eficiente, estimula a cooperação entre os estudantes.

— Exemplo: o sistema adotado na Finlândia, país de destaque nos rankings educacionais, prevê que cada escola tenha um professor especializado em reforço escolar para cada sete turmas regulares (os docentes costumam encaminhar em média 30% dos matriculados para aulas no contraturno).

— A escola deve entender quem é e o que pensa o adolescente e desenvolver uma visão do estudante pautada nas necessidades específicas da faixa etária.

2 FALTA LEITURA

Na opinião de Ocimar Munhoz Alavarse, professor da Faculdade de Educação da USP, as dificuldades com leitura explicam, em parte, por que a maioria dos alunos dos anos finais do Ensino Fundamental não aprendem o mínimo considerado adequado:

– As dificuldades começam nos primeiros anos de escolarização. E como faltam profissionais com capacidade para desenvolver tal competência, o problema acaba sendo cumulativo e tende a dificultar o aprendizado dos alunos. É como se eles não tivessem as condições necessárias para aprender.

Exercício*

Crianças e adolescentes estão lendo menos livros. Confira os índices de leituras de livros desse grupo:

Crianças de 5 a 10 anos liam 6,9 livros por ano em 2007, enquanto em 2011 essa quantidade caiu para 5,4. Na faixa etária de 11 a 13 anos, a média era de 8,5 também em 2007, diminuindo para 6,9 no ano passado. No mesmo período de tempo, os adolescentes de 14 a 17 anos, que liam 6,6 livros por ano passaram a ler 5,9 obras em 2011.

— 87% dos considerados não-leitores nunca foram presenteados com livros na infância

— 63% deles nunca viram a mãe lendo e a porcentagem vai para 68% quando se trata do exemplo paterno

Tema de casa

Algumas atitudes na família podem melhorar a relação da criança com a leitura:

— A leitura deve ser estimulada desde os primeiros anos de alfabetização.

— Leia com o seu filho, pergunte como ele compreendeu o livro e estimule que conte a história a outros colegas.

— Adquira livros com assuntos de interesse da criança, sempre atento à faixa etária.

3 CURRÍCULO CHATO

Plugada na tecnologia, a geração que chega à escola está mais ativa, rápida e informada. No entanto, na definição de João Batista Oliveira, presidente do Instituto Alfa e Beto, o currículo das escolas ainda é muito “chato”. O adjetivo explicaria a queda no índice que reflete o rendimento em sala de aula no caminho percorrido entre os nove anos do Ensino Fundamental.

Ao ingressar na etapa final, por volta dos 11 anos, o alunado vive uma fase de transição, de novos interesses e curiosidades que quase nunca são contemplados pela escola. Soma-se a isso, a falta de liberdade. Se frequentar escolas em busca de educação não é uma opção tomada pelo alunos, mas imposta a eles desde os primeiros anos de vida, o ensino tornaria-se mais atraente se pudesse ser direcionado, ainda que minimamente, aos interesses particulares de cada um.

– É preciso fazer um currículo interessante, estruturado e organizado, com articulações interessantes. É necessário que se dê o mínimo de liberdade. Com ela, o aluno acaba investindo naquilo que gosta – defende Oliveira.

Exercício

Pesquisa divulgada pela Birmingham Science City, na Grã-Bretanha, em março deste ano, mostra que o perfil dos alunos está mudando com a influência tecnológica. Crianças e adolescentes de seis a 15 anos agora confiam mais no Google do que nos próprios pais e professores quando o assunto é conhecimento:

— 54% deles têm o Google como a primeira alternativa quando surge uma dúvida, somente 3% buscam a ajuda de professores quando precisam de uma resposta.

— 25% das crianças não sabem o que é uma enciclopédia. Uma em cada dez acredita que seja algo com o qual seja possível cozinhar ou executar uma operação.

— 91% dos questionados afirmaram usar o Google. Destes, 47% fazem buscas no site pelo menos cinco vezes ao dia e, quando o Google não esclarece as dúvidas, 20% buscam respostas no Wikipedia.

— Um terço das crianças e adolescentes usam tablets ou computadores para ler livros e preferem se comunicar digitalmente, por meio de mensagens via celular (47%), redes sociais (46%) ou e-mail (27%).

Tema de casa**

É preciso reinventar a escola: 40% dos jovens entre 15 e 17 anos que deixaram de estudar o fizeram por considerar a escola desinteressante, segundo o estudo Motivos da Evasão Escolar, realizado pela Fundação Getúlio Vargas (RJ) em 2009.

Como chegar lá? Além da infraestrutura tecnológica, também se exige das escolas uma veloz revolução nas metodologias de ensino capazes de sedimentar uma estrada sólida para a Educação 3.0 – termo amplamente disseminado por pensadores como o americano Jim Lengel, professor da Universidade de Nova York. Confira algumas características da Educação 3.0:

— Os alunos têm autonomia para buscar aprender. Cabe ao professor propor desafios.

— Ler e escrever são habilidades básicas nesta nova educação. É preciso conectar ideias, explorar possibilidades e prever.

— É essencialmente interdisciplinar, por isso os professores devem conversar e discutir os temas a serem abordados.

— Instiga os alunos a pesquisarem na internet. Com isso, a capacidade de discernir sobre a autenticidade de uma informação é desenvolvida.

— Aproveita os dispositivos móveis. Por meio do smartphone, o estudante pode ouvir podcasts.

*Fonte: pesquisa Retratos da Leitura no Brasil, realizada pelo Instituto Pró-Livro em 2011

**Fonte: Educar para Crescer (educarparacrescer.abril.com.br)

Tadeu Vilani / Agencia RBS

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Foto:  Tadeu Vilani  /  Agencia RBS


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