Para se entender a nova importância das linguagens e o desafio de combiná-las, vamos aqui apresentar um pequeno teste de reportagem.
Questão 1) Você é repórter de um jornal, com atuação multimídia em um grupo de comunicação. Qual deveria ser seu procedimento quando chegasse ao local de um incêndio para o qual foi mandado cobrir, no início da manhã, em um prédio em uma cidade próxima?
Questão 2) Qual deveria ser o enfoque da notícia para o jornal no dia seguinte?
Em décadas passadas, um jovem repórter que desembarcasse no local do incêndio preocuparia-se tão-somente em recolher os dados de sempre, acompanhar a evolução do incêndio e, se assumisse grandes proporções, pedir reforço antes de voltar para a redação e redigir sua notícia no fim da tarde ou início da noite.
Agora, um repórter que chega ao local de um incêndio deve fazer uma avaliação imediata da situação e tomar em minutos uma série de decisões, a fim de explorar ao máximo cada linguagem de comunicação. É muito provável que a primeira informação sobre o incêndio, narrada por celular, privilegie a instantaneidade da rádio, que requer velocidade máxima e dispensa montagens de links de transmissão de imagens ao vivo. Na rádio, o repórter relataria os dados básicos: dimensões do incêndio, número de bombeiros mobilizados, a existência ou não de feridos ou pessoas presas no prédio e, ainda, como o trânsito está sendo afetado.
Em seguida, o repórter registraria algumas imagens com o celular e as transmitiria para o site do jornal – é bem possível que a equipe da redação 24 horas já tenha usado o boletim para a rádio para desovar pela internet as primeiras informações.
Não acabou ainda. E estamos há menos de meia hora na cobertura. Se o incêndio é gigantesco, uma transmissão ao vivo pela TV pode ser providenciada com o cinegrafista que acabou de chegar ao local. Mas digamos que os bombeiros controlaram o fogo e não haja feridos. É hora de fechar uma matéria rápida para o noticiário da TV ao meio-dia. O ponto alto são as imagens do combate ao fogo e do trânsito congestionado, além da notícia de que o incêndio foi debelado. É uma matéria para matar a curiosidade da população que via os rolos de fumaça subindo no horizonte e não sabia do que se tratava.
E o jornal? Vai repetir a instantaneidade da rádio, concorrer com a velocidade multimídia da internet e disputar atenção com a irresistível atratividade das imagens em movimento da TV? Agora é hora de o repórter comer um sanduíche de almoço e ir além na apuração em campo. A notícia sobre o que ocorreu, quem se envolveu, onde foi e quando aconteceu já foi divulgada exaustivamente pelas demais mídias. O jornal em papel deve acordar o leitor no dia seguinte respondendo a questões para as quais não houve tempo hábil e nem a linguagem mais apropriada para tratar nos outros meios: por que o fogo começou, como os bombeiros atuaram, o que pode ser feito para se evitar a repetição do acidente.
Um mesmo assunto e quatro linguagens. Daqui para a frente, o melhor jornalismo será aquele capaz de entender as virtudes de cada mídia e transitar adequadamente em cada plataforma. Já não há mais tempo do público a perder – a atenção dele é disputada segundo a segundo e se desvia a todo instante. Por isso, repetições, mesmices e uso inadequado de mídias sepultarão veículos e jornalistas que não enxergarem a mudança. E o jornalismo, queiramos ou não, será um exercício instantâneo de avaliação da melhor mídia para se divulgar uma mesma mensagem.
Marcelo Rech
Diretor editorial dos jornais do Grupo RBS
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