Registros que ficaram na história
Íntegra da carta-renúncia de Jânio Quadros / Ordem do general Orlando Geisel para bombardear o palácio / Íntegra do Manifesto dos ministros militares em relação à João Goulart / Hino da Legalidade / Partitura do hino / Os bilhetes / Um símbolo / Largo da Legalidade
Íntegra da carta-renúncia de Jânio Quadros

   "Fui vencido pela reação e assim deixo o governo. Nestes sete meses cumpri o meu dever. Tenho-o cumprido dia e noite, trabalhando infatigavelmente, sem prevenções nem rancores. Mas baldaram-se os meus esforços para conduzir esta Nação pelo caminho de sua verdadeira libertação política e econômica, a única que possibilitaria o progresso efetivo e a justiça social a que tem direito seu generoso povo. Desejei um Brasil para os brasileiros, afrontando, nesse sonho, a corrupção, a mentira e a covardia que subordinam os interesses gerais aos apetites e às ambições de grupos ou indivíduos, inclusive do exterior. Sinto-me, porém, esmagado. Forças terríveis levantam-se contra mim e me intrigam ou infamam, até com a desculpa da colaboração.

   Se permanecesse, não manteria confiança e tranqüilidade, ora quebradas, indispensáveis ao exercício da minha autoridade. Creio mesmo que não manteria a própria paz pública.

   Encerro assim com o pensamento voltado para a nossa gente, para os estudantes, para os operários, para a grande família do Brasil, esta página da minha vida e da vida nacional. A mim não falta a coragem da renúncia.

   Saio com um agradecimento e um apelo. O agradecimento é aos companheiros que comigo lutaram e me sustentaram dentro e fora do governo e, de forma especial, às Forças Armadas, cuja conduta exemplar, em todos os instantes, proclamo nesta oportunidade. O apelo é no sentido da ordem, do congraçamento, do respeito e da estima de cada um dos meus patrícios para todos e de todos para cada um.

    Somente assim seremos dignos deste país e do mundo. Somente assim seremos dignos de nossa herança e da nossa predestinação cristã. Retorno agora ao meu trabalho de advogado e professor. Trabalharemos todos. Há muitas formas de servir esta pátria.

    Brasília, 25 de agosto de 1961.

   Jânio Quadros.

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Íntegra da ordem do general Orlando Geisel ao comandante do 3º Exército, Machado Lopes, para bombardear o palácio:

    0945 – Foi recebido pelo III Ex a seguinte ordem do Sr Ministro da Guerra (transmitida em fonia):

    1. <<O Gen ORLANDO GEISEL transmite ao Gen MACHADO LOPES, Cmt III Ex, a seguinte ordem do Ministro da Guerra:

    – O III Exército deve compelir imediatamente o Sr LEONEL BRIZOLA a pôr termo à ação subversiva que vem desenvolvendo e que se traduz pelo deslocamento e concentração de tropas e outras medidas que competem exclusivamente às Forças Armadas.

    – O Governador colocou-se, assim, fora da legalidade. O Cmt do III Ex atue com a máxima energia e presteza.

    2. Faça convergir sobre PORTO ALEGRE toda a tropa do RIO GRANDE DO SUL que julgar conveniente, inclusive a 5ª. DI, se necessário.

    3. Empregue a Aeronáutica, realizando inclusive bombardeio, se necessário.

    4. Está a caminho do RIO GRANDE DO SUL uma força-tarefa, da Marinha.

    5. Qual o esforço de tropa que necessita?

    6. Aqui há um boato de que o Gen MURICY viria ao RIO. O Ministro da Guerra não quer acreditar nesta notícia e julga que o momento não é mais para parlamentar, mas requer ação firme e imediata.

    7. O Ministro da Guerra confia em que a tropa do III Ex cumprirá o seu dever.>>


    1000 – Em resposta o Cmt do III Ex declarou ao Gen GEISEL que não cumpriria a ordem recebida, <I>por mão encontrar apoio legal</I>.

    1030 – O Gen MURICY foi mandado ao RIO, para esclarecer a situação do Estado do RGS, particularmente em PORTO ALEGRE, bem como a das tropas nele estacionadas.

    1100 – O Cmt III Ex comparece ao Palácio PIRATINI para levar ao conhecimento do Governador BRIZOLA a decisão que vinha de tomar, bem como solicitar ao Governador do Estado as providências necessárias para que moderasse os atos de exaltação revolucionária que vinha praticando, inclusive a devolução da Rádio GUAÍBA.
   
    Pelo Governador BRIZOLA foi-lhe prometido o acatamento a essas solicitações.

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Íntegra do Manifesto dos ministros militares em relação à João Goulart

   No cumprimento de seu dever constitucional de responsáveis pela manutenção da ordem, da lei e das próprias instituições democráticas, as Forças Armadas do Brasil, através da palavra autorizada dos seus ministros, manifestam a Sua Excelência, o Sr. Presidente da República, como já foi amplamente divulgado, a absoluta inconveniência, na atual situação, do regresso ao País do Vice-Presidente, Sr. João Goulart.

   Numa inequívoca demonstração de pleno acatamento dos poderes constitucionais, aguardaram elas, ante toda uma trama de acusações falsas e distorções propositadas, sempre em silêncio, o pronunciamento solicitado ao Congresso Nacional. Decorridos vários dias, e como sintam o desejo de maiores esclarecimentos por parte da opinião pública, a que inimigos do regime e da ordem buscam desorientar, vêem-se constrangidas agora, com a aquiescência do Sr. Presidente da República, a vir ressaltar, de público, algumas das muitas razões em que fundamentaram aquele juízo.

   Já ao tempo em que exercera o cargo de Ministro do Trabalho, o Sr. João Goulart demonstrara, bem às claras, suas tendências ideológicas incentivando e mesmo promovendo agitações sucessivas e freqüentes nos meios sindicais, com objetivos evidentemente políticos e em prejuízo mesmo dos reais interesses de nossas classes trabalhadoras. E não menos verdadeira foi a ampla infiltração que, por essa época, se processou no organismo daquele Ministério, até em pontos-chave de sua administração, bem como nas organizações sindicais, de ativos e conhecidos agentes do comunismo internacional, além de incontáveis elementos esquerdistas.

   No cargo de Vice-Presidente, sabido é que usou sempre de sua influência em animar e apoiar, mesmo ostensivamente, movimentações grevistas promovidas por conhecidos agitadores. E ainda há pouco, como representante oficial, em viagem à URSS e à China comunista, tornou clara e patente sua incontida admiração ao regime desses países, exaltando o êxito das comunas populares.

   Ora, no quadro de grave tensão internacional, em que vive dramaticamente o mundo dos nossos dias, com a comprovada intervenção do comunismo internacional na vida das nações democráticas e, sobretudo, nas mais fracas, avultam, à luz meridiana, os tremendos perigos a que se acha exposto o Brasil. País em busca de uma rápida recuperação econômica, que está exigindo enormes sacrifícios, principalmente das classes mais pobres e humildes, em marcha penosa e árdua para estágio superior de desenvolvimento econômico-social, com tantos e tão urgentes problemas para recuperação, até, de seculares e crescentes injustiças sociais nas cidades e nos campos, não pode nunca o Brasil enfrentar a dura quadra que estamos atravessando, se apoio, proteção e estímulo estiverem a ser dados aos agentes da desordem, da desunião e da anarquia.

   Estão as Forças Armadas profundamente convictas de que, a ser assim, teremos desencadeado no País um período inquietador de agitações sobre agitações, de tumultos e mesmo choques sangrentos nas cidades e nos campos, de subversão armada, enfim, através da qual acabarão ruindo as próprias instituições democráticas e, com elas, a justiça, a liberdade, a paz social, todos os mais altos padrões de nossa cultura cristã.

   Na presidência da República, em regime que atribui ampla autoridade de poder pessoal ao Chefe da Nação, o Sr. João Goulart constituir-se-á, sem dúvida, no mais evidente incentivo a todos aqueles que desejam ver o País mergulhado no caos, na anarquia, na luta civil. As próprias Forças Armadas, infiltradas e domesticadas, transformar-se-iam, como tem acontecido noutros países, em simples milícias comunistas.

   Arrostamos, pois, o vendaval, já esperado, das intrigas e das acusações mais despudoradas, para dizer a verdade tal como é, ao Congresso dos representantes do povo e, agora, ao próprio povo brasileiro.

   As Forças Armadas estão certas da compreensão do povo cristão, ordeiro e patriota do Brasil. E permanecem, serenas e decididas, na manutenção da ordem pública.

   Rio de Janeiro, GB, 30 de agosto de 1961.

   Vice-Almirante Sílvio Heck, Ministro da Marinha - Marechal Odílio Denys, Ministro da Guerra - Brigadeiro-do-Ar Gabriel Grum Moss, Ministro da Aeronáutica.

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Hino da Legalidade


Avante brasileiros de pé
Unidos pela liberdade
Marchemos todos juntos de pé
Com a bandeira que prega a igualdade
Protesta contra o tirano
Se recusa à traição
Que um povo só é bem grande
Se for livre como a Nação


Ouça o hino

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Partitura do hino

Está no Museu da Brigada Militar, localizado provisoriamente no QG da Brigada Militar, na Rua dos Andradas, em Porto Alegre No museu também podem ser encontrados armamentos, uniformes e capacetes utilizados no período da Legalidade.


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Os bilhetes

     Mensagens eram levadas ao ar pela Rede da Legalidade direto dos porões do Palácio Piratini. Dezenas de bilhetes chegavam diariamente. O funcionário do palácio João Brusa Neto era responsável por selecioná-los antes de ir ao ar. A triagem tinha o objetivo de evitar que a resistência legalista fosse interpretada como um movimento comunista. Qualquer manifestação que pudesse incitar à desordem e à violência era vetada.

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Um símbolo

Espada banhada a ouro que o então comandante do 3° Exército (hoje Comando Militar do Sul), general Machado Lopes, recebeu do governo do Estado, em 14 de novembro de 1961, por ter se posicionado em favor da posse de João Goulart na Presidência da República. Está guardada em um cofre do Museu Júlio de Castilhos, na Rua Duque de Caxias, em Porto Alegre. Não está em exposição.

 

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Largo da Legalidade

   Espaço entre a Praça da Matriz e o Palácio Piratini, onde, em final de agosto e início de setembro de 1961, milhares de gaúchos se concentraram para defender a posse de João Goulart na Presidência. Recebeu a denominação em 1986, na comemoração dos 25 anos do movimento.

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