"Se eu puder
ajudar outras pessoas, já valeu a pena sofrer!" -
Sofia
A doença se manifestou ainda na infância, se estendendo na
adolescência. Era na solidão que ela se manifestava e, como num sopro de
mágica, eu caía em tristeza, até chegar ao limite da dor, que só acalmava
quando eu tentava me matar.
A primeira tentativa foi aos sete anos. Depois aos 14, 16 e
21 anos. Mesmo depois que comecei a me tratar, ainda tentei o suicídio três
vezes, até ser internada.
Eu tinha fases de extrema alegria, outras de extrema
tristeza que me levavam ao desespero, só que às vezes na mesma semana e até no
mesmo dia. Tudo que era suportável para as pessoas, pra mim era extremamente
insuportável. Eu aumentava as coisas, só que negativamente. Tudo era "grandioso":
o final de uma novela - coisa mais banal - me deixava triste.
Eu tinha apenas uma ou duas amigas, no máximo. Sentia medo
de perder as pessoas, então não me envolvia.
Eu saía cedo pra ir pra aula e quando chegava só
cumprimentava todo mundo e me fechava dentro do quarto.
Eu me abria com algumas amigas. Era sempre muito bom
desabafar com elas, mas a dor só estabilizava, nunca acabava.
Aos 20 anos fui recomendada a me tratar. Antes, minha mãe já
tinha tentado de tudo, mas nunca conseguia dar continuidade no tratamento. Eu
não acreditava que um profissional, me ouvindo, me ajudaria, pois quando a dor
chegava ninguém poderia senti-la por mim. Acho que deve ser muito complicado
para um profissional ver que o paciente não tem a menor fé.
Tomava vários medicamentos, mas a dor nunca passava. A angustia, então... era
insuportável respirar e eu me escondi durante meses dentro do quarto e
abandonei o meu filho. Depois que eu passei a guarda dele pra avó paterna, sob
a orientação do meu ex-marido, que na época ainda era meu marido, eu fui
internada.
Fiquei 20 dias no Hospital Espirita.
Lá eu vi que as coisas não eram tão graves. Vi que se eu não acordasse, jamais
seria feliz, jamais seria respeitada e perderia minha vida em vida.
O meu filho tinha três anos e meio quando foi morar com a
avó, pois eu tentei me matar com ele dentro de casa. Na verdade, eu nem sabia o
que fazia. Achava que eles seriam mais felizes sem mim. Na época eu tinha 22
anos.
Então percebi que eu era mais feliz sozinha. Eu ainda fiquei
em crise, só que mais contida e sem remédios até meados de 2006. Foi quando
adquiri uma anorexia nervosa que tava levando a minha vida, aí reagi, mas com muita força de vontade. Passei a ver que a
minha felicidade e a minha paz dependiam apenas de mim. Passei a orar, rezava
todas as noites. Quando a dor começava a dar sinal eu respirava fundo e soltava
uma gargalhada, rezando cada vez mais.
Parei de vez com os remédio, pois
todas as vezes que tentei me matar foram com medicamentos. Passei a perceber
que minha mente sabia o meu ponto fraco, por isso me dei alta dos remédios,
afinal, eu os culpava por não me tirarem a dor, por isso usava em excesso.
Essa dor que tanto falo é a vontade incontrolável de chorar.
As horas passavam e nada da dor sumir. A insônia me mantia
mais alerta e nem em sonhos eu conseguia viver feliz. Não existiam momentos
felizes. Eu tinha falta de ar.
Eu fui adotada aos 3 anos, só que
meus pais adotivos resolveram se separar antes da adoção ser concretizada. Com
isso, eles travaram entre si uma batalha judicial que me submetia a tudo.
Acontece que eu sabia que aqueles não eram os meus pais, e que se eu não
ficasse boazinha eu ia acabar voltando pro dormitório escuro. Aos 3 anos já sabia que tinha que me denfender
sozinha. Sei que as conseqüências de dois abandonos - o segundo porque meu pai desistiu da
adoção e deixou de ser meu pai de uma hora pra outra, como se isso fosse
possível na minha cabeça - me levaram ao isolamento.
Nunca pensei em parar de estudar, desde os 5 anos eu sabia o que queria ser quando crescer, e é pra
isso que estudo até hoje.
Em crise, nunca briguei contra a tristeza. Eu simplesmente
me entregava. Para um bipolar em crise é mais consolador se entregar. Ele se
acha a vitima do universo...
Por anos eu me refugiava em remédios, expulsava as pessoas
da minha vida. O bipolar é normal para a sociedade, mas desconta toda sua fúria
nos parentes mais próximos. E eu não queria ser ajudava.
Eu sempre tive medo que minha mãe adotiva me abandonasse
como os outros, e ela achava que eu tava tendo crise
de adolescente. Os parentes nunca conseguem enxergar até que a crise esteja
latente aos olhos
Bipolaridade não tem cura, mas eu posso dizer que hoje estou
estável e que dificilmente me entregaria novamente... Quero muito viver ao lado
do meu filho, casar novamente e ter mais um filho, e isso só será possível se
eu continuar com fé e equilíbrio. Hoje não tenho mais A DOR.
Tenho como meta viver um dia de cada vez, e buscar a
felicidade dentro de mim: "A felicidade não está do lado de fora, é tu que
tens que olhar pra dentro"
Sofia